Exposição
Uma “banda desenhada” de capas de discos dos “super-heróis” da música brasileira
Partindo de uma colaboração entre o programador André Gomes e o ilustrador Júlio Dolbeth, exposição Contracapa apresenta ilustrações de capas de discos de “ícones incontornáveis da música brasileira”. Para ver no Auditório de Espinho, até 11 de Junho.
Caetano Veloso, Maria Bethânia, Chico Buarque e Elza Soares: estes são apenas alguns dos artistas brasileiros retratados na nova exposição do Auditório de Espinho. Patente até 11 de Junho, Contracapa junta 20 ilustrações da autoria de Júlio Dolbeth, as suas interpretações das capas dos discos de “ícones incontornáveis da música brasileira”, refere ao P3 o ilustrador de 48 anos.
A exposição resulta de uma colaboração entre André Gomes, programador do Auditório de Espinho e criador do extinto site de música Bodyspace, e Júlio Dolbeth; porém, esta não é a primeira vez que trabalham juntos. Em 2012, para celebrar o décimo aniversário do Bodyspace, o programador de 38 anos convidou o ilustrador para interpretar dez capas de discos icónicos da sua geração. Após este trabalho, que teve “sucesso”, ambos falaram sobre a “ideia de um dia retomar esse projecto, até de forma mais sistemática”, diz ao P3 André Gomes. Assim, surgiu uma oportunidade para realizar uma “segunda edição” da ideia, como afirma Júlio Dolbeth, com a exposição Contracapa.
André Gomes foi o responsável pela selecção das capas e dos artistas, enquanto Júlio Dolbeth ficou encarregue das ilustrações. Com uma “paixão muito grande pela música brasileira”, o programador admite que, depois da música americana e britânica, a brasileira foi “aquela que deu mais figuras icónicas conhecidas mundialmente”. Assim, seleccionou capas de discos que retratassem as caras dos artistas, levantando a questão: “Foi o artista que fez a capa ou foi a capa que fez o artista?” É o que pretende abordar com a exposição. “Essa ideia de recriar as capas de disco e dar-lhes uma vida nova também me apaixona”, afirma Gomes.
Através das suas ilustrações, Júlio Dolbeth tenta formar um “diálogo com as capas originais interpretadas à luz" do seu imaginário, como refere num comunicado. Isto é, tenta “representar o que está lá” e “ser um bocadinho fiel ao que está na capa”, mas aplicando uma “espécie de gramática pessoal de ilustrar aquelas imagens" e de que forma é que elas lhe tocaram, explica ao P3. Sendo as ilustrações uma “visão muito pessoal de cada uma das capas”, Júlio Dolbeth acredita que “algumas [pessoas] vão ficar desiludidas” por “representar mal o resultado”, “outras podem achar cómico” e “outras podem sentir algum carinho”, algo que tenta transmitir em todas as imagens.
Sentindo-se como “uma criança numa loja de brinquedos” sempre que visita a exposição, André Gomes admite que foi “engraçado ver como [Dolbeth conseguiu] captar a expressão” de cada artista ao remover “certos elementos” e salientar “certas partes na expressão”. Mantendo a “alma” dos artistas, as ilustrações formam uma espécie de “banda desenhada que os torna imortais à visão do Júlio”, onde são os “super-heróis”.
Para além da componente musical e estética, as capas dos discos (e as caras retratadas nestas) “contam uma história”, servindo, algumas vezes, no caso dos artistas brasileiros, como “um grito de revolta, um pedido de libertação”, assevera ao P3 o programador. “A arte tem obviamente um papel fundamental para trazer as pessoas para um mundo cívico, de compaixão, de partilha”, salienta. Júlio Dolbeth partilha a mesma perspectiva ao indicar a “importância” das capas “não só a nível cultural, mas também [a níveis] histórico e político”, demonstrando a possibilidade de “contornar sistemas que são opressivos através de cultura e música”. Assim, com “algo simples”, os músicos brasileiros “conseguiam dizer muita coisa”, afirma o ilustrador.
Com esta exposição, André Gomes espera que pessoas vejam não só “o lado pictórico” das capas como também “descubram alguma coisa”, “percebam essa importância” e “essa mensagem política”, cada vez mais “importantes nos dias que correm”.
Texto editado por Amanda Ribeiro