Salão Automóvel de Genebra: Os sonhos suíços encontraram redenção fora da Europa

Depois de ter sido durante muito tempo o mais importante salão para as marcas europeias, Genebra está a reinventar-se com os novos players.

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O novo Kimera Evo38 é um elogio ao analógico numa era digital EPA/CYRIL ZINGARO
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O CEO do Grupo Renault, Luca de Meo, ao lado do Renault 5 Electric Reuters/DENIS BALIBOUSE
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O híbrido plug-in Yangwang U8, da BYD, é capaz de flutuar na água ou de rodar a 360º Reuters/Denis Balibouse
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O ministro dos Transportes, Ambiente, Energia e Comunicações da Suíça, Albert Roesti, inspecciona um automóvel eléctrico Microlino EPA/MARTIAL TREZZINI
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A bagageira dianteira com o cabo de carregamento do Dacia Spring EPA/CYRIL ZINGARO
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A chamar a atenção, quer pelo design dos seus modelos quer pela tecnologia a que recorre, esteve a Lucid, aqui com o Pure Air DR
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O MG3 prepara-se para lutar por um lugar no concorrido segmento B DR
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Para os amantes das quatro rodas, os entusiastas da mobilidade e para a indústria em geral, Genebra, a beneficiar do facto de ser uma espécie de terreno neutro, foi ao longo de mais de um século onde os sonhos ganhavam vida, justificando o evento anual, mesmo em anos de crise, como o fim da primeira década deste milénio.

A primeira vez que o Salão Internacional se realizou na cidade suíça foi em 1905 e, mesmo com alguns percalços, nomeadamente as duas guerras mundiais que levaram à sua não realização, o cancelamento da sua 90.ª edição, em 2020, numa altura em que o mundo ainda nem imaginava que iria ficar em suspenso, tal como a feira, por conta de uma pandemia, terá deixado a expectativa de que o regresso seria em grande. Afinal, tinha sido isso que se observara em 1947, com a Europa a sarar das feridas da Segunda Guerra.

Spoiler alert: não foi isso que aconteceu ao longo desta semana. Depois de já se ter assistido a um decréscimo do interesse que suscitava — como de resto a maioria dos grandes salões automóveis, de Detroit a Xangai —, tendo perdido em torno de 150 mil visitantes em 15 anos, o salão, que abriu portas na última segunda-feira e permanece em funções até este domingo, 3 de Março, arrancou com a expectativa de receber em torno de 200 mil pessoas, um terço do número registado em 2019. E as ausências de emblemas são robustas: da Audi à Volvo, passando pelas mais de dez marcas (made in Alemanha, EUA, França, Itália…) do conglomerado Stellantis, sem esquecer o Grupo VW, as sul-coreanas Hyundai e Kia, ou as nipónicas Honda e Toyota… Enfim: foram mais as marcas que escolheram não ir a Genebra do que as que apostaram na feira suíça.

Ainda assim, como não podia deixar de ser, houve novidades: da recém-chegada BYD ou de players que se preparam para apostar (ainda mais) na Europa, como a norte-americana Lucid Motors (a organização fala em “estrelas em ascensão”).

Entre os gigantes europeus, responderam à chamada a Dacia e a Renault. E em boa hora, já que foi o Scénic, o familiar da marca francesa que se reinventou e se apresenta agora apenas em modo eléctrico, o vencedor do Carro Internacional do Ano, revelado tradicionalmente no primeiro dia da feira.

A Dacia, marca romena que integra o Grupo Renault desde 1999, levou a Genebra a terceira geração do Duster, que promete expandir a sua carteira de fãs, com traços que lhe conferem um aspecto ainda mais robusto e assertivo e igual política de preços (arranca abaixo dos 20 mil euros); um repensado Spring, para se apresentar com mais equipamento e espaço; e o Sandrider, com o qual irá disputar o Campeonato do Mundo de Rally-Raid, a partir de 2025, culminando no Dakar, contando com uma tripla de pilotos de peso: Sébastien Loeb, Cristina Gutierrez Herrero e Nasser Al Attiyah.

Já a Renault, além do premiado Scénic, que revelou no Salão de Munique, em Setembro, aproveitou o momento para desvendar a versão final do muito aguardado Renault 5 E-Tech 100% eléctrico, que deverá chegar a Portugal depois do Verão.

