Sissi ocupa oficialmente o trono que é seu há um ano

Dirigentes ocidentais faltaram à tomada de posse do antigo marechal, que saudou o que disse ser a "primeira transferência democrática e pacífica do poder" na História do Egipto.

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Sissi passa em revista as tropas após a tomada de posse Presidência do Egipto/Reuters

Sem banhos de multidão e na presença apenas dos chefes de Estado mais próximos, Abdel Fatah al-Sissi, eleito com 96,9% dos votos, tomou posse neste domingo como Presidente do Egipto, assumindo oficialmente o poder que detém na prática há quase um ano.

“Ao longo de uma História de mais de mil anos nunca o nosso país assistiu a uma transferência democrática e pacífica do poder”, afirmou Sissi, até há poucos meses chefe do Estado-maior do Exército e que, em Julho de 2013, derrubou Mohamed Morsi, dirigente da Irmandade Muçulmana e primeiro Presidente democraticamente eleito do Egipto. O agora marechal na reserva sucede a Adly Mansour, o presidente do tribunal constitucional que ele próprio nomeou para assumir interinamente a chefia do Estado depois do golpe militar.

A segurança nas ruas do Cairo foi reforçada com blindados estacionados junto ao Tribunal Constitucional e ao Palácio Presidencial – desde o derrube de Morsi, os grupos jihadistas deixaram os seus redutos no deserto do Sinai, atacando com frequência quase diária as forças de segurança, matando mais de 500 soldados em apenas um ano. Nas ruas próximas, uma pequena multidão reuniu-se debaixo de grandes cartazes com o rosto do novo Presidente egípcio, o sexto militar a chefiar o Egipto, mas nem o inesperado feriado decretado pelas autoridades levou mais egípcios às ruas.

No pequeno discurso já depois da tomada de posse, Sissi afirmou que, depois da convulsão dos últimos três anos “chegou o tempo de construir um futuro mais estável”. Mas as palavras mais eloquentes couberam ao vice-presidente do Constitucional, que descreveu Sissi como “um soldado rebelde” e um “revolucionário”. O golpe que ele liderou, afirmou Maher Sami, “não foi uma intentona militar, mas uma revolução do povo que estava cansado dos problemas por que passava e da injustiça”. “O Exército abraçou o povo e ouviu o bater do coração dos egípcios que ardia com raiva”.

Nas semanas que antecederam o derrube de Morsi, enormes protestos encheram as principais cidades do país, com a oposição a acusar o Presidente de autoritarismo e de governar segundo os interesses da Irmandade, que venceu todas as eleições desde 2011. Tomando partido, o Exército afastou o Presidente e quando os seus partidários não cumpriram as ordens para abandonarem as ruas, esmagou os protestos. Centenas de pessoas foram mortas e o movimento islamista foi decapitado e ilegalizado – há dezenas de dirigentes detidos e acusados em processos em que arriscam a pena de morte.

É por causa deste registo que os países ocidentais se fizeram representar na cerimónia deste domingo apenas pelos seus embaixadores – mesmo que os Estados Unidos tenham já dito que estão “ansiosos” por trabalhar com o novo Presidente, ou que a França tenha aprovado a venda de navios militares ao país. Quem não faltou à cerimónia foram os chefes de Estado árabes, os mesmos que criticaram Washington por, em 2011, ter deixado cair Hosni Mubarak. Numa declaração na véspera da tomada de posse, rei Abdullah da Arábia Saudita pediu aos egípcios que apoiem sem reservas Sissi e se afastem do “estranho caos” que se seguiu à Primavera Árabe de 2011.

Mas apesar do quase culto de personalidade instalado em sua volta – abalado apenas por uma participação nas eleições que ficou abaixo dos 50% – Sissi sabe que a paciência dos egípcios é agora mais curta. “Ele tem de fazer alguma coisa nos primeiros 100 dias, as pessoas estão atentas e pode haver outra revolução”, disse Israa Youssef, um estudante de 21 anos, ouvido nas ruas do Cairo pela Reuters.

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