Governo sob pressão para aplicar regras de idoneidade a Tomás Correia

Novo Código das Associações Mutualistas – em vigor desde Setembro – está à beira de se aplicar à dona do Montepio e vem, desta forma, dar maior rigor aos requisitos de idoneidade dos seus novos gestores antes das eleições de dia 7 de Dezembro.

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Miguel Manso

Até ao final desta semana deverá ser dado o último e decisivo passo do processo de levar à prática o novo Código das Associações Mutualistas, com a publicação do despacho que vai aplicar ao Montepio o novo conjunto de regras previstas na legislação mutualista. Entre as regras estão os requisitos mais apertados sobre a idoneidade dos gestores, uma circunstância que aumenta a pressão sobre Tomás Correia, mesmo que vença as eleições do próximo dia 7 de Dezembro.

Segundo apurou o PÚBLICO junto de fonte próxima do processo legislativo, o Ministério do Trabalho e da Segurança Social deverá publicar nos próximos dias o despacho conjunto (com as Finanças) que determina que o novo código se passe a aplicar à Associação Mutualista Montepio Geral (AMMG), bem como à Monaf – Montepio Nacional da Farmácia, ficando ambas sob a supervisão da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF). O Governo tem estado sob pressão não só dos candidatos concorrentes a Tomás Correia, mas também dos próprios prazos do processo eleitoral, que corre em paralelo com o legislativo neste caso.

As listas candidatas ao Montepio têm vindo a apelar a uma audiência com Vieira da Silva, ministro do Trabalho e da Segurança Social, para tratar de dois temas: a existência de um potencial risco de fraude nas eleições, por parte da lista A, chefiada por Tomás Correia; e apurar em que fase se encontra, precisamente, a entrada em vigor do novo código das mutualistas. 

O código entrou em vigor a 2 de Setembro, culminando um longo processo legislativo que passou pela promulgação do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, no passado dia 8 de Julho. Desde a sua entrada em vigor correram 60 dias para a proposta de definição das entidades abrangidas pelas novas regras, após parecer da ASF, algo que, segundo soube o PÚBLICO, aconteceu a 12 de Outubro. A partir daqui, começaram a contar novos 60 dias para a decisão final. Esta já estará tomada, estando a sua formalização por dias, até ao final desta semana, o que acaba não só por antecipar o final do prazo – que deveria terminar em meados de Dezembro, já depois das eleições para a nova liderança da dona do banco Montepio.

Desta forma, o Governo antecipa a aplicação das novas regras à Associação Mutualista Montepio e aos gestores escolhidos nestas eleições – em particular, a Tomás Correia, visado em vários processos de investigação pelo Banco de Portugal (BdP) e pelo Ministério Público, por suspeitas de ilícitos graves da esfera regulatória e criminal. Assim, mesmo que vença as eleições, existe uma ameaça à sua tomada de posse, dado que o novo código determina que quem for alvo de contra-ordenações do Banco de Portugal ou de inquéritos judiciais, por suspeita de actos ilícitos cometidos no âmbito da sua actividade profissional, não pode ocupar cargos de gestão.

Em causa está o especificado no artigo 101º, nomeadamente que “não podem ser reeleitos os titulares dos órgãos associativos que, mediante processo judicial, tenham sido declarados responsáveis por irregularidades cometidas no exercício dessas funções ou removidos dos cargos que desempenhavam, bem como identificados como pessoas afectadas pela qualificação de insolvência como culposa”.

Adicionalmente, no artigo 100º, mais abrangente, é definido que só são elegíveis os associados que cumpram os requisitos de idoneidade, definidos como “pessoas idóneas, nomeadamente por não terem sido condenados, em Portugal ou no estrangeiro, por crime doloso contra o património, abuso de cartão de garantia ou de crédito, usura, insolvência dolosa ou negligente, apropriação ilegítima de bens do sector público ou não lucrativo, falsificação, gestão danosa, corrupção, branqueamento de capitais, prática ilícita de gestão de fundos de pensões, abuso de informação e manipulação do mercado de valores mobiliários, salvo se, entretanto, tiver ocorrido a extinção da pena”.

Assim, o diploma estruturante para o sector das associações mutualistas terá duas consequências imediatas que se cruzam: uma é de natureza política, pois acaba com a pressão pública sobre a inacção do Governo, dado que o despacho que faltava está por dias e chegará antes do acto eleitoral e, sobretudo, antes da eventual tomada de posse (em Janeiro); outra é que, caso vença as eleições, Tomás Correia dificilmente poderá tomar posse como presidente do Montepio. Ocuparia esse cargo pela quarta vez, mas debaixo de uma polémica acesa sobre a sua idoneidade para o seu exercício.

E não é só sobre Tomás Correia que correm inquéritos no BdP e no Ministério Público. Da candidatura do actual presidente há mais dois nomes abrangidos por inquéritos: Luís Almeida (BdP, venda de unidades de participação da Caixa Económica Montepio Geral), Carlos Beato (Ministério Público, no âmbito do processo Comporta).

Os candidatos aos órgãos sociais da associação mutualista terão de passar todos pelo crivo da ASF, com a equipa de José Almaça a ter de avaliar a sua adequação ao cargo em termos técnicos e de credibilidade.

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