Perigo de fuga justifica proibição de Rangel sair do país sem autorização

Dupla nacionalidade portuguesa e angolana do juiz fundamentaram decisão. Rangel e Fátima Galante suspensos de funções e proibidos de contactar dezenas de pessoas.

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LUSA/ANTÓNIO PEDRO SANTOS

Foi o perigo de fuga que justificou que o juiz do Tribunal da Relação de Lisboa, Rui Rangel, tenha ficado proibido de sair do país sem autorização, apurou o PÚBLICO. Se quiser fazê-lo terá que pedir um aval prévio ao tribunal. Esta é uma das medidas de coacção decretadas esta quarta-feira por um juiz do Supremo Tribunal de Justiça, no âmbito da Operação Lex, que tem aquele magistrado como principal arguido.

A medida de coacção foi confirmada por uma nota da Procuradoria-Geral da República (PGR), que não adianta, contudo, que perigos fundamentaram a decisão do juiz de instrução. O PÚBLICO pediu ao Ministério Público informação sobre essa questão e sobre as medidas de coacção que tinham sido solicitadas pelo procurador Paulo Sousa, mas até ao início da noite desta quarta-feira não obteve resposta.

Rui Rangel e a sua mulher, Fátima Galante, também juíza da Relação de Lisboa, estão ainda suspensos de funções e proibidos de contactarem a maioria dos arguidos e outros envolvidos no caso, uma lista com várias dezenas de pessoas. 

Segundo o advogado de Rangel, João Nabais, a proibição de saída do país justifica-se apenas pelo facto de o juiz possuir dupla nacionalidade portuguesa e angolana, o que não sucede com Fátima Galante, que não foi sujeita a essa medida. O advogado admitiu que os passaportes do juiz da Relação tivessem sido apreendidos nas buscas de que foi alvo, garantindo, de qualquer forma, que o cliente ia respeitar as determinações do tribunal.

O problema reside no facto de Angola não extraditar cidadãos nacionais, o que significaria que se o juiz se refugiasse naquele país não poderia ser entregue às autoridades portuguesas. Há, aliás, um caso que continua a gerar alguma tensão entre as autoridades espanholas e as angolanas e que envolve um cidadão português que obteve cidadania angolana. Em 2016, o diário El Mundo fazia manchete com o caso noticiando que o português/angolano, acusado de um desfalque de cem milhões de euros ligado a um negócio de venda de armas a Angola, se encontrava em Luanda, protegido pelas autoridades angolanas.  

À saída do Supremo, João Nabais realçou que o cliente, neste momento, não está indiciado nem por crimes de corrupção, nem por recebimento indevido de vantagem. "É importante que isto fique claro", sublinhou, sem explicar por que motivo os crimes referidos nos mandados de buscas teriam “caído”. O advogado admitiu, contudo, que as imputações incluem tráfico de influência, branqueamento de capitais e fraude fiscal. 

Na nota, a PGR continua a referir de forma genérica que neste inquérito se investigam "suspeitas de crimes de tráfico de influência, de corrupção/recebimento indevido de vantagem, de branqueamento e de fraude fiscal", sem precisar sobre quem recai cada uma das suspeitas. O Ministério Público adianta ainda que o processo tem 13 arguidos constituídos e que na investigação estão a colaborar a Polícia Judiciária e a Autoridade Tributária. 

Suspensos de funções

Os dois juízes já se encontravam suspensos de funções desde dia 2 deste mês, no âmbito do processo disciplinar aberto pelo Conselho Superior da Magistratura. Apesar de em termos práticos a medida ter o mesmo objectivo, a suspensão preventiva determinada pelo órgão de disciplina dos juízes tem limitações temporais, que não se aplicam às medidas de coacção decretadas no âmbito dos processos-crime. 

Na passada-sexta-feira o Ministério Público informou o tribunal sobre as medidas de coacção que considerava adequadas, tendo a defesa dos dois juízes tido até esta segunda-feira para se pronunciar. Esta quarta-feira o juiz conselheiro Pires da Graça anunciou a sua decisão. 

Recorde-se que na passada quinta-feira os dois juízes da Relação estiveram no Supremo, mas optaram por não prestar declarações no primeiro interrogatório judicial. Essa decisão foi justificada pelas defesas devido ao facto de o juiz de instrução ter dado apenas uma hora aos advogados para consultarem o despacho do Ministério Público com o resumo das imputações e os elementos que as sustentam. Com Ana Henriques

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