Negociações de paz com os taliban foram reatadas, diz Trump

O Presidente norte-americano aterrou de surpresa em Cabul, no Afeganistão, e anunciou que os talibã querem agora um cessar-fogo enquanto decorrerem as conversações. Foi a primeira visita de Trump ao país onde decorre a mais longa guerra que envolve os Estados Unidos.

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Trump garantiu aos soldados norte-americanos que a sua Administração está empenhada em "aniquilar terroristas" Reuters/TOM BRENNER

Aterrou esta quinta-feira sem avisar em Cabul, no Afeganistão, e fez um anúncio que poucos esperavam ouvir no Dia de Acção de Graças: norte-americanos e taliban voltaram a sentar-se à mesa das negociações. O Presidente norte-americano, Donald Trump, quer alcançar a paz no Afeganistão para retirar ou reduzir o contingente militar no país a pouco mais de um ano das presidenciais norte-americanas de 2020.

“Os taliban querem fazer um acordo de paz e estamo-nos a encontrar com eles e a dizer que tem de haver um cessar-fogo. Não queriam fazer um cessar-fogo e agora querem fazê-lo e acredito que provavelmente vai resultar”, disse Trump aos jornalistas assim que aterrou no aeroporto de Bagram, onde se encontra o quartel-general da Força Aérea dos Estados Unidos no país.

Quando Trump saiu do avião, já tinha o Presidente afegão à sua espera na pista do aeroporto de Bagram. Reuniram-se à porta fechada por duas horas e Ghani disse aos jornalistas que pediu a Trump que “não imponha limites ao tipo de paz que garante os ganhos do último ano”. “Nunca iremos permitir a repetição do 11 de Setembro”, disse o chefe de Estado afegão, numa clara referência aos receios norte-americanos de o país voltar a ser um refúgio de terroristas internacionais, como foi de Osama bin Laden.

Os taliban continuam a rejeitar negociar com o Governo afegão, que vêem como ilegítimo e mera marioneta dos Estados Unidos. E nem o que parecem ser acções de aproximação os convencem. Poucos dias antes, os taliban libertaram dois reféns, um norte-americano e outro australiano, em troca de três islamistas sob custódia do Governo afegão. “Esperemos que isto leve a mais boas acções na frente da paz, como um cessar-fogo que ajude a terminar esta longa guerra”, escreveu na altura Trump no Twitter. 

Há quase quatro anos na Casa Branca, o Presidente nunca tinha visitado o país onde decorre a mais longa guerra que envolve os Estados Unidos – 18 anos, causando a morte a mais de 2400 norte-americanos e de milhares de afegãos. Em 2019, já morreram 19 soldados e dezenas de afegãos, dos quais 30 com um ataque de um drone norte-americano a um campo agrícola.

A viagem não é por acaso. A pouco mais de um ano das presidenciais de 2020, Trump precisa urgentemente de uma vitória na frente da política externa e que afaste as atenções do impeachment. As negociações sobre a desnuclearização da Coreia do Norte estão num impasse, o Irão resiste às sanções e continua a desafiar Washington, o regime venezuelano de Nicolás Maduro mantém-se, apesar das inúmeras dificuldades, e na Síria Trump foi acusado de abandonar os curdos, que desde 2015 combatiam lado a lado com as forças norte-americanas contra o Daesh. 

Trump prometeu na campanha das presidenciais de 2016 fazer regressar todas as tropas que continuavam no Afeganistão e pouco depois viu-se obrigado a voltar atrás com a palavra dada. Em Agosto de 2017, aumentou o contingente militar dos 8400 deixados pela Administração Obama para os 14 mil, tendo-o, entretanto, reduzido para 12 mil. Em Dezembro de 2018, Trump queria a retirada total das tropas norte-americanas, mas ainda hoje continuam no terreno

Negociações sem cessar-fogo

As negociações entre Washington e os taliban decorreram a par e passo com o escalar da violência. As tropas norte-americanas e afegãs pressionaram os taliban, ora com operações militares de infantaria ora com atentados contra as lideranças no terreno. Por sua vez, os taliban aumentaram o número de atentados contra infra-estruturas norte-americanas e afegãs, atingindo inclusive um hospital e causando a morte a muitos pacientes e pessoal médico. 

A falta de um cessar-fogo enquanto se negociava a paz foi um dos principais erros apontados pelos analistas. Quando um soldado norte-americano morreu num atentado dos taliban Trump aproveitou a oportunidade para retirar Washington da mesa das negociações dizendo que as conversações estavam “mortas". As negociações duravam desde Outubro de 2018 e o Presidente foi acusado de ter impedido que se alcançasse a paz no país. 

Além disso, o Governo afegão foi excluído da mesa das negociações pelos taliban, algo que os Estados Unidos aceitaram. Uma decisão que apenas aumentou os receios entre os responsáveis afegãos de que seriam abandonados à sua sorte quando as últimas tropas norte-americanas saíssem do Afeganistão – os afegãos ainda se lembram da queda do regime apoiado pelos soviéticos poucos anos depois de estes abandonarem o país, em 1989. 

Surpreendidos pelo fim abrupto das negociações, os taliban retaliaram prometendo levar a cabo ainda mais ataques e atentados, para matar o maior número possível de norte-americanos. As eleições presidenciais, no final de Setembro, ficaram assombradas pela violência e o futuro das negociações foram o principal tema em discussão entre os dois candidatos, o Presidente Ashraf Ghani e o líder do Governo, Abdullah Abdullah. Nenhum dos candidatos venceu logo na primeira volta e desde aí que a segunda volta tem sido adiada.

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