Grandes multinacionais pressionam Trump para cumprir Acordo de Paris

Mais de 360 grandes empresas escreveram ao Presidente eleito dos EUA a exigir que não abandone o combate climático.

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O secretário de Estado dos EUA, John Kerry, chegou nesta quarta-feira à cimeira de Marraquexe Reuters

No dia em que a delegação dos EUA chegou à 22.ª Conferência da ONU sobre Alterações Climáticas (COP22), a decorrer na cidade marroquina de Marraquexe, mais de 360 grandes empresas, a maior parte norte-americanas, escreveram uma carta a Donald Trump a pedir que cumpra o acordo climático de Paris, assinado em Dezembro de 2015 em Paris por 197 signatários e já ratificado por 104 países, entre os quais os Estados Unidos.

Numa conferência ensombrada pelas ameaças de Trump em abandonar o Acordo de Paris, o secretário de Estado norte-americano, John Kerry, dirigiu-se à COP22 dizendo acreditar que, quando o Presidente eleito tomar posse, mudará algumas ideias expressas durante a campanha eleitoral, nomeadamente sobre o combate climático. E garantiu que “não vai haver marcha atrás” nas políticas climáticas dos EUA.

DuPont, Gap, Hewlett Packard, Kellog, Hilton, Nike ou Mars são algumas das empresas que assinaram a carta enviada ao Presidente. Entre as signatárias contam-se ainda a General Mills, Levi Strauss, L'Oréal USA, Schneider Electric e a Unilever.

"Nós, membros da comunidade empresarial e dos investidores nos Estados Unidos, reafirmamos o nosso profundo compromisso para enfrentar a mudança climática através da aplicação do Acordo histórico de Paris", escrevem os empresários, numa carta divulgada à margem da COP22.

A carta, que foi igualmente enviada ao Presidente em funções, Barack Obama, e aos congressistas norte-americanos, diz que a não existência de uma economia de baixo carbono “coloca em causa a prosperidade dos Estados Unidos”.

"Apelamos ao povo americano e ao Presidente eleito para apoiar firmemente a prossecução de políticas [redução das emissões de gases de efeito de estufa] que permitam aos Estados Unidos cumprir ou exceder os seus compromissos", escrevem as empresas na carta. O texto começa da seguinte forma: “Caro Presidente eleito Trump, Presidente Obama, membros do Congresso, líderes mundiais e COP22.” "Acreditamos que a economia dos EUA pode ser eficiente apostando na energia de baixo carbono. Acreditamos que soluções inovadoras e acessíveis podem criar empregos e fortalecer a competitividade norte-americana", dizem as empresas.

As empresas que assinam o manifesto também pedem "aos líderes eleitos nos Estados Unidos", ou seja, a maioria republicana na Câmara de Representantes e no Senado, a "continuidade das políticas de baixa emissão" de gases do efeito estufa. As multinacionais admitem que mudar o modelo energético custará milhões de dólares, mas fazem notar que também representa uma oportunidade de negócios.

Trump, que durante a campanha classificou o aquecimento global como uma “fraude inventada pelos chineses para minar a industrialização dos EUA”, veio confirmar após a sua eleição que abandonará o acordado de Paris, assegurando que os Estados Unidos “deixarão de contribuir com milhões de dólares para os programas da ONU contra as alterações climáticas”, passando a aplicar esse dinheiro para conseguir um melhor ambiente no seu país. O Acordo de Paris entrou em vigor no dia 4 deste mês.

“Não haverá marcha atrás”

Dirigindo-se aos participantes na COP, John Kerry afrmou que não podia especular sobre as políticas climáticas do Presidente eleito, mas disse acreditar que “as suas opiniões podem mudar quando entrar em funções”.

“Uma coisa posso dizer: enquanto fui secretário de Estado, aprendi que alguns assuntos são vistos de maneira diferente quando estamos em funções. São vistos de maneira diferente quando se está em campanha e, depois, quando se ocupa o cargo”, afirmou.

Os Estados Unidos "estão no bom caminho para atingir os seus objectivos climáticos" e "não vai haver marcha atrás", acrescentou Kerry.

"Desde o início desta COP, houve uma eleição e eu sei que isso deixou um sentimento de incerteza sobre o futuro", admitiu o secretário de Estado frente de uma plateia que contou com a presença de muitos chefes de Estado e de responsáveis políticos de dezenas de países.

"Ninguém tem o direito de tomar decisões que afectam milhões de pessoas com base na ideologia", acrescentou, aconselhando Trump, ainda que sem o nomear, a obter informação junto dos que sabem da matéria, como vítimas do aquecimento global ou cientistas do clima.

Tempo de falar de financiamento

Também ontem começaram a ser discutidas em Marraquexe as questões do financiamento dos países desenvolvidos aos países mais pobres. Um debate difícil e que não teve grande avanço.

Em 2009, os países ricos prometeram 100 mil milhões de dólares por ano (cerca de 91.200 milhões de euros) a partir de 2020, para ajudar as nações em desenvolvimento a financiar a transição para energias limpas e a adaptar-se aos efeitos do aquecimento, de que são as primeiras vítimas.

Como defendido pelos países em desenvolvimento, o texto de Paris estabeleceu que a soma prevista é apenas “um tecto”. Um novo objectivo financeiro será definido em 2025.

"O financiamento para adaptação é absolutamente insuficiente", disse em conferência de imprensa Harjeet Singh, da ActionAid, membro da rede global de organizações não governamentais de combate às alterações climáticas. “Os países em desenvolvimento pediram que este número fosse multiplicado por quatro até em 2020, mas eles não nos deram ouvidos", lamentou.

Dos 100 mil milhões de dólares prometidos por ano até 2020, os países ricos comprometeram-se a duplicar o financiamento para acções de adaptação, mas o Programa Ambiental da ONU avaliou na passada semana as necessidades de adaptação e concluiu que são necessários entre 140 e 300 milhões de dólares por ano até 2030.

Qual o montante do financiamento e como vai o dinheiro chegar aos países em desenvolvimento é uma das questões centrais da COP22, que termina sexta-feira.

 

 

 

 

 

 

 

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