Portugal 2024: o compromisso histórico

Este compromisso histórico deve ser proposto ao país pelos dois maiores partidos nacionais, o PS e o PSD.

Este é o tempo da grande política em Portugal, o tempo de um grande compromisso histórico na sociedade portuguesa. Para isso, precisamos de protagonistas que não tenham medo do futuro. O futuro interessa a todos, porque é lá que vamos passar a maior parte do nosso tempo de vida. Este compromisso histórico para dez anos 2014-2024 realiza-se em dois planos, o compromisso no plano interno e o compromisso no plano europeu. Este compromisso histórico deve ser proposto ao país pelos dois maiores partidos nacionais, o PS e o PSD, deve inaugurar um grande debate nacional e ser aberto à subscrição de todos os grandes parceiros e actores nacionais.

1 – O compromisso histórico (CH) no plano interno

No plano interno, o CH deve formular as grandes propostas de reformas estruturais para o país: a reforma do sistema eleitoral, a reforma do sistema de governo, a reforma do Estado-administração, a reforma do Estado local, a reforma do Estado social, a reforma do Estado empresarial e a reforma do Estado constitucional na medida do necessário para realizar todas as outras reformas enunciadas. Estas reformas devem ser progressivas, graduais e escalonadas no tempo de uma década. Estas reformas devem procurar responder à questão fundamental da sociedade e da economia portuguesa, a saber: como proceder à reforma estrutural da despesa do Estado para níveis próximos de 40% do PIB de tal modo que a redução substancial da carga fiscal possa ser utilizada como instrumento de competitividade fiscal e redistribuição do rendimento em benefício da economia e da sociedade portuguesas. Destas reformas faz parte, igualmente, a preparação de um programa de reformas para fortalecer a coesão social da sociedade portuguesa; por um lado, intensificar o combate à corrupção, evasão e fraude fiscais e economia clandestina e, de uma maneira geral, tudo o que envolve a prática do risco moral e do free raider e, por outro lado, preparar um acordo político alargado no que diz respeito à reposição gradual das medidas extraordinárias e transitórias que sacrificaram, neste período, os salários da função pública, as pensões e as prestações sociais.

2 – O compromisso histórico no plano europeu

A força negocial no plano europeu ganha-se, em primeira instância, com a força de um grande compromisso conseguido no plano interno e com a qualidade e estabilidade das propostas de reforma estrutural que o país se propõe efectivamente realizar. No plano europeu, o CH deve prosseguir, junto dos seus parceiros da zona euro e em primeira linha junto dos parceiros que foram objecto de programas de ajustamento bem-sucedidos, a defesa política das seguintes propostas:   

1. Um programa de redução estrutural da despesa pública, à volta de um 1% ao ano, para um patamar próximo dos 40% da despesa pública em 2024, de tal modo que possamos estabilizar as regras fiscais para um período suficientemente longo.

2. A negociação de um programa de reescalonamento ou reprofiling da dívida pública portuguesa, muito em especial dos 52 MM de euros dos créditos oficiais BCE e Comissão Europeia assente em dois vectores: um prazo de amortização alongado até 2050 e um ritmo de amortização que deve estar indexado à evolução nominal do PIB português como derrogações específicas ao tratado orçamental.

3. A negociação de um programa de prevenção e contingência, para fazer face a uma eventual instabilidade dos mercados financeiros internacionais, junto do Mecanismo Europeu de Estabilidade e do programa de intervenção do BCE nos mercados secundários, se tal se revelar necessário.

4. A preparação de um programa de crescimento e emprego para o período 2014-2024, que consagre o acordo político sobre um núcleo de investimentos de alto valor acrescentado e o acordo sobre um regime de incentivos que coloque a fasquia dos bens exportáveis próximo dos 60% do PIB em 2024; independentemente do regime de ajustamento que continuemos a realizar, importa negociar as disposições derrogatórias em matéria orçamental, fiscal e de política de concorrência que são necessárias.

5. A finalização da União Bancária, nas suas três vertentes principais, tem impactos positivos sobre a solidez bancária, a redução da segmentação financeira e a criação de condições de liquidez e crédito mais favoráveis.

6. A defesa política de um instrumento de gestão conjunta da dívida pública europeia, seja sob a forma de uma agência europeia de gestão do crédito público ou de um fundo europeu de redenção.

7. A reforma do sistema de recursos próprios da União tendo em vista reduzir a sua dependência das contribuições nacionais que, de algum modo, renacionalizaram o orçamento comunitário.

8. A defesa de uma política vigorosa de vizinhança para o Mediterrâneo através da criação de um Plano Delors para a União Mediterrânica.

Se formos capazes de conceber um pensamento estruturado em redor destas orientações da negociação institucional teremos construído uma retaguarda política negocial muito mais sólida, não apenas para negociar o programa de transição pós-troika mas toda a estratégia negocial que nos deve guiar no plano europeu.

Universidade do Algarve

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