Casa Branca negoceia venda de tecnologia nuclear à Arábia Saudita, talvez ilegalmente

Dirigentes norte-americanos queriam passar por cima de leis federais que obrigam a um forte escrutínio de qualquer exportação de recursos nucleares.

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Donald Trump com o príncipe saudita Mohammed bin Salman e o secretário da Energia Rick Perry, de lado, à direita SAUDI PRESS AGENCY/EPA

Um inquérito da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos mostra que vários responsáveis da Administração Trump, incluindo o secretário do Departamento de Energia e o genro do Presidente, Jared Kushner, prosseguiram negociações com a Arábia Saudita para a venda de tecnologia nuclear, apesar das objecções e alertas dos advogados da Casa Branca​. 

Michael Flynn, o primeiro conselheiro de Segurança Nacional do Presidente, foi o principal impulsionador do projecto, quando Donald Trump chegou à Casa Branca - o general na reserva tinha trabalhado sobre o tema para a empresa que defendia o plano de exportação de tecnologia nuclear para Riad, e continuou a promovê-lo nas suas novas funções. Os advogados da Casa Branca avisaram-no que isto poderia violar leis para travar a proliferação nuclear e criava conflitos de interesse para Flynn.

Apesar de Flynn ter sido despedido ao fim de duas semanas, o projecto manteve-se prioritário para a Administração Trump, segundo o relatório da Comissão de Supervisão e Reforma do Congresso publicado na noite de terça-feira.

A mais recente reunião decorreu na Casa Branca na semana passada, onde esteve presente Rick Perry, secretário do Departamento de Energia, e na próxima semana Jared Kushner tem agendada uma viagem ao Médio Oriente, e leva este tema na agenda, diz o Washington Post. Uma das empresas que constrói centrais nucleares, a Westinghouse Electric, é subsidiária da Brookfield Asset Management, que salvou financeiramente a família de Kushner.

O Partido Democrata, com maioria na Câmara dos Representantes, quer abrir um inquérito.“São necessárias investigações adicionais para concluir se as acções da Administração Trump tiveram em consideração o interesse de segurança nacional dos EUA ou se, pelo contrário, serviram os que pretendem beneficiar financeiramente desta potencial mudança da política externa dos EUA”, afirmam os autores do relatório.

Entre as principais preocupações está o potencial conflito de interesses de Flynn. Em causa está também a intenção de ignorar as leis que sujeitam qualquer exportação de tecnologia nuclear a várias instâncias de supervisão.

O ministro dos Negócios Estrangeiros do Irão, Mohammad Javad Zarif, comentou as notícias sobre este relatório no Twitter: "Primeiro, um jornalista esquartejado: agora, a venda ilícita de tecnologia nuclear à Arábia Saudita expõem a hipocrisia dos EUA".

O objectivo declarado do plano é a construção de centrais nucleares na Arábia Saudita – que, apesar de ser um dos maiores exportadores de petróleo, quer investir em fontes de energia limpas. Mas persiste o receio de que a tecnologia exportada tenha uma utilização militar, em especial num contexto de grande rivalidade regional com o Irão. Desde que chegou à Casa Branca, Trump tem-se empenhado em aprofundar a aliança com Riad, e ao mesmo tempo rasgou o acordo nuclear com o Irão e voltou a aplicar sanções económicas.

“Os especialistas receiam que a transferência de tecnologia nuclear sensível norte-americana permita à Arábia Saudita produzir armas nucleares, contribuindo para a proliferação num Médio Oriente já instável”, diz o relatório.

O congressista democrata Stephen Lynch, da comissão responsável pelo relatório, disse estar “extremamente preocupado”. “Isto seria uma violação da lei federal e iria pôr a nossa segurança nacional em sério risco”, afirmou.

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