Um museu à procura de soluções com a ajuda de alunos

Vinte e duas propostas de alunos de arquitectura do Instituto Superior Técnico discutem a ampliação do Museu Nacional de Arte Antiga em Lisboa.

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É o espaço da escadaria monumental, pensado em plenos anos de 1980, que acolhe as propostas dos alunos do IST DR

O Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA), em Lisboa, que aloja uma das mais importantes colecções portuguesas, é também uma das estruturas museológicas nacionais com maior dificuldade em se expandir fisicamente.

Encaixado entre a cota elevada da Rua das Janelas Verdes e a cota baixa, ao nível do rio Tejo, da Avenida 24 de Julho, debate-se com diferentes problemas de exiguidade de espaço. Desde a inexistência de área útil para o crescimento das reservas, passando pela biblioteca, espacialmente também deficitária, são diversas as valências do museu que se encontram constrangidas como resultado directo da impossibilidade em ampliar as suas instalações.

O MNAA sofre ainda problemas de acessibilidade, numa cidade cada vez mais vocacionada para o turismo de massas, ao localizar-se numa zona de difícil acesso rodoviário e com limitação ao estacionamento privado. A travessia da 24 de Julho, quer sobre as quatro faixas de rodagem quer sobre a linha ferroviária, tem sido tradicionalmente um dos temas urbanos mais debatidos. E arquitectos como Eduardo Souto de Moura em 1993 têm produzido propostas que acabam por não ser concretizadas. Recentemente, a Câmara Municipal de Lisboa anunciou a intenção de transformar esta via rápida num boulevard, uma alameda arborizada e com faixas mais lentas de tráfego.

É no âmbito de um debate em torno da ampliação do MNAA que os alunos do 4º ano do Mestrado Integrado em Arquitectura do Instituto Superior Técnico (IST), supervisionados pelos arquitectos Ricardo Bak Gordon e José Mateus, apresentaram um conjunto de 22 propostas. Uma exposição de trabalhos que sintetizam as reflexões dos alunos, inaugurada esta semana no átrio principal do MNAA, permanecerá montada até ao final de Setembro. Os trabalhos resultam de uma parceria entre esta instituição de ensino superior e a autarquia, através do vereador Manuel Salgado. A cada novo ano lectivo, os alunos são desafiados a abordarem problemas urbanos e arquitectónicos da cidade cuja resolução represente um impasse. No caso dos projectos para a ampliação do MNAA, o processo envolveu um programa de funções para o museu elaborado em conjunto entre autarquia, professores, alunos e instituição. Ainda como ponto de partida, foi respeitado o traçado da Avenida 24 de Julho que a câmara pretende implementar.

O MNAA encontra-se instalado desde 1884 no antigo Palácio Alvor. O edifício actual resulta de adaptações pontuais a novas solicitações, sem que contudo essas alterações tenham resultado de operações concertadas. No final da década de 1930, os irmãos Rebelo de Andrade desenharam em estilo neoclássico aquela que foi a última grande ampliação do MNAA pensada de forma mais definitiva, o principal anexo de entrada, fronteiro ao jardim 9 de Abril. O novo pavilhão seria inaugurado em 1940, integrando as comemorações da Exposição do Mundo Português.

No âmbito da XVII Exposição Europeia de Arte, realizada em 1983, o seu interior seria reconstruído a partir de um projecto dos arquitectos João D’Almeida e Pedro Ferreira Pinto, com a colaboração de Pedro Emauz Silva. Pretendeu-se então actualizar o ambiente cenográfico que recebia os visitantes do museu e, simultaneamente, intervir ao nível dos percursos museológicos e do próprio mobiliário de exposição. Em 2012, em entrevista a Sofia Visenjou, autora de uma tese de mestrado no ISCTE-IUL sobre os equipamentos da XVII Exposição, os dois arquitectos admitiram a monumentalidade da actual escadaria, concebida “como uma grande peça escultórica”. É este o grande espaço cerimonial, pensado em plenos anos de 1980, que acolhe as propostas dos alunos do IST. É também sobre estas pré-existências que os estudantes de arquitectura actuaram de forma crítica, propondo por vezes a sua total reconversão e recriando cenários mais contemporâneos, através da introdução de materiais como madeira ou betão.

Jardim público?

Ao longo das 22 propostas é possível enunciar algumas preocupações comuns à maioria das abordagens. O redesenho das novas acessibilidades, através da Avenida 24 de Julho, ou do próprio espaço público e a sua permeabilidade é um dos factores mais determinantes. Assim, um número expressivo de desenhos propõe uma relação directa entre o jardim 9 de Abril e o pátio ajardinado já no interior do museu. A reformulação do muro de arrimo ou de contenção de terras, na fronteira entre o MNAA e a linha de rio, é outro dos aspectos mais trabalhados. Algumas propostas chegam mesmo a torná-lo um espaço habitado através da elaboração de novos lugares expositivos ou de serviços.

Um dos trabalhos propõe habitar os telhados das construções vizinhas, num dos projectos mais radicais e simultaneamente utópicos. Uma nova frente edificada para a Avenida 24 de Julho, entendida já como um boulevard, é também uma das apostas dominantes. A sua transformação em estacionamento é igualmente avançada.

Muitos projectos partem da implantação de novos edifícios na cota da avenida que construam praças de recepção aos visitantes do MNAA, secundarizando o actual papel do anexo dos Rebelo de Andrade. Outros constroem torres, ou edifícios elevados, capazes de alterar o skyline da cidade. A possibilidade da demolição das oficinas de restauro do antigo Instituto José Figueiredo e a sua substituição por um novo corpo edificado é outra das propostas correntes, assumindo-se, em alguns casos, uma maior complexidade na disposição espacial das novas valências.

Este conjunto de propostas, pelo seu carácter descomprometido em relação à realidade, testa novas inquietações no domínio do património urbano e arquitectónico. Um bom momento para re-imaginar Lisboa. 

Crítica de arquitectura

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