Covid-19: primeiro doente conhecido com reinfecção pela variante sul-africana está em estado crítico

Um homem está em estado crítico, em França, depois de ter sido detectado com a variante sul-africana do novo coronavírus quatro meses após ter sido diagnosticado pela primeira vez com covid-19.

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Unidade de cuidados intensivos para pacientes com covid-19 num hospital em Marselha, França Eric Gaillard/REUTERS

Um homem está em estado crítico, em França, depois de ter sido infectado com a variante sul-africana do novo coronavírus quatro meses após ter sido diagnosticado pela primeira vez com covid-19. Este é o primeiro caso registado de reinfecção que envolve a mutação do novo coronavírus mais contagiosa e que mais tem preocupado os cientistas — mutação esta que está presente na variante sul-africana, assim como nas variantes detectadas no Brasil e Reino Unido —, de acordo com os médicos que estão a tratar o paciente.

Depois de ter tido uma infecção ligeira pelo novo coronavírus em Setembro, o homem, de 58 anos, com historial clínico de asma, foi hospitalizado em Janeiro e continua em estado crítico, de acordo com um artigo divulgado na sexta-feira pela revista médica Clinical Infectious Diseases. Os autores do artigo explicam que os casos de reinfecção como este “continuam a ser raros, embora sejam provavelmente subestimados”, o que exige uma investigação mais aprofundada sobre a imunidade cruzada entre as variantes e a eventual eficácia das vacinas contra estas variantes.

Casos desta variante originalmente identificada na África do Sul, chamada B. 1.351, têm sido reportados a nível global, existindo já 13 casos identificados em cinco estados norte-americanos, de acordo com o Centro para a Prevenção e Controlo de Doenças dos EUA. A variante foi também já detectada em Portugal.

À medida que a mutação referida começa a ganhar mais prevalência, os cientistas expressam preocupação de que a variante sul-africana, assim como as variantes britânica e brasileira, se possam tornar predominantes e que as vacinas contra a covid-19 desenvolvidas antes do seu surgimento não tenham eficácia contra elas.

Estudos das vacinas produzidas pela Moderna, pela Pfizer/BioNTech e pela Novavax — empresas que contam com o apoio da Operação Warp Speed do governo norte-americano — mostraram que as vacinas funcionam contra a variante B. 1.351, embora tenham uma menor eficácia.

A empresa de biotecnologia norte-americana Novavax afirma que “os dados sugerem que uma infecção prévia pelo novo coronavírus pode não proteger completamente contra uma infecção subsequente pela variante detectada na África do Sul, mas que a sua vacina “forneceu uma protecção significativa”.

Apesar do receio de que as variantes emergentes do novo coronavírus possam prolongar o esforço para atingir a imunidade de grupo, especialistas alertam que tais casos de reinfecção, como este registado em França, não são comuns, o que sugere que muitos daqueles que já recuperaram da doença poderão ter efectivamente imunidade. Estudos mostraram que as células do organismo que combatem os vírus são capazes de ter memória do patógeno de uma infecção anterior e atacá-lo, podendo travar a infecção ou evitar o desenvolvimento de sintomas mais graves.

“Preocupa-me especialmente que algumas destas conclusões precipitadas e prematuras possam roubar a esperança às pessoas”, afirmou ao The Washington Post Angela Rasmussen, virologista do Centro de Ciência e Segurança em Saúde Global da Universidade de Georgetown, nos EUA. “Preocupa-me que a mensagem que possam receber é que nunca nos iremos livrar disto. Quando, na verdade, não é isso que os dados sugerem”, acrescentou.

Perante a falta de dados e de monitorização das novas variantes do SARS-CoV-2, torna-se difícil avaliar quão comuns as reinfecções podem ser ou confirmar as alegações dos investigadores franceses de que este é o primeiro caso registado de reinfecção pela variante sul-africana.

Na sexta-feira, a Organização Mundial da Saúde (OMS) alertou que recebeu relatórios preliminares da África do Sul sobre pessoas reinfectadas por uma nova variante do vírus. Em conferência de imprensa, a cientista da OMS Soumya Swaminathan não avançou mais detalhes sobre esses casos, mas disse que as reinfecções é uma das “áreas em investigação” actualmente.

Swaminathan acrescentou ainda que os ensaios clínicos das vacinas revelaram resultados promissores, destacando que a inoculação pode proteger contra a doença grave e a morte. Porém, a investigadora não mencionou o caso detectado em França.

Sete dias após ter sido internado, foi ligado a um ventilador

Os investigadores franceses explicam no artigo, publicado na sexta-feira, que o homem apresentou febre baixa e dificuldade em respirar quando esteve infectado pela primeira vez. Após recuperar da doença, o paciente realizou dois testes com resultado negativo em Dezembro. Segundo os especialistas, a hipótese de o homem ter depois testado positivo devido a partículas do vírus que eventualmente poderiam permanecer no seu organismo foi excluída devido ao período de tempo que passou entre as infecções.

Os investigadores não sabem com que variante do vírus o homem foi infectado pela primeira vez. Porém, numa segunda infecção, quando foi hospitalizado, foram identificadas três mutações representativas da variante B. 1.351 através da sequenciação do genoma. Sete dias após ter sido internado, o homem foi entubado e ligado a um ventilador.

Até ao momento, não há provas de que a nova variante do SARS-CoV-2 detectada na África do Sul seja mais mortal. Já a variante britânica está “provavelmente” associada a um risco maior de hospitalização e morte, segundo revelaram cientistas que aconselham o governo britânico num outro artigo publicado na sexta-feira. As autoridades britânicas tinham também já indicado que a variante “pode estar associada a um grau mais elevado de mortalidade”.

As incertezas sobre as variantes — e a possibilidade de o vírus poder continuar a sofrer mutações — alarmaram as autoridades, que aconselham as pessoas a manterem o distanciamento social para travar a sua propagação.

Mais casos da mutação detectada na variante sul-africana foram identificados nos Estados Unidos, segundo revelou à CNN Anthony Fauci, o principal virologista dos Estados Unidos, o que significa que esta variante pode tornar-se a principal fonte de infecção no país. “Se se tornar dominante, a experiência dos nossos colegas na África do Sul indica que, mesmo que tenha sido infectado com o vírus original, há uma taxa muito elevada de reinfecção a ponto de uma infecção prévia não aparentar protegê-lo contra a reinfecção”, disse Fauci, sublinhando que “a vacinação é muito importante”.

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