Corbyn quer eleições e admite adiar o “Brexit” se as vencer

Líder trabalhista assumiu que terá de prolongar o artigo 50.º para renegociar acordo de saída com a UE, num discurso defensivo sobre a estratégia para os próximos dias. Confirmou censura ao Governo, sem referir datas, e insistiu que a prioridade é haver eleições e não um referendo.

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Jeremy Corbyn, líder do Partido Trabalhista Reuters/PHIL NOBLE

Jeremy Corbyn pôs um travão aos anseios de uma fatia alargada do seu Partido Trabalhista, que quer acelerar a apresentação de uma moção de censura ao Governo de Theresa May e que suspira por ouvir o líder defender um segundo referendo ao “Brexit”. Num discurso em Wakefield, sobre a estratégia do Labour para a saída do Reino Unido da União Europeia, estabeleceu como prioridade chumbar o acordo da primeira-ministra e marcar eleições de seguida, assumindo que poderá ser necessário adiar a data de saída, para poder sentar-se à mesa com Bruxelas.

Apesar de reconhecer que quer propor uma moção de censura ao executivo conservador, o trabalhista preferiu esconder o jogo. Não disse quando o faria. “A nossa prioridade terá de ser [convocar] uma eleição. Não só é a opção mais prática, como é também a mais democrática”, insistiu.

May teve duas derrotas no Parlamento em dois dias. Viu os deputados limitarem a acção do Governo num cenário de divórcio sem acordo e reduzirem, de 21 para três dias, o tempo disponível para apresentar o seu “plano B” para o “Brexit”, se o “plano A” for chumbado. Face à oposição dentro e fora da aliança parlamentar entre o Partido Conservador e o Partido Unionista Democrático, tudo aponta para uma terceira derrota, mais estrondosa na terça-feira, quando o acordo for apresentado na Câmara dos Comuns.

O cenário dificilmente poderia ser mais desfavorável para a primeira-ministra, pelo que se aguardava com expectativa ouvir Corbyn marcar posição e clarificar a estratégia do Labour para os próximos episódios da saga do “Brexit”, um dia depois de dois ministros-sombra do partido terem garantido que haveria uma moção para derrubar o Governo “imediatamente” a seguir ao acordo ser rejeitado pelos deputados.

Mas Corbyn pautou-se pela ambiguidade. Por um lado, desafiou May a convocar eleições e assegurou que se a primeira-ministra não o fizer, o Labour avança para a censura. Mas por outro, disse que essa movimentação só ocorrerá “no momento em que o partido entender que terá melhores hipóteses de sucesso”. “É óbvio que não temos deputados suficientes para ganhar uma moção sozinhos. Por isso precisamos que os restantes membros da câmara votem connosco, para acabarmos com o impasse”, justificou.

Na cabeça do líder trabalhista só a eleição faz sentido e talvez isso ajude a explicar a hesitação em comprometer-se em demasia com cenários alternativos. 

Apesar de Bruxelas já ter repetido que o acordo na mesa é o único que está disposta a oferecer, Corbyn continua convicto de que é possível rever os termos do “Brexit”. Uma possibilidade que, defende, está ao alcance do vencedor das eleições, que receberá “um mandato renovado para negociar um acordo melhor para o Reino Unido”.

Com a saída da UE agendada para 29 de Março, resta, no entanto, pouco tempo ao Labour para pôr em prática o plano de Corbyn. Questionado sobre o calendário apertado em que pretende ter uma moção, uma eleição, uma renegociação do acordo e um divórcio, o trabalhista acabou por oferecer à assistência a única verdadeira novidade da sua intervenção: um Governo liderado por si teria de pedir aos 27 Estados-membros a extensão do prazo definido pelo artigo 50.º do Tratado da UE e consequente adiamento da data de saída.

Uma decisão que pode ser determinante para o futuro próximo do país, uma vez que travaria a saída sem acordo que May apresenta como alternativa única ao seu plano, mas que Corbyn apenas acolhe pelos “aspectos práticos” da sua estratégia. 

Porque reverter o “Brexit” continua a ser algo que não o seduz. “Qualquer líder político que queira voltar a unir este país não pode ignorar nem os 17 milhões que votaram pela saída, nem os 16 milhões que votaram pela permanência”, afiançou. “O plano alternativo do Labour foi pensado para obter um apoio alargado e para respeitar o resultado democrático do referendo”. 

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