Novo chefe de gabinete de Costa foi advogado do SIRESP contra o Estado

Desde os incêndios, várias têm sido as negociações com a SIRESP, SA que acabaram por não correr bem ao Governo. Do outro lado esteve o actual chefe de gabinete de Costa. Francisco André pediu agora escusa sobre estes assuntos.

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dANIEL ROCHA

Francisco André é, desde o dia 1 de Outubro, o novo chefe de gabinete do primeiro-ministro, António Costa. Mas até chegar a São Bento esteve do outro lado da mesa das negociações entre o Estado e a SIRESP, SA, a empresa que gere a rede nacional de emergência e segurança – e foram várias desde os incêndios de 2017, que culminaram em recuos, falhanços ou adiamentos nos objectivos do executivo. Uma dessas negociações foi recentemente avaliada pelo Tribunal de Contas, que lhe apontou “uma total ausência de transparência".

O novo responsável pelo gabinete do primeiro-ministro, membro da comissão permanente do PS responsável pelas relações internacionais, era o advogado da empresa privada desde 2016 — na altura desempenhava o papel em conjunto com o actual secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Mendonça Mendes. Com a saída de Mendonça Mendes para o Governo, a pasta ficou por inteiro nas mãos de Francisco André, primeiro na sociedade de advogados de que ambos foram sócios-fundadores, a AM&Associados, em conjunto com mais dois sócios, e depois na Pinto Ribeiro, Advogados.

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Francisco André, novo chefe de gabinete de António Costa dr

Francisco André transitou para a Pinto Ribeiro com a fusão das duas sociedades em Julho deste ano e manteve a conta da SIRESP nesta nova sociedade durante cerca de três meses até ir para São Bento. Em respostas ao PÚBLICO, a SIRESP, SA informa que a empresa continua a ser “assessorada juridicamente pela equipa de advogados do escritório Pinto Ribeiro Advogados”, mas já não por Francisco André, desde Setembro.

Contudo, ainda é o nome deste advogado que consta como mandatário da SIRESP, SA num processo que corre no Tribunal Cível de Lisboa, uma informação ainda não actualizada no sistema. Isto, porque Francisco André cessou “a sua actividade profissional como advogado no dia 18 de Setembro de 2018, data em que requereu a suspensão da sua inscrição como advogado junto da Ordem dos Advogados, cessando também a partir dessa data qualquer intervenção profissional junto dos clientes da sociedade de advogados onde exercia a sua profissão, na qual deixou de ter qualquer participação social ou vínculo”, respondeu o gabinete do primeiro-ministro a perguntas enviadas pelo PÚBLICO.

O gabinete do primeiro-ministro nada diz sobre se considera que há ou não incompatibilidades para o exercício do cargo, mas responde que Francisco André pediu dispensa de tratar destes assuntos.

Ao contrário dos governantes, aos chefes de gabinete não se aplica o regime de incompatibilidades, nem têm, tão pouco, de entregar declarações de rendimentos junto do Tribunal Constitucional, apesar de terem um papel importante na estrutura do Estado e de, no caso de Francisco André, lhe passarem pelas mãos todos os documentos que chegam à secretária de António Costa. Não se aplicando a lei das incompatibilidades, aplica-se o Código de Conduta do Governo. “O Dr. Francisco André não terá, como resulta da Lei e do Código de Conduta do Governo, qualquer intervenção em assuntos nos quais tenha intervindo como advogado”, garante o gabinete de António Costa.

Para a SIRESP também não há qualquer problema. “A empresa considera que não há nenhuma incompatibilidade”, foi a resposta dada ao PÚBLICO.

O PÚBLICO questionou o gabinete do primeiro-ministro sobre o papel de Francisco André nas negociações que, no último ano, envolveram o Estado e a empresa de capital privado (apesar de o Governo já ter garantido a entrada no capital com 33%, à data era totalmente privada com uma tutela pública) e ainda sobre se o primeiro-ministro considerava existir “incompatibilidade do seu chefe de gabinete em relação a este assunto”. A estas perguntas não obteve resposta.

Outra das perguntas sem resposta até ao fecho desta edição diz respeito às empresas e assuntos sobre os quais Francisco André pediu dispensa, uma vez que, de acordo com as respostas enviadas, o chefe de gabinete não iria intervir noutros assuntos ou actos que se prendam com empresas com que trabalhou enquanto advogado.

De acordo com a sua nomeação para chefe de gabinete, publicada a 15 de Outubro mas com efeitos desde o dia 1 de Outubro, Francisco André é advogado desde 2003, foi chefe de gabinete de Jorge Lacão enquanto este foi secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros entre 2005 e 2008, e conselheiro na Representação Permanente de Portugal (Reper) na União Europeia.

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