Foi em África que Harry soube que Meghan era a sua alma gémea, revela o príncipe nas Nações Unidas

No discurso, no âmbito do Dia Internacional Nelson Mandela, que se assinala anualmente a 18 de Julho, o duque homenageou o Prémio Nobel da Paz de 1993, mas não foi poupado às críticas.

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Meghan e Harry estiveram, esta segunda-feira, na Assembleia da ONU em Nova Iorque Reuters/BRENDAN MCDERMID

Uma declaração de amor num palco inusitado: a Assembleia da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova Iorque, onde o príncipe Harry chamou a atenção ao revelar que a sua paixão por África está associada ao amor pelas mulheres da sua vida: a mãe, Diana, já que foi nesse continente que sentiu mais a sua presença após a morte da princesa, em Agosto de 1997, e a mulher, Meghan Markle.

“Durante a maior parte da minha vida, [África] tem sido a minha tábua de salvação, o lugar onde encontrei paz e cura, uma e outra vez”, desabafou o príncipe, acrescentando: “Foi onde me senti mais próximo da minha mãe e procurei consolo depois da sua morte, e onde soube que tinha encontrado uma alma gémea na minha mulher.” No início da relação, em 2016, Harry convidou Meghan para se juntar a ele numa visita ao Botswana, o que terá sido crucial para o que se seguiu.

Olhando para África como a sua “segunda casa”, o duque esclareceu que é neste território que desenvolve grande parte das suas acções beneméritas, nomeadamente no capítulo da conservação animal, especificamente de rinocerontes e elefantes, mas também com crianças e jovens vulneráveis no Lesoto e em Botswana, através da Sentebale.

No entanto, o dia era para homenagear Nelson Mandela (18 de Julho de 1918 – 5 de Dezembro de 2013), que passou de ser o rosto da resistência ao apartheid, razão pela qual esteve 27 anos preso, para assumir a Presidência da África do Sul, em 1994. E Harry não se coibiu de elogiar uma “alma empenhada em servir a humanidade”, recordando uma fotografia, de 1997, do encontro entre Madiba, como também era conhecido o governante, e a sua mãe, a princesa de Gales, que contou ter pendurada na sua parede. “Quando olhei pela primeira vez para a fotografia, o que saltou de imediato foi a alegria no rosto da minha mãe. A alegria — atrevimento, até. O puro deleite de estar em comunhão com outra alma tão empenhada em servir a humanidade.”

Tendo como exemplo a vida de Nelson Mandela, Harry lembrou que “estamos a assistir a um ataque global à democracia e à liberdade”, causas pelas quais o sul-africano tanto lutou, referindo-se às ameaças da invasão russa da Ucrânia; do que considerou ser a inversão dos direitos constitucionais nos Estados Unidos [depois de os juízes do Supremo Tribunal terem aprovado a reversão da decisão do caso Roe vs. Wade]; e do “armamento” de mentiras e desinformação.

E, face a este cenário, o duque considerou que se pode seguir o caminho da apatia, da ira e do desespero ou a possibilidade de “encontrar um sentido e um propósito na luta”, como fez Mandela, instando ainda os países a tomarem medidas sobre as alterações climáticas. “Vamos procurar o que temos em comum, capacitar todas as pessoas para reclamar as nossas democracias, e aproveitar a luz da memória de Mandela para iluminar o caminho a seguir.”

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"Mandela passou 27 anos atrás das grades na África do Sul; [Meghan] Markle passou 18 meses em castelos e queixou-se na televisão durante uma pandemia. Porque estão eles [Harry e Meghan] aqui?", lê-se no cartaz REUTERS/Shannon Stapleton

A sombra do império

A intervenção de Harry na Assembleia das Nações Unidas, perante uma plateia praticamente vazia, foi, porém, alvo de duras críticas, já que o príncipe ainda simboliza para muitos o invasor. Depois de ter sido colonizada pelos holandeses, no século XVII, a África do Sul foi cobiçada pelos britânicos que conseguiram, por fim, em 1910, criar a União Sul-Africana.

Em 1931, a União tornou-se independente do Reino Unido. Mas, embora os britânicos não estivessem à frente dos assuntos internos do país quando o Governo estabeleceu o apartheid em 1948, a passividade do Reino Unido continua a ser criticada. E para a história ficou a oposição da primeira-ministra Margaret Thatcher às sanções contra a África do Sul ("[As sanções são] o caminho da pobreza, da fome e da destruição das esperanças do próprio povo — todos eles — que se deseja ajudar”, justificou na época), que uniram grande parte do mundo nos anos 80 do século passado e abriram caminho para o fim do apartheid e consequentemente para a libertação de Mandela.

Por tudo isto, várias vozes se erguem a questionar a legitimidade de ter um membro da família real britânica, ainda que afastado dos seus deveres monárquicos e sem o título de “sua alteza real”, a discursar sobre Nelson Mandela na ONU. E esta não é a primeira vez que, este ano, a monarquia inglesa se vê confrontada com o seu passado colonial. Também a visita de William, segundo na linha de sucessão, e Kate às Caraíbas agitou uma onda de críticas, com a recordação do papel do Reino Unido na escravatura, o que levou o filho mais velho de Carlos a tomar uma atitude.

Na Jamaica, já depois de ter sido forçado a alterar o itinerário na visita no Belize por causa dos protestos, William foi recebido com manifestações que exigiam reparações pela escravatura. Por isso, optou por reconhecer os erros do passado e pedir desculpas: “Quero expressar o meu profundo pesar. A escravatura foi abominável. E nunca deveria ter acontecido”, disse o príncipe quando discursou no jantar na Casa do Rei, a residência oficial do governador da Jamaica, sir Patrick Allen, reconhecendo o nefasto papel do seu país no tráfico de pessoas para as Caraíbas e os Estados Unidos.

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