Kim vai ser o primeiro líder norte-coreano a pisar território do Sul

Encontro histórico entre líderes das duas Coreias agendado para esta sexta-feira, na zona desmilitarizada. Programa preparado ao pormenor inclui a plantação de uma árvore e um banquete.

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Estudantes sul-coreanos aguardam com expectativa encontra entre Moon e Kim JORGE SILVA / Reuters

Pela primeira vez desde a assinatura do armistício que suspendeu a Guerra da Coreia (1950-1953), um líder da Coreia do Norte vai cruzar a fronteira com o Sul. Na sequência do recente desanuviar das tensões entre Pyongyang e Seul, antecedidos por alguns dos meses mais inflamados em matéria de intimidações e ameaças – com Donald Trump ao barulho –, Kim Jong-un vai passar grande parte da próxima sexta-feira na zona desmilitarizada, envolvido em negociações e cerimónias com Moon Jae-in, Presidente da Coreia do Sul.

O líder norte-coreano chefiará uma delegação que inclui mais nove representantes oficiais do regime e será recebido por Moon na fronteira entre os dois países, por volta das 9h30 locais (1h30 em Portugal continental). Cerca de uma hora depois, terá lugar a primeira ronda de conversas oficiais, já em Panmunjom – a “Aldeia da Paz”.

Os líderes dos dois Estados desavindos da Península da Coreia tentarão dar seguimento a um conjunto significativo de tomadas de posição, de parte a parte, que vieram oferecer algum optimismo para um possível cenário de normalização das relações intercoreanas e abrir caminho para o inédito encontro entre Kim e Trump, ainda sem data, nem local – fala-se de Maio. 

A lista dos mais marcantes episódios de desanuviamento do clima de tensão inclui ainda a abertura demonstrada por Kim – num discurso à nação em Janeiro – em dialogar com Seul, a participação de uma delegação da Coreia do Norte nos Jogos Olímpicos de Inverno em Pyeongchang (Coreia do Sul), o restabelecimento dos canais intercoreanos de comunicação e a suspensão dos ensaios nucleares e balísticos na base norte-coreana de Pyunggye-ri.

Um compromisso para a desnuclearização da Coreia do Norte e um acordo de paz que possa colocar um ponto final no conflito na península são as duas grandes metas que Moon gostaria de cruzar neste encontro, mas no seio da sua administração – e junto dos aliados japoneses e norte-americanos – impera a noção de que ambos os objectivos podem ser demasiado ambiciosos no curto prazo.

Nesse sentido, a postura sul-coreana assenta no realismo por cima do optimismo. Citado pela Reuters, o porta-voz da presidência, Im Jong-seok, confirma que ambos os temas serão centrais no encontro entre Kim e Moon, mas admite as complexidades que a eles estão associadas e refreia os ânimos. “É difícil prever até que ponto é que os dois líderes conseguirão alcançar um acordo sobre a disposição [norte-coreana] de se desnuclearizar”, disse o representante do Presidente.

Do ponto de vista norte-coreano, o núcleo duro do “evento histórico” assenta nos desejos de unificação da península. “Melhorar as relações Norte-Sul é um requisito necessário para alcançar a unificação da pátria”, lê-se no editorial do Rodong Sinmun, o jornal oficial do Partido dos Trabalhadores.

Para além destas matérias, as duas delegações conversarão ainda sobre questões económicas, sociais e militares de ordem prática, que influenciam directamente o dia-a-dia das respectivas populações.

Agenda preenchida

O encontro histórico entre Kim Jong-un e Moon Jae-in foi preparado ao pormenor pelos representantes das duas partes envolvidas e inclui alguns momentos alegóricos.

Com Kim viajarão nove pessoas, incluindo a sua irmã, Kim Yo-jong, e alguns responsáveis militares. Já Moon será acompanhado por sete pessoas, entre os quais os ministros dos Negócios Estrangeiros, Defesa e Unificação.

À recepção da comitiva norte-coreana na fronteira e sequente escolta até Panmunjom, a organização sul-coreana presenteia o séquito de Kim com uma cerimónia de boas-vindas na praça principal da aldeia. A primeira ronda de negociações está agendada para as 10h30 (2h30 de Lisboa), na Casa da Paz.

Depois do primeiro encontro, as duas delegações almoçarão separadamente – os norte-coreanos voltam mesmo a cruzar a fronteira com o Norte.

A tarde arranca com novo momento simbólico: Kim e Moon vão plantar um pinheiro, em nome “da paz e da prosperidade” coreana, recorrendo a terra e água dos dois lados do paralelo 38. Depois da plantação da árvore, as duas comitivas voltam a reunir-se para nova ronda de negociações. Para o final deste momento a expectativa é saber se haverá lugar à assinatura de algum acordo e à divulgação de um comunicado conjunto.

A cimeira encerra com um banquete, planeado e confeccionado por cozinheiros dos dois países. Na ementa constará um prato suíço – preparado especialmente para Kim, que alegadamente estudou na Suíça, durante a sua adolescência –, um prato de peixe típico da cidade sul-coreana de Busan e ainda um prato especial de massa chinesa fria, uma especialidade da Coreia do Norte.

Trump esconde a mão

Esta quinta-feira o Presidente dos Estados Unidos voltou a oferecer sinais contraditórios sobre a possibilidade de se encontrar com o líder da Coreia do Norte. Em declarações à Fox News, Donald Trump disse que tem em mente três ou quatro datas e cinco lugares possíveis para a realização do encontro, mas admitiu que o mesmo pode nem sequer vir a realizar-se.

“Pode ser que eu abandone o encontro rapidamente – com todo o respeito – mas até pode ser que o encontro nem venha a ocorrer, quem sabe? O que vos posso dizer é que, por agora, eles [norte-coreanos] querem reunir-se”, disse Trump à cadeia norte-americana, por telefone.

O Presidente dos EUA explicou ainda que o encontro entre Kim e Mike Pompeo – o homem escolhido para substituir Rex Tillerson na Secretaria de Estado – não foi planeado e que o segundo quis reunir-se com o primeiro para “dizer olá”.

“Não era suposto que ele [Pompeo] se tivesse reunido com Kim Jong-un, mas fê-lo. Arranjaram o encontro para ele dizer olá”, afirmou o chefe de Estado norte-americano.

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