Assente sobre a nova plataforma AmpR Small, desenhada para modelos 100% eléctricos, o 5 E-Tech recupera a aura de estilo do icónico carro da década de 1970 e apresenta-se com um motor, montado à frente, nas declinações de 95, 120 e 150cv: as duas primeiras associam-se a uma bateria de 40 kWh, para uma autonomia em torno dos 300 quilómetros; a mais potente, que apresentará uma aceleração de 0 a 100 km/h em 8 segundos, será proposta com bateria de 52 kWh, sendo capaz de somar cem quilómetros ao alcance. E foi embrulhado numa promessa: haverá versão disponível por menos de 25 mil euros.

A brilharem no stand francês estiveram ainda a Espace E-Tech full hybrid, lançada no fim do ano passado, e o vindouro Rafale, também híbrido, preparado para chegar este ano para ocupar o topo da gama da casa francesa e cujas reservas arrancaram neste mês.

Não é preciso ser grande

Outra marca em destaque foi a BYD, que se estreou por terras lusas no ano passado e que levou a Genebra vários modelos, entre os quais um SUV luxo, com potência de 1200cv, capaz de flutuar na água ou de rodar a 360º.

O híbrido plug-in Yangwang U8 apresenta-se como um rival do Mercedes-Benz Classe G ou do Land Rover Defender e é revelador da vontade que a BYD tem de entrar no nicho do luxo, ao mesmo tempo que abre caminho para a chegada da Denza, a sua marca premium, resultado de uma joint venture com a Mercedes-Benz, esperada para assentar arraiais na Europa até ao fim de 2024.

Além do Yangwang U8, a BYD levou a Genebra o SUV Seal U, que apresentou este ano em Portugal, ou um Tang 100% eléctrico, com autonomia para mais de 500 quilómetros.

Outra marca made in China que se destacou foi a MG, que revelou o híbrido MG3, um utilitário com 195cv, que se apresenta preparado para disputar o concorrido segmento, onde dão cartas o Peugeot 208, o Renault Clio ou o Toyota Yaris.

A chamar a atenção, quer pelo design dos seus modelos quer pela tecnologia a que recorre, esteve a Lucid, empresa de veículos eléctricos premium sediada na Califórnia e que, para já, só é comercializada na Alemanha, Noruega, Países Baixos e Suíça. A Genebra, levou o SUV Gravity, o Air Sapphire e a versão com tracção traseira do Air Pure, tendo aproveitado a feira para destacar como se encontra na vanguarda das extensas autonomias (mais de 800 quilómetros) e nos curtos tempos de regeneração (até 400 quilómetros em 15 minutos).

Mas não é preciso ser grande para ocupar espaço. E o Microlino Lite foi a Genebra mostrar precisamente isso. O microcarro, concebido pela suíça Micro e montado em Turim, Itália, constitui uma solução de mobilidade sustentável que quer ser acessível, quer no preço, quer na democratização de públicos, já que pode ser conduzido por quem não tem carta. Com velocidade máxima limitada a 45 km/h, o Microlino Lite está inibido de circular em auto-estradas e vias rápidas, sendo desenhado especificamente para os meios urbanos.

No entanto, nada como prestações espectaculares para nos porem a sonhar. Como a estreia em Genebra da Kimera Automobili, emblema fundado em 2020, e que levou ao salão suíço um superdesportivo de 600cv, que terá edição limitada a 38 exemplares. O Kimera Evo38 é, para a marca, aquilo que um sucessor, que nunca existiu, do Lancia 037 (o campeão do Mundo de Ralis em 1983) poderia ter sido.

Apresentado como uma espécie de herdeiro dos carros desportivos que saíram de Turim nas últimas décadas do século passado, Luca Betti, CEO e fundador da Kimera Automobili, explicou, citado em comunicado, que o automóvel é a última evolução de um conceito de carro criado para as corridas e levado para a estrada, num elogio ao analógico na era digital e à mecânica pura. Com tracção integral, o modelo recorre a fibra de carbono e titânio para manter um peso baixo e parece assumir-se como uma carta de amor ao passado, numa altura em que a data para o fim dos motores a combustão (em novos) está cada vez mais perto. Resta saber se o Salão de Genebra, face à redução de expositores e aos elevados custos, conseguirá chegar a esse futuro.

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