Novo medicamento para o VIH mostra resultados positivos em humanos

Tratamento experimental funciona como um inibidor da cápside (um invólucro) do VIH e está a ser testado em ensaios com pessoas infectadas pelo vírus.

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Ilustração da perda da cápside (magenta) num virião do VIH quando se junta a pequenas moléculas GS-6207 (turquesa) Random42
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Ilustração da perda da cápside (magenta) num virião do VIH quando se junta a pequenas moléculas GS-6207 (turquesa) Random42

Chama-se lenacapavir e é apresentado na edição desta semana da revista científica Nature como um potencial tratamento da infecção por VIH. Ao longo do artigo científico, descrevem-se resultados preliminares de ensaios clínicos (em humanos) que mostraram uma redução na carga viral de pessoas com VIH depois de uma única dose deste medicamento, que está a ser desenvolvido pela empresa de biofarmacologia norte-americana Gilead Sciences.

Formalmente designado GS-6207, o lenacapavir é descrito num resumo sobre o trabalho como uma pequena molécula que “desestabiliza” a cápside (um invólucro de origem proteica) do vírus da imunodeficiência humana (VIH). A cápside é uma proteína estrutural que forma uma concha protectora à volta do material genético do vírus. Com base em estudos anteriores, essa molécula foi criada para se ligar “firmemente” às proteínas da cápside e, desta forma, interferir com várias interacções essenciais para a replicação do vírus. Ou seja, o medicamento é um inibidor da cápside. Caso seja desenvolvido com sucesso e autorizado, poderá tornar-se o primeiro inibidor da cápside do VIH no mercado, segundo a Gilead Sciences.

Em experiências laboratoriais, tem mostrado ser eficaz contra diferentes estirpes do VIH e que actua de forma simultânea com medicamentos anti-retrovirais já aprovados. Doses diárias orais de medicamentos anti-retrovirais são usados para controlar a infecção por VIH. Contudo, algumas pessoas têm resistência a esses medicamentos, o que reduz a eficácia do tratamento. O GS-6207 pode ser assim um complemento a esses tratamentos.

Por agora, um ensaio clínico em 40 pessoas saudáveis indica que esta molécula é “geralmente segura”, “bem tolerada” e que pode permanecer activa no corpo por mais de seis meses depois da sua administração – que é feita por injecção subcutânea. Depois, num ensaio clínico (fase 1) com 32 pessoas com uma infecção por VIH-1 verificou-se que havia uma redução da carga viral nove dias depois de terem tomado uma única dose de lenacapavir.  

Estes resultados demonstram o potencial futuro do lenacapavir como um tratamento duradouro para tratar ou prevenir o VIH e estimula a avaliação clínica que está neste momento a decorrer em combinação com outros agentes anti-retrovirais”, afirmou relativamente aos resultados do estudo o gabinete de comunicação da Gilead Sciences.

E quais as vantagens deste medicamento em relação a outros? O gabinete de comunicação da empresa começa por explicar que os medicamentos orais anti-retrovirais para o VIH ajudam milhões de pessoas com VIH a ter uma vida mais longa e saudável, mas que para alguns doentes pode ser “um desafio” ter de tomar uma dose diária desses medicamentos. Por isso, ao retirar o peso dessa dose diária, um tratamento injectável e de acção prolongada pode ter a potencialidade de ajudar essas pessoas. “Do ponto de vista do doente, acreditamos que o lenacapavir oferece potencialmente uma variedade de características desejáveis para as quais está a ser avaliado, incluindo a administração subcutânea, uma injecção pouco volumosa, e um intervalo de seis meses entre as dosagens.”

O que se segue

Mas ainda há muito a saber e a avaliar relativamente ao lenacapavir. Para já, estão a decorrer ensaios (fase 2/3) em 36 pessoas com VIH que já fizeram vários tratamentos com outros medicamentos, bem como em 175 pessoas (fase 2) que nunca fizeram nenhum tratamento antes.

Além disso, o lenacapavir está a ser desenvolvido para ser usado em combinação com outros medicamentos anti-retrovirais. Essa combinação poderá funcionar com uma injecção subcutânea a cada seis meses e um comprimido semanal. A Gilead Sciences diz que desenvolverá várias substâncias “parceiras” do lenacapavir, tendo em conta que o perfil e o intervalo da dosagem dessas substâncias podem interferir no resultado da combinação. Por fim, seleccionar-se-á o parceiro mais indicado.

Outros medicamentos para tratamento da infecção por VIH estão também a ser desenvolvidos. Através de outra abordagem, por exemplo cientistas nos Estados Unidos revelaram em Junho na revista científica Cell Reports Medicine os resultados do ciapavir em ratinhos. Este medicamento usa a técnica “choque e morte” ao acordar o vírus latente sem que se estimule uma resposta imunitária que poderá ser fatal. Depois, ataca-o com anticorpos capazes de o neutralizar ou com células imunitárias modificadas que destroem as células que estão infectadas.

No estudo anunciado em Junho, esse medicamento foi dado a ratinhos infectadas com VIH, o que aumentou os níveis do vírus no sangue e na medula óssea ao mesmo tempo que existia uma reduzida activação imunitária. Numa fase seguinte, a equipa coordenada por Sumit Chanda (director do Programa de Imunidade e Patogénese do Instituto de Descoberta Médica Sanford Burnham Prebys, em La Jolla, nos EUA) pretende testar o ciapavir em primatas, bem como realizar estudos toxicológicos para garantir que está pronto para ser testado em humanos.

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