EUA avisam Índia após fracasso de plano para assassinar activista sikh

Nos últimos dois meses, o Governo indiano foi implicado pelo Canadá e pelos EUA numa campanha para assassinar líderes da comunidade sikh nos seus territórios.

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Em Junho, o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, foi recebido com honras de Estado pelo Presidente dos EUA, Joe Biden Reuters/EVELYN HOCKSTEIN
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As autoridades norte-americanas travaram um plano para o assassínio de um activista sikh no território dos Estados Unidos, uma notícia conhecida dois meses depois de o Canadá ter acusado o Governo da Índia de envolvimento na morte de um outro líder do movimento pela independência do Calistão.

Segundo o jornal Financial Times, a Administração Biden notificou o Governo da Índia sobre a descoberta do plano após a visita do primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, aos EUA, em Junho.

O Washington Post avança que a Casa Branca fez saber às autoridades indianas que os serviços de informação norte-americanos suspeitam de um envolvimento do Governo da Índia.

O alvo do atentado seria Gurpatwant Singh Pannun, identificado como um cidadão com dupla nacionalidade canadiana e norte-americana, e advogado do grupo Sikhs for Justice, com sede nos EUA.

Tal como o activista sikh canadiano Hardeep Singh Nijjar, que foi assassinado no Canadá em Junho, Pannun integra um movimento que reclama a independência do Calistão — uma região na Índia que inclui o estado do Punjab.

Tanto Nijjar como Pannun foram classificados como terroristas na Índia. Na segunda-feira, Pannun foi alvo de uma acusação formal da unidade de antiterrorismo indiana, por ter gravado e partilhado um vídeo, a 4 de Novembro, em que avisava os sikhs para não viajarem em aviões da Air India no dia 19 de Novembro.

Segundo Pannun, a sua mensagem tinha como objectivo apelar a um boicote à Air India, e não ameaçar a vida de passageiros, como afirmam as autoridades indianas.

Num comunicado enviado ao jornal britânico The Guardian, o advogado sikh acusa o Governo indiano de ser responsável por uma campanha de "terrorismo transnacional".

Segundo Pannun, as autoridades norte-americanas terão de lidar com essa "ameaça à soberania dos EUA, à liberdade de expressão e à democracia".

A porta-voz do Conselho de Segurança Nacional dos EUA, Adrienne Watson, disse num comunicado que os indianos "expressaram surpresa e preocupação" com a notificação da Casa Branca e garantiram que vão "investigar o assunto".

Tal como aconteceu aquando da acusação pública feita pelo Governo canadiano, em Setembro, a Índia voltou a dizer, em resposta aos EUA, que a prática de assassínios políticos "não está alinhada com os princípios" das autoridades do país.

Tensão diplomática

O caso surge no auge de um impulso da Administração Biden para se aproximar do Governo de Modi, como parte de uma estratégia para conter a China — a Índia faz parte do Diálogo de Segurança Quadrilateral (o Quad), com os EUA, a Austrália e o Japão; e o primeiro-ministro indiano foi recebido com honras de Estado pelos EUA em Junho, tendo discursado perante o Congresso norte-americano.

A Administração Biden tem sido pressionada por organizações internacionais a ser mais exigente com o Governo indiano em matéria de cumprimentos dos direitos humanos na Índia, e ainda não é claro se o caso noticiado em primeira mão pelo Financial Times irá afectar um contrato de venda de drones, assinado antes da última visita de Modi aos EUA.

Nessa altura, o Ministério da Defesa indiano comprometeu-se a comprar 31 drones MQ-9B SeaGuardian, um negócio com um valor aproximado de três mil milhões de dólares (2700 milhões de euros).

Sobre este assunto, um porta-voz do Departamento de Estado norte-americano, citado pelo Washington Post sob anonimato, disse apenas que o Pentágono "não faz nenhum comentário sobre propostas de vendas ou de transferências antes de o Congresso ser formalmente notificado".

Luta antiga

O movimento a favor da criação de um Estado independente de maioria sikh remonta à partição da Índia, em 1947, na sequência da independência do Reino Unido.

Com a criação de dois Estados soberanos — a Índia e o Paquistão —, a comunidade sikh na região do Punjab reivindicou a criação de um terceiro Estado, designado Calistão.

A luta dos independentistas atingiu um ponto alto na década de 1980, quando o Governo de Indira Gandhi ordenou um ataque do Exército indiano contra o Templo Dourado, em Amritsar — o templo mais sagrado do sikhismo —, que resultou na morte de centenas ou milhares de pessoas.

Poucos meses depois, em Outubro de 1984, Gandhi foi assassinada por dois guarda-costas sikhs, numa retaliação pelo ataque contra o Templo Dourado.

Em 1985, extremistas sikhs colocaram uma bomba a bordo de um avião da Air India num voo entre Montreal, no Canadá, e Londres. O aparelho desintegrou-se sobre o oceano Atlântico, matando as 329 pessoas que seguiam a bordo, incluindo 268 canadianos, 27 britânicos e 24 indianos.

Uma outra bomba, destinada a um avião da Air India que ia sair de um aeroporto de Tóquio, no Japão, explodiu ainda durante o processo de transporte das bagagens e matou dois funcionários.

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