Este Natal peço mais saúde para a Educação

As constantes notícias que me provocam angústia e amargura no coração só provam um diagnóstico de doença grave. Agressões verbais e físicas a professores, por parte de alunos e encarregados da, suposta, educação.

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FRANCISCO ROMAO PEREIRA/Arquivo

Tenho por hábito pedir saúde no Natal pois nada me vale mais do que a saúde!

Só que, neste Natal peço mais saúde para a Educação em Portugal!

As constantes notícias que me provocam angústia e amargura no coração só provam um diagnóstico de doença grave. Agressões verbais e físicas a professores, por parte de alunos e encarregados da, suposta, educação. Dizem ser raras as situações, mas quem está ligado a grupos de professores nas redes sociais recebe, todos os dias dos colegas, exposição de casos. Alguns professores, por vergonha ou medo de represálias, fecham-se em si como um bicho-de-conta, e enrolam as situações amarfanhadas no coração. Só que o bicho contou e deve dar-nos a nós, sociedade, vergonha de compactuarmos com um sistema em que quem ensina está exposto a isto, e não se força o direito a ser crime quem desrespeita a autoridade. Tão ténue é esta linha que separa a liberdade da libertinagem que, na ausência de regras, cria uma sociedade e, na cegueira de não querermos ver, estamos a promover mais crime no futuro.

Este Natal, peço punições mais graves para a indisciplina, para bem de todos, mesmo dos infractores, para que, no futuro, se tornem melhores adultos.

Relativamente ao tão falado livre-trânsito de nove anos de escolaridade previamente adquirido à nascença, espero que esta seja uma fake new, lançada apenas para que a Educação grite pela voz de todos. Não defendo que se desista dos alunos. Acredito num ensino mais individualizado, na promoção de estratégias para adaptar a cada caso, para que o aluno seja apoiado. Mas, na ausência de trabalho, no fracasso de estratégias, porque não repetir o ano? Será este um trauma assim tão fatal? A sobrevivência a um insucesso não deverá fazer parte de um currículo de educação?

Relativamente ao ensino profissional, cujas bases de existência são de louvar e de importância fulcral — criar mais técnicos, pessoas que percebam da arte, um ensino mais prático e mais adaptado à vida prática —, há verdadeiros casos de sucesso de escolas de ensino profissional. Mas também há outros, que se transformaram numa via menos exigente para concluir o ensino obrigatório, será justo que haja vagas especiais no ensino superior para estes casos?

A educação está doente e sofre de bipolaridade. Por um lado, um rigor exagerado com programas extensos que tiram a saúde aos bons alunos; por outro lado, um facilitismo para os que não se esforçam. Como explicar aos meus filhos que o esforço afinal é premiado? Que vale a pena, sempre! Que a escola pública é serviço público e todos devem ter direito a uma escola gratuita com qualidade? Com que ferramentas irá trabalhar um professor para incentivar um aluno desinteressado a estudar? Quais as implicações destas medidas no incremento do grande tumor da educação, a indisciplina?

Acredito que estas medidas sendo implementadas vão inflacionar gravemente a indisciplina, o cansaço e a desmotivação dos professores.

Este Natal, peço parcimónia, muita parcimónia na generalização das medidas tomadas.

Na realidade, a educação está em coma, pois está centrada no domínio cognitivo, em entupir alunos com conhecimento que está, muitas vezes, à curta distância, num clique no Google ou numa folha de Excel e muito pouco no domínio social e emocional. Estaremos a criar máquinas humanas numa época em que a robótica quase domina o mundo? Só a componente emocional poderá superar a máquina.

Este Natal, peço menos burocracia para a escola, mais adequação do ensino à realidade e mais respeito pelo processo, neste sentido, talvez nos aproximemos do reflexo do tão falado ensino finlandês.

Sendo real a importância de estudos realizados por especialistas, devemos admitir que quando leccionamos no ensino superior ou nos cingimos a estudos de centros de investigação, não vivemos uma sala de aula. Os verdadeiros problemas estão lá e é necessário estar em contacto com quem vive a escola no seu dia-a-dia, para perceber os problemas fulcrais e dirigir o sistema para o rumo certo.

Para quê tanta extensão de programas e tão pouca adequação à realidade dos nossos alunos? Penso no programa de Matemática do ensino secundário, tão extenso e tão dependente de conteúdos de anos anteriores, que não sendo adquiridos, deixam alunos pelo caminho e fazem-nos mudar de rota. Isto faz os sonhos morrer e uma Educação que mata sonhos é uma Educação a falecer!

A solução poderia passar por programas mais curtos mas que podem ser explorados com outra profundidade, que permitissem que as aprendizagens, mesmo essenciais, fossem adquiridas pela maioria e isto só se ganha com mais tempo.

Tempo para leccionar, tempo para dar exemplos, tempo para repetir, para reflectir, para praticar, para inter-relacionar conceitos. Tempo, mas a Educação está stressada!

Ainda existe a questão ecológica, é que os agentes de educação, os professores, estão em vias de extinção. A imagem que passa de professores com a casa às costas, sem perspectivas futuras, com carreiras congeladas, salários baixos e maltratados, não são  factores convidativos para os nossos jovens enveredarem por esta profissão.

Ainda me lembro de alguém cheio de sonhos, com média final de secundário de 18 valores, que decidiu concorrer a um curso de ensino e as reacções sociais foram tão adversas. Com 18 anos e inspirado pelo filme Clube dos Poetas Mortos, não se entende por que não dar o melhor que se tem ao mundo! Na realidade, a profissão tem de ser dignificada e isso começa em casa.

Relativamente, aos sussurros sobre novas medidas de colocação dos professores, peço mais uma vez, cautela. Lembro-me do flagelo dos meus tempos, em que mudar de porta de faculdade ou escola de educação, dava lugar a uma sobrevalorização das médias finais de curso. A injustiça dos concursos por causa média e que até se pensou curar a ferida com uma prova de entrada na profissão, que não teve sucesso. No entanto, a selecção a nível local pode levar a outros campos que preocupam a muitos. Ainda assim, o sistema tenta ser o mais uniforme possível com listas publicadas, acessíveis a verificação de todos, parecendo ser um sistema transparente. Os professores precisam desse respeito, da transparência, da lealdade, do reconhecimento e o futuro precisa deles!

Enquanto nós, sociedade não dermos valor a este cluster de pessoas mágicas, a Educação continuará em coma e para a acordarmos precisamos de todos, até dos que julgam que educar é fácil!

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