Direita diz que pacote da habitação é “estatizante”, esquerda fala em “borla fiscal”

Oposição considera que medidas anunciadas pelo Governo para combater crise na habitação reflectem uma opção “errada” e antecipa que não vão resultar.

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Partidos da oposição não acreditam que medidas do Governo resolvam problemas nos preços das casas LUSA/MANUEL DE ALMEIDA

Da esquerda à direita, os partidos da oposição condenaram, por diferentes razões, o pacote legislativo anunciado esta quinta-feira pelo Governo para o sector da habitação. PSD, IL e Chega vêem um regresso a uma excessiva intervenção do Estado, enquanto PCP e BE criticam a manutenção dos interesses da banca e as borlas fiscais aos especuladores.

O PSD apontou a lógica “estatizante” das medidas em contraste com o modelo “aberto e moderno” que o partido apresentou, há dois dias, apesar de considerar haver “uma ou outra medida” na fiscalidade e licenciamento em que o Governo seguiu os sociais-democratas.

“É errado e curto”, resumiu o líder da bancada do PSD, Joaquim Miranda Sarmento. Em declarações aos jornalistas no Parlamento, o líder parlamentar social-democrata condenou o “estatismo demasiado elevado” do plano que “parece regressar aos anos 70” com um “ataque à propriedade privada, aos negócios” numa referência à “lógica de coerção” dos arrendamentos das casas devolutas.

A mesma crítica foi partilhada pelo líder do Chega, André Ventura, que foi até mais longe ao alertar para o risco de inconstitucionalidade da medida. “Está ao nível do que o BE quis fazer e não passará no crivo do Tribunal Constitucional, é difícil obrigar os senhorios a arrendar casas”, defendeu.

Em termos globais, Ventura considerou que o Governo optou por um pacote que implica aprovar legislação no Parlamento em vez de um modelo de apoios mais directo e rápido. “São medidas amplamente retóricas, medidas inconstitucionais”, afirmou, lembrando que não há prazos para a concretização das anunciadas alterações à lei.

O líder do Chega apelidou o pacote de “estatizante” e considerou que a “confusão entre alojamento local e hostel vai significar a morte do alojamento local”.

Com argumentos semelhantes, o líder da Iniciativa Liberal (IL) também disse antever “a morte do alojamento local” e questionou o regime do arrendamento compulsivo. “É inaceitável e inconstitucional”, garantiu Rui Rocha, questionando como é que vai ser posto em prática: “É a GNR que vai a casa das pessoas obrigar a arrendarem?”

Assumindo que a IL “estará na rua” a defender e a manifestar-se ao lado das “pessoas afectadas” pela crise na habitação, Rui Rocha falou, por diversas vezes, na “brutalidade” das medidas.

“É uma reacção do Governo em desespero que leva tudo à frente” e um “disparar em todas as direcções”, disse. Como um “relógio parado acerta as horas duas vezes por dia”, o Governo também “acerta numa ou outra medida” no âmbito da fiscalidade no arrendamento ou na simplificação do licenciamento, apontou.

Interesses da banca intactos

À esquerda do PS, PCP e BE insistiram na ideia de que há “borlas fiscais” com vantagens para os grandes grupos económicos. O deputado comunista Bruno Dias lamentou que no arrendamento o Governo tenha mantido, “no essencial”, a Lei Cristas no que toca a despejos e que tenha deixado “intocados os interesses da banca”.

Já a deputada bloquista Mariana Mortágua agarrou num exemplo de benefícios fiscais a “quem ganhou com a especulação” e que considerou não fazerem sentido. “Uma entidade que comprou um prédio, despejou o inquilino que lá vivia, agora pode vender o prédio ao Estado e não pagar impostos”, disse, depois de fazer uma apreciação negativa do pacote.

“Se esta é a resposta [à crise na habitação], então a maioria absoluta desistiu do país. Os preços não vão descer e vão ficar num nível astronómico que impossibilita o acesso à habitação”, sustentou.

Menos crítico sobre o pacote do Governo, o deputado único do Livre, Rui Tavares, referiu haver “propostas positivas” como a de fazer o inventário “exaustivo” do património habitacional do Estado, mas lamentou que o PS tenha chumbado ainda esta terça-feira uma medida do seu partido para a incluir no programa agora apresentado pelo Governo. Trata-se da possibilidade de passar os créditos bancários com taxa variável para a taxa fixa sem penalização.

Igualmente mais suave nas críticas, a deputada única do PAN, Inês Sousa Real, assumiu existirem medidas "positivas" e propôs corrigir uma delas – a do crédito bonificado. Em vez de apenas bonificar o juro de famílias até ao sexto escalão do IRS, o PAN quer alargar esse apoio até ao sétimo escalão.

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