Portugal precisa de usar mais transportes públicos e gerar menos lixo, conclui relatório

Portugal está no 18.º lugar entre 29 países no índice de transição verde da consultora Oliver Wyman, que avaliou desempenho na economia, lixo, edifícios, transporte, energia, natureza e indústria.

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O transporte público representa apenas 12% do total de transporte de passageiros em Portugal, diz relatório Diego Nery

O desempenho ambiental de Portugal está dentro da média europeia, mas o país – que se destaca na gestão da energia e na sustentabilidade dos edifícios – deve reduzir a quantidade de resíduos e investir mais nos transportes públicos e na conservação da natureza. As conclusões são de um relatório da consultora Oliver Wyman apresentado esta quarta-feira.

O “Índice de Transição Verde” avalia o desempenho ambiental de 29 países europeus ao atribuir-lhes um índice de transição verde (GTI, do inglês “Green Transition Index”) de 0 a 100 em sete categorias: economia, resíduos, edifícios, transporte, energia, natureza e indústria transformadora.

Na 18ª posição do ranking, Portugal apresenta um índice global de transição verde de 48. No topo da escala, estão os Países Baixos e a Dinamarca, com um índice de 57, pelo que o relatório aponta uma correlação – salvo algumas excepções – entre o produto interno bruto per capita e o desempenho do país na transição verde. “Os países mais ricos vão ter mais dinheiro e os recursos necessários para investir nesta transição”, referiu Sofia Cruz, consultora sénior da Oliver Wyman, durante a apresentação.

Em comunicado, a empresa alerta que o relatório revela uma “Europa a ritmos diferentes rumo à sustentabilidade ambiental”, com os Países Baixos em “clara vantagem”. O Sul da Europa tem “tendência a estar no final da cauda” em quase todos os indicadores e, em Portugal, “ainda há um longo caminho a percorrer, sobretudo se quisermos atingir a sustentabilidade nos factores que estamos a considerar”, acrescentou Sofia Cruz.

Energia

A energia é uma das categorias onde Portugal se destaca pela positiva. Uma avaliação, que teve em conta o peso das energias renováveis no mix de produção de electricidade e a dimensão de projectos em tecnologias de transição energética em relação ao produto interno bruto total, coloca Portugal no quinto lugar do ranking (índice de 39) – atrás dos Países Baixos, da Dinamarca (52), da Noruega (50) e do Reino Unido (48).

O relatório da Oliver Wyman atribui este resultado positivo ao facto de Portugal ser o país com a segunda maior dimensão de projectos de hidrogénio verde em relação ao PIB (cinco vezes superior à média europeia em 2021) e a quinta maior capacidade de projectos de armazenamento relacionados com baterias.

O país destaca-se ainda pelo elevado peso das energias renováveis e dos biocombustíveis na produção de electricidade, que se fixa nos 60%. Um ponto negativo apontado pela consultora é o facto de Portugal não ter projectos CCS (captura e armazenamento de carbono), ao contrário de 50% dos países europeus.

Com o mesmo índice de transição verde no sector da energia está a Alemanha, seguindo-se a Espanha, com um GTI de 39.

Edifícios

A boa gestão da energia estende-se ao baixo consumo eléctrico nas casas portuguesas e ao uso de energias renováveis para aquecimento doméstico, o que fixa Portugal no segundo lugar do ranking da sustentabilidade dos edifícios, com um GTI de 78 – muito acima da média dos restantes países do Sul da Europa (62) e pouco atrás da Roménia, que tem um índice de 82.

Porém, Sofia Cruz esclarece que a pobreza energética não é o principal factor de influência para os resultados, mas sim variáveis como as condições climatéricas portuguesas, que reduzem a dependência da electricidade para, por exemplo, aquecimento, o que coloca o país numa posição favorável face a outros.

Portugal encontra-se no topo da lista, juntamente com os Países Bálticos e a Europa Oriental, dado 57% do aquecimento doméstico ser feito com energias renováveis – o que inclui coisas tão simples como queimar madeira, explica a consultora sénior da Oliver Wyman – e o consumo de electricidade per capita ser reduzido (0,11 toneladas de petróleo equivalente per capita, face a uma média europeia de 0,16 toneladas). No que concerne ao número de projectos de edifícios com certificações de construção sustentável, Portugal cai para 19º lugar.

Economia

A posição de Portugal na área da economia é intermédia, quando comparada com os restantes países da Europa. Em 15º lugar e com um GTI de 56, Portugal destaca-se pela redução do consumo de energia primária e pelo investimento público na Investigação e Desenvolvimento que visa atingir os objectivos ambientais, algo que “denota um esforço de melhoria”, diz o relatório.

Entre 2015 e 2020, o consumo de energia reduziu em 10%, ao passo que a média europeia se fixa nos 6%. Já a percentagem de despesas públicas dedicada à investigação está 15% acima da média.

