Lei que impôs redução de rendas nos centros comerciais é parcialmente inconstitucional, decide TC

Centros comerciais foram obrigados a isentar os lojistas do pagamento da renda fixa entre Março e Dezembro de 2020, por causa do encerramento parcial das lojas devido à covid-19. Decisão do TC considera medida excessiva.

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Nuno Ferreira Santos

A lei que obrigou os centros comerciais a reduzir as rendas a pagar pelas lojas instaladas nesses espaços durante boa parte de 2020 é “parcialmente inconstitucional”. A decisão do Tribunal Constitucional (TC), a que o PÚBLICO teve acesso esta sexta-feira, considera que o corte da renda aplicado em 2020 foi excessivo, mas apenas na parte que excede o corte que veio a ser aprovado em 2021, que determinou que a renda fosse reduzida proporcionalmente à redução da facturação mensal, até ao limite de 50% do valor daquela, quando tais estabelecimentos tivessem uma quebra do volume de vendas mensal, por comparação ao período pré-pandemia.

Os centros comerciais, que pediram, via Provedora de Justiça, a declaração da “ilegitimidade da intervenção legislativa do Estado no plano de relações jurídico-privadas”, vêem atendida apenas uma parte dos efeitos pretendidos.

“Entendeu o Tribunal que a supressão da remuneração fixa constitui uma ablação excessiva do direito de propriedade, por ser desnecessária e desproporcionada em função das finalidades de justiça distributiva e protecção social que através dela o legislador pretende prosseguir”, lê-se no acórdão. Mas que acrescenta que “não esteve em causa a legitimidade constitucional destes objectivos, nem da intervenção do legislador em contratos deste tipo no contexto da crise sanitária, mas apenas o carácter excessivo da exoneração total da obrigação de o lojista pagar a remuneração fixa estipulada pelas partes”.

Assim, “entendeu o Tribunal ponderar, tendo em conta que a inconstitucionalidade da norma se devia exclusivamente ao grau ou medida do sacrifício imposto, a possibilidade de uma declaração de inconstitucionalidade parcial, mediante a qual se conservassem alguns dos efeitos jurídicos da norma sindicada”. Concluindo que “após definir os pressupostos excepcionais de uma decisão deste tipo concordância com o pensamento legislativo, dever constitucional de tutela, aplicação de uma bitola legal e insuficiência dos regimes gerais e de demonstrar a sua verificação no caso concreto, o Tribunal reduziu a declaração de inconstitucionalidade ao conteúdo da norma que excede o limiar da isenção parcial prevista no n.º 1 do artigo 8.º, da Lei n.º 4-C/2020, de 6 de Abril, na redacção dada pelo artigo 439.º da Lei do Orçamento do Estado para 2021”.

Em causa a Lei nº27 A/2020 (do Orçamento Suplementar de 2020), que entrou em vigor a 25 de Julho, mas produziu efeitos “retroactivos” a 13 de Março desse ano, data de entrada em vigor de várias medidas de combate à pandemia de covid-19, como o encerramento dos centros comercias, e que isentou os lojistas dos centros comerciais do pagamento da renda fixa (a componente mais elevada na maioria das situações). Assim, os lojistas passaram a pagar unicamente parte variável, ou seja, em função das vendas realizadas e as despesas comuns. A iniciativa legislativa do PCP, com apoio alargado dos outros partidos, foi justificada pelo encerramento temporário das lojas dos centros comerciais, à excepção de alguns estabelecimentos, como farmácias ou lojas de electrónica, após 13 de Março, uma das medidas tomadas então para travar a propagação da pandemia de covid-19.

A generalidade das lojas naqueles espaços reabriu a 4 de Junho, salvo no caso dos da Área Metropolitana de Lisboa, em que foi a 15 de Junho, mas a isenção do pagamento prolongou-se até 31 de Dezembro de 2020, seguindo-se ainda um período de descontos no valor da renda fixa até Junho de 2021.

Largo consenso no Parlamento

A primeira lei que limitou o valor das rendas até 31 de Dezembro de 2020, que ficou conhecida como a “partilha de sacrifícios”, foi aprovada sem votos contra no Parlamento. A iniciativa do PCP contou a abstenção do PS e do PAN e o vota a favor dos restantes partidos.

O segundo diploma, iniciativa do PSD, obrigou os centros comerciais a reduzirem as rendas fixas ou mínimas a pagar pelos lojistas daqueles estabelecimentos comerciais até ao limite de 50%, nos casos em que se verificasse uma quebra de vendas face ao mês homólogo do ano de 2019 ou, na sua falta, face ao volume médio de vendas dos últimos seis meses ao início da pandemia. O período de vigência era de três meses, até 31 de Março, prorrogável por mais três meses, o que veio a acontecer, por iniciativa do Governo, até 30 de Junho de 2021, período que ficou ainda marcado por novo confinamento e encerramento temporário da maioria das lojas dos centros comerciais, também consequência da pandemia.

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