“Estamos aqui. Estamos em Kiev. Estamos a defender a Ucrânia”

Com o cerco a fechar-se à capital da Ucrânia, Estados Unidos e União Europeia anunciam sanções ao líder russo. NATO activa pela primeira vez a sua Força de Resposta e envia reforços para o Leste da Europa.

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Destroços num bairro residencial de Kiev Reuters/UMIT BEKTAS
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Famílias à espera para deixar a capital de comboio Reuters/UMIT BEKTAS
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Imagem do vídeo em que o Presidente da Ucrânia promete resistir Reuters/UKRAINIAN PRESIDENTIAL PRESS SER

O dia começou com Kiev a ser alvo de mísseis e os seus habitantes a tentarem perceber de onde vinham os sons de explosões e acabou com a capital ucraniana debaixo de ataques aéreos e a sentir-se cercada, com notícias de combates a pouco mais de três quilómetros do Parlamento e da central Praça Maidan.

“Esta noite vai ser a mais dura. O inimigo vai dar tudo. Temos de resistir. A noite vai ser muito dura, mas vamos chegar ao nascer do sol”, afirmou o Presidente, Volodomir Zelensky, numa mensagem aos ucranianos ao início da madrugada. “Muitas das nossas cidades estão sob ataque; Chernihiv, Sumy, Kharkiv, os nossos rapazes e raparigas no Donbass, as cidades do Sul, atenção especial a Kiev”, disse. “Não podemos perder a capital.”

Mas o cerco a Kiev não estava completo – a maioria das unidades russas, vindas da Bielorrússia, avançavam para a cidade por Norte e Ocidente, outras, mais afastadas, progrediam de Leste, vindas da Rússia –, prevendo-se que uma operação para a tomar não acontecesse sem o círculo estar completo.

“Estamos aqui. Estamos em Kiev. Estamos a defender a Ucrânia”, afirmara horas antes Zelensky, num vídeo que publicou nas redes sociais onde surgia acompanhado do primeiro-ministro e dos seus mais próximos colaboradores, diante do edifício da presidência. “Os nossos soldados estão aqui. Os cidadãos estão aqui e nós estamos aqui. Defendemos a nossa independência”, assegurou.

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Este apelo chegou horas depois de o Ministério da Defesa ter encorajado os habitantes da capital a prepararem “cocktails molotov” e a prepararem-se para resistir. Centenas de milhares de ucranianos estão em fuga – a ONU estima que 100 mil pessoas tenham deixado as suas casas logo na quinta-feira e diz que “mais de 50 mil refugiados fugiram do país em menos de 48 horas”.

“Tomem o poder, será mais fácil para chegarmos a um acordo”, pedia por seu turno, Vladimir Putin, dirigindo-se aos militares ucranianos.

Depois de um telefonema com o Presidente chinês, Xi Jinping, em que o chefe de Estado russo terá dito que estava “disponível para iniciar negociações de alto nível de alto com a Ucrânia”, o Kremlin explicou que Moscovo poderia enviar de imediato uma delegação para Minsk, na Bielorrússia, onde poderia iniciar-se um diálogo que teria de se focar na declaração da Ucrânia como um Estado “neutral” – abdicando da intenção de se juntar à NATO – e no processo de “desmilitarização” do país.

Washington considerou estas intenções como duvidosas, afirmando que “estas não são as condições para a verdadeira diplomacia” e exigindo que a Rússia parasse antes de bombardear a Ucrânia. “Estamos prontos para conversar assim que as forças ucranianas aceitarem o apelo do nosso Presidente de deixarem de lutar”, esclareceu, em Moscovo, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Serguei Lavrov.

Apesar do evidente desequilíbrio de forças, tanto o Pentágono como o chefe da secreta militar britânica, tenente-general Jim Hockenhull, garantem que “as forças ucranianas oferecem forte resistência, focando-se na defesa de cidades-chave”, uma resistência que Washington assegura estar a surpreender os militares russos e a atrasar os seus avanços.

Para além dos arredores de Kiev; do Sul, onde os russos tentam progredir a partir da Crimeia (a península anexada por Moscovo em 201) e da cidade portuária de Odessa; do Leste, através do Donbass (onde se situam os territórios separatistas que Putin afirmou inicialmente querer proteger); os combates continuam acesos em torno de Kharkiv, a segunda maior cidade do país. O Pentágono confirmou que a Rússia lançou um “ataque anfíbio” em Mariupol, cidade portuária na costa do mar de Azov, no Sudeste da Ucrânia.

Depois de lamentar que os ucranianos tivessem sido “deixados sozinhos” para se defenderem, celebrava as garantias de “sanções mais fortes, assistência concreta de defesa e uma coligação antiguerra” que acabara de receber do Presidente norte-americano, Joe Biden.

Pouco depois, a Casa Branca confirmava que os Estados Unidos iam impor de imediato sanções contra o Presidente russo e o seu ministro dos Negócios Estrangeiros, incluindo o congelamento dos bens (medida que raras vezes terá visado um líder mundial), seguindo assim os passos da União Europeia e do Reino Unido. Apesar do simbolismo, e do carácter provocador, a medida não terá grandes efeitos práticos: não se sabe onde Putin tem o seu dinheiro, mas ninguém acredita que seja nos EUA ou em países da UE.

Ao contrário dos europeus, os norte-americanos optaram por impor também impor restrições de viagem a Putin, disse aos jornalistas a porta-voz da Casa Branca, Jen Psaki, admitindo que ainda não dispunha de mais pormenores. “Há muito poucos exemplos em que isto foi feito, como sabem, mas faz parte”, afirmou.

"Fazer o que for preciso"

Ao mesmo tempo que se esforça por mobilizar os ucranianos, Zelensky faz os possíveis por espicaçar os europeus, descrevendo a invasão da Ucrânia como uma agressão à Europa: trata-se do “início da guerra contra a Europa”, afirmou, mas “a Europa tem força suficiente para parar esta agressão”. Pouco depois, questionada sobre o facto de a Finlândia e a Suécia terem sido convidadas a participar como observadores na cimeira extraordinária da NATO, esta sexta-feira, a porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros russo ameaçou os dois países com “sérias repercussões políticas e militares” caso decidam aderir à Aliança Atlântica.

“A Finlândia e a Suécia não devem basear a sua própria segurança prejudicando a segurança de outros países”, sublinhou Maria Zakharova, durante uma conferência de imprensa. Mais tarde, citada pela agência de notícias russa Interfax, Zakharova descrevia as relações da Rússia com os EUA e o Reino Unido como próximas de um “ponto de não retorno”.

“Os objectivos do Kremlin não se limitam à Ucrânia”, afirmou o secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg, no final da cimeira em que os países membros decidiram enviar reforços militares para a Europa de Leste e activar, pela primeira vez, a sua Força de Resposta, que conta com 40 mil soldados.

“Não deve haver espaço para erros de cálculo. Vamos fazer o que for preciso para proteger e defender cada um dos nossos aliados e cada centímetro do território da NATO”, afirmou Stoltenberg. “O mundo responsabilizará a Rússia e a Bielorrússia pelas suas acções”, assegurou ainda. “A Rússia como agressor, a Bielorrússia como facilitador.”

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