Um compromisso para o futuro da floresta

O manifesto apresentado em Abril é um conjunto vago de ideias. Há, porém, uma coisa que ninguém pode negar – nestes últimos seis anos foi feito um trabalho enorme para que Portugal tenha uma outra floresta.

O prof. Fontainhas Fernandes, reitor emérito da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, deu à estampa neste prestigiado jornal, no passado dia 29 de abril, um longo e interessante artigo sobre os desafios da floresta portuguesa.

O texto era uma quase cópia do manifesto que duas dezenas de empresas divulgaram nesse mês de Abril e que tem como objetivo, dizem, valorizar a floresta de proteção.

Eu já havia ficado surpreso com o manifesto e fico agora, ainda mais, com o texto do prof. Fontainhas Fernandes.

A Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro foi, durante três décadas, uma referência no panorama florestal português. Muitos dos grandes silvicultores foram aqui formados e alguns deles fizeram aqui a sua carreira académica. O prof. Francisco Rego ajudou a formatar o curso de Florestal, o prof. Hermínio Botelho assumiu a respeitabilidade internacional no âmbito do “uso do fogo”, o prof. Paulo Fernandes é, no corrente, figura central. Mas o que aconteceu com a UTAD? Neste tempo, muito pela ausência de visão de Fontainhas Fernandes, é uma inexistência na construção da moderna silvicultura portuguesa.

O manifesto é um conjunto vago de ideias. Todas podem ser subscritas pelo cidadão português que nada sabe de floresta. Há, porém, uma coisa que ninguém pode negar – nestes últimos seis anos foi feito um trabalho enorme para que Portugal tenha uma outra floresta.

Quem deve ser responsável pela intervenção florestal? A resposta é simples – na proteção deve ser o Estado; na produção devem ser os particulares.

Ora, o manifesto é constituído por grandes empresas que têm um papel relevante na economia portuguesa e que também têm obrigações para com os territórios e para com os proprietários. O que foi acontecendo ao longo das décadas foi uma forte dependência dos fundos europeus para que a floresta de produção se sustentasse.

O Estado, no caso em que a industria é central, deve assentar a sua ação na desburocratização dos licenciamentos, na valorização dos mercados, na atenção à sanidade, na melhor estrutura fundiária, na valorização das exportações e na beneficiação fiscal dos investimentos. Nada mais.

O que os governos liderados por António Costa fizeram foi dar uma atenção muito relevante ao território e à sua resiliência. Por isso se está a estruturar a floresta e se esta a criar um dispositivo de prevenção estrutural. Por isso se mantém perene a política de responsabilização dos proprietários e, também por isso, se concretiza a bom ritmo o novo cadastro rústico.

O manifesto fala numa agenda preventiva com uma abordagem multidisciplinar. Se não é o que existe hoje quando existiu? A dupla visão – agricultura e ambiente – que o Governo vem consagrando é a base dessa agenda. A relevante decisão de Matos Fernandes, de duplicação dos fundos públicos para a floresta, utilizando recursos do universo ambiental, foi uma conquista.

Olhemos agora para as componentes da agenda. Diversificação das espécies - está a ser feita no centro e norte do país; gestão dos combustíveis - em concretização num plano de médio prazo que só existiu, por pouco tempo, em 2008/2009; requalificação das áreas ardidas - uma intervenção que se vê até da rede de autoestradas; apoio fitossanitário - basta olhar para as dotações do programa de desenvolvimento rural.

Há, contudo, uma área em que importa uma outra dinâmica – dos serviços de ecossistemas que maximizem os fins múltiplos. Era neste universo que as grandes associações e as grandes empresas poderiam dar início ao processo. Talvez apresentando uma agenda para o concretizar. Tenho, porém, pouca fé. Se no universo da certificação foi o Estado o principal impulsionador, porque haveriam de ser agora as empresas, as grandes e importantes, a iniciar o caminho?

Estou confiante neste segundo tempo de governação de António Costa, agora com uma maioria absoluta e com a liderança sectorial de Duarte Cordeiro. Muitas das limitações que antes existiam poderão ter deixado de existir. Uma delas é a ideia absurda da criação de uma nova taxa sobre as empresas, outra é a obrigação, que o país assume há décadas, de construir um moderno Código Florestal.

Importaria que as empresas não se ficassem pelos manifestos e se assumissem na maturidade do seu papel social.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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