Demissão do ministro do Ambiente do Brasil, alvo de inquérito sobre desflorestação da Amazónia

A saída de Ricardo Salles foi festejada pela oposição e por muitas organizações não-governamentais, mas todos sublinham que “a destruição ambiental” promovida por Bolsonaro vai continuar.

Foto
Salles foi ministro desde que Bolsonaro chegou à presidência, em Janeiro de 2019 ADRIANO MACHADO/Reuters

O Presidente brasileiro, Jair Bolsonaro aceitou a demissão do ministro do Meio Ambiente do Brasil, Ricardo Salles, cuja gestão foi marcada por várias polémicas. Salles começou recentemente a ser investigado por alegado favorecimento de madeireiros e por dificultar a fiscalização ambiental na Amazónia, num cenário de aumento da extracção ilegal de madeira.

A saída do ministro foi festejada pela oposição e por muitas organizações não-governamentais, mas todos sublinham que “a destruição ambiental” promovida pelas suas políticas não termina com este afastamento. Para o seu lugar Bolsonaro nomeou Joaquim Álvaro Pereira Leite, que era secretário de Estado da Amazónia e Serviços Ambientais e já foi conselheiro da Sociedade Rural Brasileira (SRB), uma das organizações que representa o sector agro-pecuário no país.

Ricardo Salles foi apenas um operador que cumpriu muito bem os planos do chefe. A política ambiental segue a todo o vapor”, escreveu na sua página na rede social Twitter a ONG Greenpeace Brasil. “Salles nunca foi ministro do Meio Ambiente. A sua conduta sempre gerou danos ambientais e investigações. Já vai tarde.” Num comunicado publicado no seu site, a Greenpeace nota que, apesar do “alívio” provocado pela saída de Salles, “é evidente que a troca de peças por si não deve modificar a estratégia do Governo” e descreve o novo ministro como “aliado aos interesses do agro-negócio”.

Para o Observatório do Clima, rede que reúne várias organizações da sociedade civil para promover o debate sobre as alterações climáticas, Salles deixa “um legado sombrio”: “dois anos de desflorestação em alta”, “dois recordes sucessivos de queimadas na Amazónia”, 26% do Pantanal carbonizado”, “omissão diante do maior derramamento de petróleo da história do Brasil”, “emissões de carbono em alta” e “a imagem internacional do país na lama”, enumera a ONG.

“Embora seja evidentemente um grande dia” para o Brasil, enquanto Bolsonaro for Presidente, o meio ambiente e os povos indígenas não terão “um dia de paz” e o país continuará a ser “um pária internacional e um risco climático planetário”, conclui o Observatório.

“Vai tarde!”, escreveu a antiga ministra do Meio Ambiente e ex-candidata à presidência Marina Silva. “Sabemos que ele era o operador da política nefasta de Bolsonaro. Seguimos na luta e resistindo”, escreveu, no Twitter. “Quantas árvores precisaram de ser derrubadas para que Ricardo Salles também fosse?”, comentou o senador Humberto Costa, do Partido dos Trabalhadores (PT).

Vários deputados da oposição não deixaram de ver nesta exoneração uma manobra para distrair os brasileiros da polémica sobre alegadas irregularidades na compra de 20 milhões de doses de vacinas para a covid-19. “Estratégia clara”, escreve no Twitter o deputado Paulo Pimenta, do PT. “Salles deixa o cargo no dia em que vem à tona o caso da Covaxin. [Abraham] Weintraub [ex-ministro da Educação] deixou o cargo quando [Fabrício] Queiroz [amigo de Bolsonaro e ex-assessor do filho, Flávio] foi preso na casa do advogado dos Bolsonaro”, recorda.

Disputa de terras indígenas 

Outros parlamentares pediram ao Supremo Tribunal Federal que o passaporte de Salles seja apreendido para evitar uma possível fuga do ex-ministro para os Estados Unidos enquanto prossegue a investigação sobre os seus possíveis crimes.

Entretanto, a imprensa brasileira escreve já sobre potenciais conflitos de interesses do novo ministro. Segundo vários jornais, a família de Joaquim Álvaro Pereira Leite – uma família tradicional de fazendeiros de São Paulo – está envolvida numa disputa de terras indígenas nos municípios de São Paulo e Osasco. Trata-se do território indígena mais pequeno do Brasil, com 532 hectares, onde, de acordo com a Comissão Pró-Índio de São Paulo, moram 534 indígenas dos povos Guarani Mbya e Ñandeva.

O processo de demarcação começou há 40 anos mas está paralisado na justiça – um documento da Funai (Fundação Nacional do Índio), citado pelo jornal Folha de São Paulo, descreve como capatazes da família chegaram a destruir a casa de uma família indígena para a obrigar a deixar o território disputado.

Sugerir correcção
Comentar