Enquanto prepara a batalha por Alepo, Assad tenta "limpar" subúrbios de Damasco

Aliados de Assad fazem ressurgir as forças governamentais e agitam as águas da guerra. Há indicações da chegada de milhares de militares iranianos à Síria.

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Há mais de dois anos que Alepo é disputada entre regime, rebeldes e extremistas. Imagem de uma barreira improvisada a atiradores-furtivos. Joseph Eid/AFP

O exército sírio de Bashar al-Assad lançou nesta quarta-feira uma “vasta operação” militar sobre os subúrbios de Damasco na posse de rebeldes e grupos extremistas. É uma ofensiva que se enquadra no ressurgimento das forças governamentais em todo o país, auxiliadas nos ares pelos caças de Moscovo. 

Segundo disseram fontes do exército sírio à AFP, a intenção não é capturar todas as zonas rebeldes, das mais populosas no país, mas sim alargar o domínio da capital. “O exército começou uma operação militar nesta manhã com o objectivo de alargar a banda de segurança em torno dos sectores controladas”, afirmou.

Os militares sírios avançaram sobre Jobar, a Leste do centro de Damasco, ainda a mais de cinco quilómetros de Duma, o grande centro urbano nas mãos dos rebeldes. O Governo sírio tem um cerco montado a estas zonas há vários meses. Os bairros de Duma são algumas das montras mais trágicas do conflito sírio.

Aos ataques de rocket lançados pelos rebeldes contra o centro da capital, o regime de Assad costuma responder com bombardeamentos pesados que atingem predominantemente civis. Aconteceu mais recentemente nesta terça-feira, em retaliação a dois rockets lançados contra a embaixada da Rússia em Damasco: bombas sírias atingiram um mercado no Leste de Ghuta e mataram mais de 12 civis, segundo o Observatório Sírio para os Direitos Humanos.

Mas as atenções estão agora voltadas para Alepo, no Norte do país. O regime está a movimentar os seus combatentes nos bairros da maior cidade da Síria e prepara-se para uma grande ofensiva para a conquistar. Será auxiliada nos ares por caças russos e no terreno pelo Hezbollah libanês, um satélite do Irão no conflito, milícias aliadas ao Governo e, de acordo com a Reuters, milhares de soldados iranianos que chegaram nos últimos dias ao país.

A agência avançou na terça-feira com a notícia, em que cita dois responsáveis militares sírios, mas não os identifica. Segundo um deles, “as preparações para a grande batalha são evidentes”. “Há uma grande mobilização do exército sírio, de combatentes de elite do Hezbollah e de milhares de iranianos que chegaram por fases nos últimos dias”.

A confirmar-se, será a primeira vez que o Irão envia para a Síria um contingente destas dimensões para lutar em nome de Bashar al-Assad. Teerão é quem mais apoia militarmente o regime de Assad, mas, até ao momento, fê-lo apenas através do Hezbollah libanês, conselheiros militares e membros da Guardas da Revolução, a sua força de elite. O Governo admite apenas enviar conselheiros, mas, mesmo nesse campo, há indicações de que a sua cooperação militar está a aumentar.

Os Guardas da Revolução anunciaram a morte de dois coronéis iranianos nesta quarta-feira, às mãos do autoproclamado Estado Islâmico, embora não tivessem indicado onde. Afirmaram, tal como na semana passada, na ocasião da morte do general Hossein Hamadani, precisamente em Alepo, que estavam em missão de “aconselhamento e auxílio ao exército da resistência síria no seu combate contra os terroristas”.

“A decisão de lançar a batalha de Alepo foi tomada”, assegura o segundo oficial sírio à Reuters. “Já não está a ser escondido que há agora milhares de iranianos na Síria e que o seu papel é fundamental”, conclui.

Agitam-se as águas

A entrada da Rússia no conflito disparou uma nova onda de batalhas, agitando as águas em territórios mais-ou-menos estagnados. Algo para o qual também contribui o Ocidente e seus aliados regionais. Os Estados Unidos optaram por responder à ofensiva russa na Síria abrindo a torneira do envio de armas para grupos rebeldes da sua confiança, que, por sua vez, começaram a fazer alianças com extremistas para combater o novo ímpeto do exército sírio. 

A campanha aérea de Moscovo tem-se concentrado nas províncias que Assad perdeu ao longo da guerra para rebeldes e extremistas, sobretudo em Hama, Homs e Idlib, onde o Presidente sírio está mais fragilizado. Há dias que os caças russos bombardeiam com intensidade as vilas de Kafr Nabuda e Khan Cheikhou, nas mãos de uma aliança de islamistas e pequenos grupos moderados, cruciais para o domínio da auto-estrada que liga Damasco a Alepo.

Alepo é uma cidade em ruínas, disputada há mais de dois anos entre uma miríade de grupos rebeldes e islamistas, radicais como o autoproclamado Estado Islâmico e a Frente al-Nusra, e o exército de Assad. É a maior cidade na Síria e, antes da guerra, um dos seus principais centros industriais e económicos. É também um ponto estratégico crucial no país, já que é a última grande cidade no Norte, a poucos quilómetros da fronteira com a Turquia.

As peças da guerra por Alepo começaram a mover-se há uma semana. O Estado Islâmico capturou pelo menos cinco vilas a mais de dez quilómetros do centro da cidade, a Norte. Nesta quarta-feira a ofensiva dos extremistas prosseguia nos arredores, a cerca de 12 quilómetros do centro. Os jihadistas estão a dois quilómetros do território do exército sírio em Alepo.

No terreno, as preparações do exército sírio já se fazem notar. “Há mobilizações do regime na maior parte de Alepo”, disse nesta quarta-feira à Reuters o comandante de um grupo rebelde com posições na cidade, sem contudo confirmar a presença de militares iranianos.

A entrada em força do Irão na guerra na Síria sustentaria uma das interpretações mais comuns sobre o actual momento do conflito: Bashar al-Assad e os seus aliados querem primeiro recuperar alguns territórios e cidades-chave antes de avançarem para um eventual processo de resolução política. Rússia e Irão, os dois grandes pilares estrangeiros do regime, dizem-se abertos à partida de Assad, mas insistem em que o Presidente sírio faça parte de uma transição política. É um argumento que colhe cada vez mais adeptos no Ocidente, incluindo os Estados Unidos e países europeus como a Alemanha, Reino Unido e Espanha.

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