Tapete vermelho estendido à Fosun

A Fosun entrou, finalmente, na semana passada, no capital do Millennium BCP, pela porta grande e com um tapete vermelho estendido.

O Governo fez aprovar dois decretos e um acordo que parecem desenhados à medida da Fosun. De acordo com a imprensa, essas deliberações do Governo resultariam de condições impostas pela Fosun para entrar no capital do BCP: Primeiro, o Governo, através do decreto lei nº 67/2016, facilitou uma operação de “fusão das acções”, que permitiu a redução do número de acções do BCP.

Segundo, o Governo chegou a um acordo com a banca para melhorar significativamente as condições do empréstimo do Estado ao Fundo de Resolução. Na prática, esta alteração poderá vir a traduzir-se numa “doação” dos contribuintes à banca que, provavelmente, excederá os 130 milhões de euros por ano.

Terceiro, o Conselho de Ministros aprovou a 17 de Novembro um Decreto-Regulamentar que, segundo o Expresso, permite à Fosun avançar para o BCP “com mais conforto” porque – deduz-se – resulta em vantagens fiscais no tratamento de imparidades ao crédito, com custos para o erário público difíceis de quantificar.

Porquê tanto “esforço” do Governo para acolher a Fosun? Este é um grupo empresarial que não impressionou favoravelmente com o seu investimento na Fidelidade ao, na prática, adquirir a Fidelidade com as disponibilidades líquidas desta. E, sabe-se, que as regras para o sector bancário em vigor na União Europeia permitem, em teoria, que a Fosun financie, mais tarde, pelo menos parte do seu investimento accionista no BCP com financiamento do próprio BCP.

Afigura-se que o Governo toma estas medidas em benefício da Fosun, porque está preocupado com o BCP, mais concretamente, com a ameaça subliminar de aplicação da medida de resolução bancária e do “bail-in” de depósitos ao banco. O acordo firmado em 2012 com a Comissão Europeia previa que o BCP devolvesse todo o empréstimo do Estado (3000 milhões de euros de empréstimo subordinados, “CoCos”) até Junho de 2017.  Ora falta ao BCP devolver 750 milhões de euros desses “CoCos”, numa reprise do que ocorreu com o Banif (relembro que a Comissão Europeia exigia ao Banif a devolução da ajuda estatal, ou em alternativa, ser liquidado ou resolvido). E o BCP, à semelhança do Banif, parece ser incapaz de devolver esses fundos por meios próprios, sem injecções de capital adicionais. Uma análise dos respectivos balanços sugere, aliás, que o Novo Banco está numa posição financeira muito mais robusta do que o BCP…

O problema no BCP resulta de decisões do anterior Governo e do Banco de Portugal. Talvez para evitar a palavra “nacionalização”, aqueles decisores optaram por “encher” o BCP de “CoCos” a taxas de juro elevadas (3000 milhões de euros de “empréstimos subordinados” do Estado), que oneraram as contas do banco e não resolveram o problema da falta de capital.

Mas o passado não pode ser alterado e voltando ao presente, a opção do actual Governo pela Fosun, não parece, de todo, a mais feliz. A melhor solução para o país seria, provavelmente, a conversão dos “CoCos” públicos em acções, que reforçaria os capitais do banco. Mas o Governo parece demasiado condicionado (e temeroso) pela Comissão Europeia e pelo BCE.

Note-se, contudo, que a soberania nacional também passa, numa dimensão importante, pela banca, não só em relação a iniciativas do sector privado, como em relação à actuação do próprio Estado. Em particular, é de realçar que o BCP possui no balanço 5,5 mil milhões de euros de dívida pública portuguesa. O Governo ao “despachar-se” das “chatices” com a banca nacional vendendo-a a interesses estrangeiros, não estará a comprar “chatices” potencialmente maiores? Quem irá adquirir, no futuro, a dívida pública portuguesa?

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