Conselho da Europa prepara registo de danos da guerra, o “primeiro passo” para responsabilizar a Rússia

Organização europeia pretende avançar, na cimeira de Maio, com um instrumento de registo dos danos causados pela invasão da Ucrânia pela Rússia. Portugal vai apoiar a criação do organismo.

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Registo de danos vai permitir aos ucranianos compilar perdas familiares e de bens materiais Reuters/CARLOS BARRIA

O Conselho da Europa está a três semanas da sua quarta cimeira, 18 anos depois da última. O objectivo para o encontro é claro: garantir a responsabilização da Rússia pela invasão da Ucrânia. O primeiro passo passa pela aprovação de um registo de danos provocados pela guerra.

A criação deste registo internacional permitirá aos cidadãos ucranianos submeter o registo de danos resultantes da agressão russa, documentando as perdas ucranianas, tanto de bens materiais como de familiares ou entes queridos. Um primeiro passo para que se comece a “fazer justiça pelos cidadãos ucranianos”, disse aos jornalistas portugueses, em Estrasburgo, o presidente da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa (APCE), Tiny Kox.

“Soa a algo técnico, mas é horrível porque [os registos vão ser]: “Os meus filhos foram mortos”, “a minha avó morreu” ou “perdi a minha família porque foram para outro sítio da Europa”, esclareceu o presidente da assembleia parlamentar, salientando que este instrumento é “único”, e um passo necessário para um futuro mecanismo de compensação da Ucrânia.

A APCE esteve reunida esta semana em Estrasburgo, onde decorreu a sessão plenária de Primavera. A quarta Cimeira do Conselho da Europa, que terá lugar em Reiquejavique, na Islândia, a 16 e 17 de Maio, foi um dos pontos de discussão.

Desde a sua criação, em 1949, no rescaldo da Segunda Guerra Mundial, o Conselho da Europa só teve encontros dos chefes de Estado e líderes de Governo em 1993, 1997 e 2005. A quarta cimeira é desencadeada pela invasão russa da Ucrânia e a reafirmação da solidariedade europeia com a Ucrânia, um dos 46 Estados-membros da organização, será a prioridade absoluta.

“A Ucrânia vai ser o ponto um, dois e três da agenda. É a principal coisa em que nos estamos a concentrar, porque não temos um exército nem temos dinheiro, mas temos um conjunto de regras a que todos os Estados-membros se comprometeram”, garantiu Tiny Cox, lembrando que a Rússia foi expulsa do Conselho da Europa três semanas depois da invasão da Ucrânia, por ter “violado descaradamente as suas obrigações internacionais”.

Na agenda da cimeira estará ainda a discussão sobre a criação de um tribunal criminal especial para julgar o crime de agressão contra a Ucrânia. A génese deste tribunal não deverá passar pelo Conselho da Europa, mas o presidente da APCE disse que a instituição “oferece os seus serviços” e conhecimentos.

Portugal apoia criação do registo de danos

Portugal será um dos países a integrar o acordo inicial para a criação do registo de danos, que é “um primeiro passo da comunidade internacional em matéria de responsabilização da Rússia”, assinalou o representante permanente de Portugal no Conselho da Europa, Gilberto Jerónimo.

“Portugal tem estado sempre na linha da frente nas negociações, quer continuar a estar nessa linha da frente e vai dar o apoio à sua criação”, sublinhou o embaixador, referindo que Portugal tem apoiado “todas as acções de auxílio à Ucrânia”, para além do contributo noutros campos, como na elaboração de relatórios.

O registo de danos terá, para já, um “objectivo muito reduzido” de compilar os pedidos de compensação. Mas será crucial para quando forem dados outros passos “num âmbito mais universal” no caminho da responsabilização da Rússia pelas perdas ucranianas, como a criação do tribunal e futuras decisões quanto a compensações – assuntos em que se espera que sejam as Nações Unidas a assumir a iniciativa.

Gilberto Jerónimo assinalou as “grandes expectativas” à volta da Cimeira do Conselho da Europa, que será importante para mostrar a “unidade” no apoio à Ucrânia, assim como para “reafirmar os princípios e valores” na defesa dos direitos humanos, da democracia e do Estado de direito.

O representante português disse ao PÚBLICO considerar que a quarta cimeira do Conselho da Europa servirá para que a instituição possa “reforçar” os mecanismos e instrumentos de que dispõe para apoiar Estados-membros “a fazer as mudanças necessárias para melhorar os seus sistemas democráticos, o respeito pelos direitos humanos e as garantias do Estado de direito”.

“As democracias – e as comemorações do 25 de Abril também vêm lembrar-nos disso – são processos em construção permanente. Ora, o Conselho da Europa é a instituição regional europeia mais bem posicionada nessa mesma matéria”, concluiu.

O jornalista viajou a convite do Conselho da Europa

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