Por outro lado, o desempenho do país é intermédio em emissões de gases com efeito de estufa, produzindo 308 toneladas por milhão de euros de produto interno bruno, face à média de 346 toneladas. Entre 2015 e 2020, houve uma redução de 9% nas emissões, que não foge aos valores europeus.

A Alemanha ocupa o topo do ranking da economia, com um índice de 68, seguida pela Estónia e pela Suécia.

Indústria transformadora

Na categoria que mede a intensidade das emissões, de resíduos perigosos e da energia da indústria transformadora, o relatório denuncia que Portugal está “consistentemente na metade inferior do ranking”, ocupando o 18º lugar com um índice de 57.

A intensidade das emissões na produção – que chega às 660 toneladas de CO2 por milhões de euros de valor acrescentado, ao passo que os países no top 10 produzem menos de 400 toneladas – e o consumo elevado de energia são indicadores abaixo da média, ao passo que a intensidade de resíduos perigosos está dentro dos valores normais para o continente europeu.

No topo da escala, está a Irlanda, com um índice de 100, a Malta e a Dinamarca. Na análise, é referido que os países com maior percentagem de “sectores altamente emissores e intensivos em energia”, como a refinação de petróleo, tendem a ocupar uma pior posição. Tendo em conta a percentagem baixa de indústrias emissoras em Portugal, quando comparado com outras regiões da Europa, Sofia Cruz revela que se esperava “um GTI mais alto” para o país.

Transporte

Um índice de apenas 37 na categoria dos transportes coloca Portugal em 18º lugar. O país destaca-se positivamente e está, segundo Sofia Cruz, “muito bem posicionado” em termos de intensidade de emissões por passageiro e em emissões médias de dióxido de carbono de automóveis novos. Contudo, apenas 1,6% do stock total de carros no país a partir de 2019 corresponde a veículos de baixas emissões, em comparação com uma média de 1,9%. Na Noruega, líder neste indicador, 17% dos carros são de baixas emissões.

A baixa percentagem de utilização de transportes públicos é, segundo o relatório, o “factor mais agravante”. O transporte público representa apenas 12% do total de transporte de passageiros, face a uma média de 18%. Nos países líderes – nomeadamente as regiões da Europa Oriental e a Noruega – a utilização de transportes públicos pode chegar aos 30%.

Resíduos

Face à gestão de resíduos, Portugal junta-se aos restantes países do Sul da Europa no final do ranking, ocupando o 27º lugar. Ao passo que os países líderes, da Europa Ocidental, têm índices superiores a 70 e a média europeia se fixa nos 51, o GTI português de 27 denuncia resultados negativos em geração de resíduos, circularidade e deposição em aterros.

Per capita, Portugal gerou 0,51 toneladas de resíduos em 2018 (22% acima da média), com um elevado número de resíduos domésticos. Já em 2020, apenas 2% dos resíduos foram devolvidos à economia na forma de reciclagem ou reutilização, sendo que 263 kg de lixo por pessoa iam parar a aterros. Nos países líderes, a taxa de circularidade é superior a 20% e menos de 10 kg foram depositados em aterro. Destacam-se os Países Baixos, no topo da lista.

Natureza

O índice de transição verde no sector da natureza avalia indicadores como a quantidade de áreas protegidas, a percentagem de agricultura biológica, a exploração da água e a poluição atmosférica. Novamente, Portugal está numa posição semelhante ao restante Sul da Europa, mas também numa das piores posições do ranking, por apresentar “resultados fracos em todos os indicadores de natureza”. Com um índice de 43, o país surge em 25.º lugar. Em comparação, a Estónia está no topo da lista, com um GTI de natureza de 76.

O índice de áreas protegidas destaca-se pela negativa, dado que o país se encontra em último lugar nesse indicador, sendo que, em 2020, apenas 3,4% da área total do país tinha essa classificação, muito abaixo da média, que se fixa nos 17%. Estes são, pelo menos os valores indicados no relatório como resultado do cálculo realizado para este "indicador chave de desempenho" (KPI, na sigla em inglês). Os dados, explicam os autores, referem-se apenas à rede nacional de áreas protegidas no âmbito da rede Natura 2000.

Apesar deste resultado, os dados divulgado em 2022 pela Pordata a propósito do Dia Mundial do Ambiente indicavam que, em 2021, cerca de 22% do território terrestre português correspondia a áreas protegidas, o que ainda assim colocava também Portugal abaixo da média europeia (26%).

Já os restantes indicadores, refere o relatório da consultora, inserem-se na média europeia: apenas 8,1% da área agrícola é dedicada à agricultura biológica e 12,7% da água doce renovável do país é utilizada. No que concerne à poluição atmosférica, o relatório refere que é possível, em média, encontrar 18,6 microgramas de partículas com diâmetro inferior a 10 micrómetros por metro cúbico. Transportadas para os pulmões, estas partículas podem causar inflamação e exacerbar o estado de quem sofre de doenças cardíacas ou pulmonares. ​

Texto editado por Andrea Cunha Freitas

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