Análise de candidaturas está por um fio com possível paralisação do Compete

Comissão directiva da autoridade de gestão devia ter três pessoas, já perdeu uma vogal e pode ficar paralisada se Nuno Mangas se afastar ou for afastado por causa da Operação Maestro.

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O presidente do Compete, Nuno Mangas, é um dos dirigentes da administração pública ligada à gestão do Portugal 2020 que viu o seu nome envolvido na "Operação Maestro" Adriano Miranda (arquivo)
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A equipa que dirige o Compete, responsável em Portugal pelos fundos europeus para empresas, deveria ter três pessoas, mas está reduzida a duas e arrisca-se perder mais uma – o presidente Nuno Mangas – se este se afastar ou vier a ser afastado do cargo, na sequência da investigação judicial baptizada Operação Maestro. Nesse caso, a comissão directiva ficaria reduzida a um vogal, com o risco de se paralisar um órgão que tutela milhares de candidaturas.

Nuno Mangas foi um dos alvos das buscas realizadas na terça-feira, ao abrigo desta operação, que incide sobre a actuação de Manuel Serrão e outras pessoas na Associação Selectiva Moda, que presta serviços à indústria têxtil e vestuário nacional, e de um grupo de empresas em que Manuel Serrão e outros suspeitos intervinham directamente com o alegado propósito de se apropriarem indevidamente de fundos europeus atribuídos pelo Portugal 2020, especificamente pelo programa em que o Compete é a autoridade de gestão.

O caso preocupa empresários do sector têxtil, que temem danos de reputação e imagem, mas também deve estar a gerar preocupação no Governo, dado o risco de paralisação do Compete.

Até há poucos dias, a comissão directiva era composta por Nuno Mangas (presidente) e dois vogais, Luís Castilho e Ana Lemos Gomes – esta última também referenciada nos mandados de busca, por suspeita de ter violado os seus deveres. Os membros daquele órgão são nomeados por despacho dos ministros da Presidência, que tutela os fundos, e da Economia. Mas estão a poucas horas da saída, pelo que dificilmente intervirão no imediato no sentido de preencher qualquer vaga.

A saída de Nuno Mangas agravaria o vazio directivo porque Ana Lemos Gomes saiu este mês para a vice-presidência da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte.

Neste cenário, a nomeação para o Compete ficaria nas mãos do próximo Governo e pode passar semanas até que este indique novos nomes. O que pode significar semanas de paralisação, caso o órgão fique reduzido a um vogal.

A investigação desencadeada aos negócios de Manuel Serrão abala sobretudo o sector têxtil, que há 32 anos decidiu entregar àquela associação a promoção interna e externa desta indústria. A Selectiva Moda, cujo presidente é formalmente João Costa, tem Serrão como vogal e gestor executivo. Organizava candidaturas a fundos europeus disponíveis para aquele fim. Embora tivessem a AICEP como organismo intermédio (responsável pela análise), acabavam por ser financiados por linhas geridas pelo Compete.

O Ministério Público (MP) acredita que parte das verbas concedidas à Selectiva Moda, em reembolsos e adiantamentos, terão acabado num carrossel de facturas suspeitas de negócios simulados, sem correspondência a serviços prestados ao abrigo desses projectos ou de documentos de despesa sobrevalorizada. Para esse fim, terão sido constituídas empresas paralelas que alegadamente seriam fornecedoras da Selectiva Moda, mas que, na opinião do MP, eram controladas directa ou indirectamente por Manuel Serrão, num eventual esquema que contaria com a participação de membros da administração pública ligados à gestão de fundos europeus.

Porém, uma eventual paralisação do Compete teria consequências sobre muitas empresas de outros sectores nacionais, já que enquanto autoridade de gestão, está envolvido no encerramento do Portugal 2020. Os gestores dos diferentes programas temáticos, incluindo este, têm até 31 de Julho para verificações de gestão, validar despesas feitas por empresas até 31 de Dezembro de 2023, e pagá-las.

Além disso, a nova geração do programa Compete, financiado pelo Portugal 2030, terá 25 avisos de abertura de concurso este ano, que envolvem apoios de 554,5 milhões de euros. Três deles já decorrem, com os períodos de candidatura encerrados.

Segundo o mais recente relatório da Procuradoria Europeia, divulgado no início deste mês mas com dados de 2022, há 1107 investigações em curso em toda a União Europeia. Este organismo, com capacidade de fazer investigação transnacional, foca-se no crime que lesa os interesses económicos da UE, incluindo fraude, corrupção ou lavagem de dinheiro.

Para Portugal, foram abertas naquele ano 23 investigações, elevando para 26 as que estão activas. As fraudes com IVA são uma parte importante deste grupo (oito, com destaque para a Operação Admiral), mas as fraudes relacionadas com despesas são a maioria (11, com destaque para os programas de desenvolvimento regional e urbano (cinco).

Neste momento, só há uma acusação, relativa à mega-fraude no IVA investigada na Operação Admiral, que envolve 27 arguidos.

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