Bombardeamento de aeroporto na Eritreia ameaça fazer alastrar conflito na Etiópia

Líder tigré confirmou o ataque contra país vizinho, que acusa de estar a apoiar o Exército federal etíope na guerra civil que dura há já 12 dias.

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Desde o início do conflito, mais de 20 mil pessoas fugiram para o Sudão EL TAYEB SIDDIG/Reuters

O líder da região do Tigré confirmou este domingo que as suas forças bombardearam o aeroporto da capital da Eritreia, que acusa de estar a apoiar o Exército etíope. Os governos de ambos os países negam estar a combater em conjunto.

O conflito que opõe o Exército federal etíope e as forças militares do Tigré – região no Norte etíope, que faz fronteira com a Eritreia e o Sudão – está agora próximo de se tornar numa guerra com implicações internacionais, confirmando os piores receios.

Cinco diplomatas tinham descrito à Reuters o lançamento de rockets sob Asmara, a capital da Eritreia, no sábado à noite, dois dos quais atingiram o aeroporto. O presidente da Frente de Libertação do Povo Tigré (FLPT), o partido que governa o Tigré, Debretsion Gebremichael, reivindicou o ataque, acusando as forças da Eritreia de apoiarem o Exército etíope.

“Enquanto as tropas estiverem aqui a lutar, iremos visar qualquer alvo militar legítimo e iremos atacar”, afirmou Gebremichael, acrescentando que as suas forças militares estão a combater “16 divisões” da Eritreia.

O primeiro-ministro etíope, Abiy Ahmed, negou estar a ter a cooperação militar da Eritreia e garantiu que o Exército é capaz de atingir os seus objectivos “por si só”. O Governo eritreu não emitiu qualquer declaração sobre o assunto. Os dois países envolveram-se num conflito entre 1998 e 2000, numa altura em que a Etiópia era governada pela FLPT. Um acordo de paz só foi assinado em 2018, promovido por Ahmed, que se tornou no primeiro líder do país da etnia oromo.

Pelos seus esforços em alcançar um acordo de paz com a Eritreia, Ahmed recebeu o Prémio Nobel da Paz em 2019. A Eritreia é um dos países mais fechados do mundo, com uma sociedade permanentemente mobilizada para a guerra e onde o recrutamento é obrigatório e não tem um prazo fixo para terminar. A CIA calcula que o país tenha cerca de 200 mil soldados.

Ahmed lançou uma ofensiva contra o Tigré, depois de acusar a FLPT de ter atacado bases militares federais. A hostilidade entre o Governo federal e os líderes tigrés existia há já bastante tempo, com a FLPT a acusar Ahmed de ter afastado os tigrés de posições-chave no aparelho de Estado.

A situação agravou-se depois de as autoridades regionais do Tigré terem organizado eleições locais em Setembro, violando o adiamento decretado pelo Governo federal em virtude da pandemia da covid-19.

O conflito entre o Exército etíope e as forças regionais do Tigré dura já há 12 dias e é responsável por mais uma crise humanitária em África. Desde o início dos combates que pelo menos 20 mil pessoas fugiram para o Sudão, de acordo com o Alto-Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados.

O número de refugiados pode subir acentuadamente nos próximos dias. A FLPT diz que há centenas de milhares de pessoas desalojadas no Tigré, que viram as suas casas destruídas por bombardeamentos.

No sábado à noite, um grupo de homens armados abateu pelo menos 34 pessoas num autocarro, revelou a Comissão Etíope de Direitos Humanos, que qualificou o incidente como “macabro”. O atentado ocorreu na província de Benishangul-Gumuz, no oeste do país, e não é claro se está relacionado com o conflito no Tigré.

Há relato de um massacre numa aldeia, em que dezenas de pessoas foram esfaqueadas até à morte. As testemunhas responsabilizam as forças tigrés, mas o Governo disse que pretende enviar uma missão independente para apurar o que aconteceu.

A ONU disse que as autoridades policiais etíopes estão a fazer listas de funcionários tigrés que trabalhem em agências governamentais e organizações não-governamentais, alimentando os receios de perseguições motivadas pelo ódio étnico.

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