Já podemos voltar às nossas Birras?

Em Setembro é preciso escolher entre: “Mães que ficam radiantes que os filhos vão para a escola” vs. “Mães que choram dias a fio porque não aguentam deixá-los”.

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@designer.sandraf

Querida Ana,

Já estão todos na escola? Já podemos voltar às nossas Birras?

Please, please, diz que sim, porque estou ansiosa por conversar contigo por escrito, que é a nossa forma favorita de conversa.

Sei que não vão ser fáceis estas primeiras semanas de escolas novas para os mais pequeninos e que agora com três “poisos” diferentes, vais sentir-te mais condutora da carrinha da escola do que outra coisa, mas esfrego as mãos de contente pelas histórias que estas experiências te vão dar. Conta-me tudo.

Aqui do meu lado, confesso que não te invejo. Odeio acordar cedo, e odeio acordar e vestir crianças para as mandar para a escola. Tenho acordado a dar graças pela sorte de não me ver obrigada a preparar almoços às 7 da manhã — sou alérgica a termos! —, e a celebrar o facto de ser avó, e não mãe. Mas para atenuar a minha culpa de ficar de braços cruzados, envio-te uma lista de conselhos destinados a facilitar-te a vida.

Ups, já estou a ver os teus olhos verdes a faiscar, por isso deixo só dois.

  1. Pede-me ajuda quando precisares. Prometo que se não me der jeito ou não conseguir, digo.
  2. Compra meias iguais. Toneladas de meias iguaizinhas, para que se possam ir juntando, mesmo quando algumas fugirem para a Terra das Meias Desemparelhadas, paredes-meias com a Terra do Nunca. Acredita que todas as manhãs vais agradecer a decisão.

Dá-me notícias.


Querida Mãe!

Tenho uma boa notícia! Já não tenho uma “alergia adolescente” aos seus conselhos. Acho-os óptimos e vou segui-los. Mas, em relação às meias... isto põe-me uma questão filosófica e ética: se comprar meias iguais e assumir que todas podem ser pares de todas, estarei a desistir do conceito de uma alma gémea? Terei desistido da ideia de que há um amor especial para cada um? É que se é verdade que me dói o coração quando perco uma, nada substitui a alegria de as reunir passado sete ou oito máquinas. Sim, algumas ficam perdidas para sempre, mas não será esse o preço de arriscar amar?

Se acha, como o meu marido, que estou a investir tempo a mais neste assunto, deixe-me justificar-me pelo facto de ter uma filha que vai mudar de escola e para o 1.º ano. A ansiedade bate e como já bem sabe vai buscar os temas que consegue!

Estou um bocadinho farta da necessidade das redes sociais polarizarem sempre as coisas. Em Setembro é preciso escolher entre: “Mães que ficam radiantes que os filhos vão para a escola” vs. “Mães que choram dias a fio porque não aguentam deixá-los”. Proponho a equipa do “Hoje sinto-me assim, amanhã logo se vê!”, não lhe parece? É que repare no meu horário de emoções:

  • Entre as 7h e as 9 h da manhã, odeio a ideia de irem para a escola, sou 100% a favor do unschooling e de vivermos num campo onde possam apanhar frutas das árvores e comer bagas para não ter que preparar almoços.
  • Às 11 h sou a maior fã da escola, acho que é essencial para todos os miúdos, e começo a ver os benefícios dos colégios internos.
  • Pela 13h, agradeço de todo o coração as cantinas e pelo facto de estar a almoçar sem ninguém me interromper.
  • Entre as 15h e as 17h, morro de saudades deles e acho que é uma estupidez não estarmos sempre juntos.
  • Pelas 18h, tenho raiva às actividades extracurriculares e barafusto contra a obsessão da nossa sociedade em ter os miúdos ocupados e “preparados para serem os melhores” em artes marciais ou no hóquei.
  • Pelas 19h, odeio a escola de novo, e suspiro pelos fins de tarde de Verão em que dar banho aos miúdos era mandá-los dar um mergulho numa piscina depois da praia.
  • Pelas 21h, odeio tudo e todos e por isso vou dormir.

No Birras de Mãe, uma avó/mãe (e também sogra) e uma mãe/filha, logo de quatro filhos, separadas pela quarentena, começaram a escrever-se diariamente, para falar dos medos, irritações, perplexidade, raivas, mal-entendidos, mas também da sensação de perfeita comunhão que — ocasionalmente! — as invade. Mas, passado o confinamento, perceberam que não queriam perder este canal de comunicação, na esperança de que quem as leia, mãe ou avó, sinta que é de si que falam. Facebook e Instagram.

As autoras escrevem segundo o Acordo Ortográfico de 1990

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