FBI teve acesso ao Pegasus, mas diz que não o usou

Agência norte-americana confirmou que obteve o programa de vigilância informática, mas diz que apenas para “se manter a par das tecnologias emergentes”.

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Sede do FBI: a polícia de investigação federal dos EUA confirmou que teve uma licença de utilização do Pegasus JOSHUA ROBERTS/Reuters

O FBI confirmou esta quarta-feira que teve acesso ao Pegasus, o programa de espionagem da empresa israelita NSO, que está no centro de uma série de casos de utilização indevida por regimes pouco democráticos para vigiar opositores, jornalistas, ou activistas de direitos humanos, quando foi desenhado, e devia ser usado, apenas para contra-terrorismo e criminalidade organizada grave.

A agência de investigação federal norte-americana disse ao diário britânico The Guardian que teve uma “licença limitada” para aceder ao programa, considerado o mais poderoso spyware do mundo, que permitia apenas “teste do produto e avaliação”, dizendo que este software nunca foi usado numa investigação da força policial norte-americana. O motivo do FBI foi também a preocupação de saber se o programa “caísse nas mãos erradas”, segundo a mensagem enviada ao Guardian.

O New York Times, que tal como o Guardian faz parte de um consórcio internacional que investiga quem usou o Pegasus e como, revelou antes que o FBI tinha comprado o programa em 2019, durante a Administração Trump.

A empresa NSO disse sempre que o programa foi desenhado de modo a que fosse impossível usá-lo com números com o indicativo dos EUA – ou de Israel. No entanto, nas últimas semanas percebeu-se que essa informação não é verdadeira, tendo sido provada a vigilância de vários números israelitas. O uso do software para vigilância de israelitas, incluindo organizadores de protestos contra o então primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, por este ter sido acusado de corrupção, provocou polémica em Israel.

Esta semana, a polícia israelita admitiu que tinha usado o Pegasus de modo irregular.

Na semana passada, uma investigação do New York Times revelou que a agência de espionagem CIA, o FBI, a agência de combate ao tráfico de drogas DEA, o comando militar dos EUA em África, e várias outras agências e departamentos dos Estados Unidos tiveram conversações com a empresa para adquirir o programa.

O Pegasus permite fazer mais do que outros programas de vigilância: sem que a pessoa vigiada se aperceba ou tenha de clicar em qualquer link, tem capacidade para entrar no smartphone e aceder a todos os dados – conversas, vídeos, geolocalização, etc – e ainda activar remotamente o microfone e a câmara e transmitir para quem estiver a levar a cabo a espionagem.

As negociações entre o FBI e a NSO terão esbarrado em vários obstáculos, sobretudo por preocupação da parte da agência norte-americana que a NSO pudesse ter acesso a informação sensível do FBI. Por isso o programa foi posto a funcionar num outro edifício e não estava ligado aos sistemas do FBI.

A admissão do FBI acontece um dia depois de o jornal The Washington Post, que também faz parte do consórcio de investigação, revelar que uma empresa de comunicações móveis dos EUA recebeu uma oferta de “sacos de dinheiro” da NSO em troca de acesso a redes de comunicação.

A informação tem base em revelações de uma fonte, o especialista em segurança de comunicações Gary Miller, que na altura trabalhava para uma empresa da Califórnia, Mobileum (que vende serviços de segurança a empresas de comunicações moveis em todo o mundo), e que está a relatar o sucedido ao Departamento de Justiça. Miller diz que a oferta foi feita em 2017.

As alegações acontecem numa altura em que o Departamento de Justiça está a investigar a NSO por alegações de uso irregular do Pegasus. Não é claro se haverá alguma ligação entre a investigação e as alegações de Miller, diz o Post.

A administração Biden decidiu, em Novembro passado, pôr a NSO numa “lista negra” do Departamento do Comércio por ter tido acções “contrárias à política externa e ao interesse nacional dos EUA”.

A inclusão nesta lista restringe exportações de congéneres norte-americanas, dificultando, por exemplo, a venda de informação sobre vulnerabilidades de computadores, trazendo várias dificuldades de ordem prática à NSO, e dando ainda um duro golpe na imagem pública da empresa.

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