Clientes ignoram rumores sobre problemas financeiros no BCP

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Acções do BCP deslizaram ontem 0,47 por cento, num dia calmo para a banca Paulo Ricca

A generalidade dos clientes do Banco Comercial Português (BCP) ignorou os boatos que circularam nos canais electrónicos revelando que a instituição estaria na iminência de ser intervencionada. Segundo os rumores, a iniciativa deveria ter acontecido ontem, o que não se verificou.

Nas últimas semanas rolaram pelos sistemas de comunicação electrónicos mensagens com origem vária, e a partir de números que não existem, a alertar para alegados problemas financeiros no BCP que seriam resolvidos com recurso a uma intervenção do Banco de Portugal (BdP) ou à sua nacionalização. Ambas anunciadas para o último fim-de-semana e segunda-feira (ontem).

Em simultâneo, e pelos mesmos meios, outros anónimos garantiam, e para o mesmo dia, o lançamento de uma oferta pública de aquisição (OPA) sobre o BCP. Uma operação contraditória com as duas anteriores, pois não se realiza em bancos com problemas. Mas ontem nem o BdP, nem o Estado entraram no BCP e a OPA não surgiu. O movimento anónimo foi desencadeado de forma sistemática, num contexto de crise de liquidez que afecta os países do sul da Europa. E surge numa altura em que o BCP ainda se encontra a digerir divisões entre colaboradores, entre órgãos sociais e accionistas.

Foi neste quadro particular que os rumores se disseminaram por emails (sem datas), por sms e através das redes sociais, e atingiram tais proporções que levaram na sexta-feira o CEO do BCP, Carlos Santos Ferreira, a intrometer-se para garantir aos seus trabalhadores e aos mercados que eram falsos, mal intencionados e que visavam um ataque orientado contra o sistema financeiro português.

O banco apresentou ontem formalmente uma queixa-crime no DIAP, depois de na sexta-feira ter comunicado por email essa intenção, o que acontece três semanas após o início dos boatos. Uma fonte do PÚBLICO lembrou que, em regra, os rumores partem de gerentes ou de clientes descontentes com a empresa. E quando são ocasionais também são inconsistentes pois um banco "não vai à falência de um momento para o outro." Evidenciou que "os factos aqui são mais complexos e articulados e parecem visar enfraquecer a instituição. Mas será que são orquestrados?"

Caso não é inédito no BCP

Instado pelo PÚBLICO a pronunciar-se sobre o que se está a passar à volta do BCP, o BdP recusou fazê-lo por estarem em causa "rumores". Já no final de 2008, quando o sistema financeiro mundial se desregulou, o BCP tinha sido alvo de um ataque idêntico nos meios electrónicos. Os autores das mensagens solicitam aos clientes do BCP que transfiram rapidamente os depósitos e aplicações financeiras para outros bancos.

Mas a grande maioria dos clientes do BCP não deu crédito aos boatos e manteve a confiança na instituição, pois não correu a ir levantar as suas poupanças. O PÚBLICO visitou ontem várias agências e o ambiente era de tranquilidade. Um responsável do BCP adiantou que ao nível das transacções electrónicas não se registaram movimentações anormais. Ainda assim, continuaram ontem a chegar ao banco, via telefone, por email e pessoalmente, pedidos de esclarecimento sobre a veracidade dos rumores. Questões que chegaram também às redacções dos jornais.

O secretário de Estado do Tesouro Carlos Pina, em entrevista à Reuters, veio ontem sublinhar que "o sistema bancário é sólido, robusto, bem gerido e eficazmente supervisionado, não tendo problemas de capital a resolver". Uma declaração feita dias antes de serem conhecidos os resultados dos testes de stress à CGD, ao BCP, ao BES e ao BPI, a divulgar a 23 de Julho.

No final da semana passada António Ramalho, gestor do BCP, disse ao Jornal de Negócios que o banco estava a crescer mais em depósitos do que em crédito e esclareceu que nos primeiros dias do mês tinha captado 400 milhões de euros em recursos e concedido financiamentos de 30 milhões. Ramalho garantiu ainda ter amortizado em Maio a divida deste ano no valor de 2,35 mil milhões de euros, e que em 2011 as necessidades de reembolso são de três mil milhões. O gestor sublinhou que "o mercado internacional já tomou nota disso e o valor dos nossos credit default swaps [instrumentos que funcionam como um seguro contra a falência de empresas] é o mais baixo da banca portuguesa."

Mas ao contrário do que aconteceu na última sexta-feira, quando os rumores tomaram conta dos mercados, ontem o sistema bancário nacional manteve-se calmo, com as cotações dos bancos (BCP, BES e BPI) a encerrarem a sessão quase inalteradas. O BCP deslizou 0,47 por cento.

No último dia da semana passada, os banqueiros portugueses deram sinais de preocupação ao tomarem conhecimento da dimensão e da natureza dos boatos, pois estes envolviam uma instituição com 25% do sector. Incrédulos com o que se passava admitiram que "saberiam" se o BCP tivesse um "problema de insolvência" e, nesse caso, "ter-se-iam articulado" entre si e com o BdP "para o resolver". O objectivo seria evitar que, em momento de crise, tivessem de apanhar com os estilhaços.

Para além da banca, na sexta-feira, o ruído envolvendo o BCP agitou o meio político, fazendo eco junto de altos dirigentes do PSD e do PS e de grandes escritórios de advocacia. Ao não se confirmarem, os rumores perderam gás. "Investidas" como as que se registaram têm efeitos perversos pois minam a imagem do banco, que vive da confiança dos clientes e investidores. E, em certas circunstâncias, podem gerar um problema onde ele não existe.

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