EUA e China acordam trégua parcial e investidores reagem com frieza

Ficam ainda muitas matérias por resolver, mas EUA e China concordaram em travar a escalada de um conflito comercial que tem vindo a ameaçar o desempenho das economias dos seus países e do resto do mundo. Bolsas arrancaram hoje toldadas ainda pela incerteza em torno desta trégua.

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Vice primeiro-ministro chinês Liu He, esta sexta-feira com Donald Trump Reuters/YURI GRIPAS

Embora ainda não estejam definidos os detalhes, e que muitas questões importantes tenham sido deixadas para mais tarde, o entendimento parcial a que chegaram os Estados Unidos e a China traz ao confronto entre os dois países pela liderança económica mundial um novo período de trégua. Uma notícia recebida com alguma frieza pelos mercados no arranque da semana, mas que poderá contribuir para contrariar a tendência de abrandamento que se regista neste momento em vários pontos do globo.

Os sinais de que um anúncio de acordo estava próximo tinham vindo a acumular-se durante a semana passada, alguns deles através das mensagens mais conciliatórias que surgiam na conta do Twitter do presidente norte-americano. E, realmente, na sexta-feira ao fim do dia, a seguir à conclusão das negociações de dois dias em Washington entre os responsáveis políticos dos dois países (do lado chinês esteve presente o vice primeiro-ministro, Liu He), Donald Trump confirmou que tinha sido alcançado “um acordo muito substancial, fase um” que tem como objectivo começar a resolver o conflito comercial entre os EUA e a China que dura já há 18 meses.

As bolsas europeias arrancaram esta segunda-feira a recuar ligeiramente, em torno de 0,5%, perante as incertezas que ainda existem em relação a este acordo. Os sinais sobre a abertura dos mercados em Wall Street também eram negativos. Para além da falta de pormenores, os investidores na Europa estavam a valorizar mais, neste arranque de semana, os dados decepcionantes sobre a evolução da economia chinesa, que dá indicações de estar a abrandar. No entanto, as bolsas asiáticas fecharam a subir mais de um ponto percentual na primeira sessão da semana.

O acordo é classificado como “fase um” porque deixa de fora diversas das questões mais difíceis que as duas potências mundiais têm para resolver. O que as duas partes fizeram foi chegar a acordo naquilo que neste momento era possível e ganhar tempo para negociar outras áreas, esperando que os efeitos negativos sentidos pelas duas economias sejam entretanto mitigados.

Embora os detalhes não sejam conhecidos e ainda exista um texto final para definir completamente até Novembro (quando se espera que Trump e Xi Jinping se encontrem e assinem o documento), o acordo agora alcançado prevê que a China garanta uma maior protecção à propriedade intelectual das empresas norte-americanas, dê novas garantias de não manipulação da sua divisa, abra o seu mercado ao sector dos serviços financeiros norte-americano e reforce as suas compras de produtos agrícolas dos EUA num valor entre 40 e 50 mil milhões de dólares. Em contrapartida, disse o presidente norte-americano, os EUA não irão passar à prática a subida de 15% para 30% do valor das taxas alfandegárias cobradas a 250 mil milhões de dólares de produtos importados da China que estava prevista para o dia 15 de Outubro.

Ainda antes do anúncio, quando se começou a tornar claro que da visita da delegação chinesa a Washington sairia algum tipo de acordo, sentiu-se o entusiasmo dos mercados financeiros com este passo positivo, tendo os índices accionistas da Bolsa de Nova Iorque subido mais de 1%. Afinal de contas, alguns dos dias mais negativos nos mercados durante este ano sucederam quando se registava uma escalada do conflito. Para já, nas primeiras horas de negociações, os mercados estão à espera de mais detalhes antes de assumiram que esta trégua trará uma paz definitiva entre as duas potências.

E, para além dos mercados, será também lógico que investidores, empresários e consumidores fiquem agora com menos razões para pessimismo em relação à evolução da economia. O abrandamento registado em diversos países desde o início do ano – de que a Alemanha tem sido um dos principais exemplos – tem sido explicado pela deterioração de expectativas gerada pelo conflito comercial entre os EUA e a China.

Ainda assim, o acordo “fase um” agora anunciado não é o suficiente para fazer desaparecer todos os receios. Depois da “fase um” ficam a faltar, reconheceu Trump, uma “fase dois” e uma “fase três”. Questões fulcrais entre os dois países não foram sequer abordadas, como os subsídios de Pequim às suas empresas públicas, o facto de os EUA continuarem a incluir a China como país “manipulador de divisa” ou a inclusão da gigante Huawei e outras tecnológicas chinesas numa lista negra que dificulta a realização de negócios com empresas norte-americanas.

O facto de o acordo estar muito longe de ser final torna-se ainda mais claro quando se percebe que não há qualquer recuo nas taxas alfandegárias que os EUA e a China já tinham subido durante os últimos 18 meses e que a ameaça feita pela Casa Branca de novo agravamento de taxas para 15% em importações chinesas como calçado, roupa, computadores e telemóveis não foi retirada e pode ser passada à prática no dia 15 de Dezembro.

Tanto Donald Trump como Xi Jinping tinham, nesta fase, a necessidade de apresentar algum tipo de sucesso na frente comercial, mesmo que parcial e potencialmente temporário. No caso do presidente norte-americano, a notícia de um entendimento afastou, pelo menos por alguns minutos, as atenções de questões bem menos favoráveis para Trump como os ataques turcos em território sírio ou o processo de impeachment que decorre no Congresso.

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