A educação que precisamos

A escola verdadeiramente plural e inclusiva está ainda por concretizar.

Ouça este artigo
00:00
04:00

A promessa de uma educação flexível e diversificada para todos os portugueses aconteceu no final dos anos 80 do século passado. Ao modelo de escola altamente estruturado, sucedem-se, paulatinamente, processos de ensino mais interativos e mais flexíveis. Não há dúvidas. De lá para cá, muito foi feito em prol do acesso à escola para todos e para uma educação integral. Todavia, a escola verdadeiramente plural e inclusiva está ainda por concretizar.

As fragilidades e problemas educacionais são as habituais – absentismo; insucesso escolar; pedagogias diretivas; e métodos passivos. Fatores invariavelmente complexos e repetidos em testemunhos diretos de muitos alunos que temos tido oportunidade de escutar a propósito do que gostariam de encontrar e de aprender na escola.

“Gostava de uma escola com boas condições físicas para nos sentirmos confortáveis e gostava também de andar numa escola em que houvesse mais projetos artísticos, com novas tecnologias e temas do nosso mundo” (AP, 7.º ano, 12 anos). Isto é, “aulas mais práticas e mais dinâmicas, conciliando as matérias com assuntos do dia-a-dia” (ST, 9.º ano, 14 anos), “que nunca ninguém nos explica, que temos que resolver sozinhos, na vida adulta, por exemplo, como funcionam os impostos, como pedir um empréstimo, como pagar o IRS (…), no fundo competências que acabamos por não as adquirir” (MC, 12.º ano, 17 anos) e que “na minha perspetiva, se aprendem no trabalho em grupo, no trabalho autónomo e no debate” (FC, 12.º ano, 18 anos).

A estas tensões juntam-se agora fenómenos sociais emergentes do século XXI — as migrações, os conflitos armados, a representação das minorias e a igualdade de género, o racismo e os problemas de identidade individual e cultural, as transformações climáticas e económicas —, preocupações dominantes para os alunos das nossas escolas e para a educação — tempos, espaços, currículo, docência, aprendizagens e qualidade de vida —, gerando a necessidade (e a oportunidade) para (re)ver o mito da escola que queremos para reavaliarmos decisivamente a escola que precisamos.

Na voz dos alunos avolumam-se as premissas necessárias para a edificação das escolas que todos precisamos para construirmos um mundo melhor. Testemunhos claros e muito corajosos. “Eu gostava que a minha escola tivesse pessoas mais sensíveis às dificuldades das pessoas com deficiência” (ST, 8.º ano, 13 anos). “[Gostava que os professores] fossem capazes de cativar a nossa atenção através de ações de interesse local, que ligassem as aprendizagens ao concreto e até a problemas pessoais” (MC, 11.º ano, 16 anos). Pois, “se há uma coisa que eu mudava na minha escola e que melhorasse a minha aprendizagem era a relação com os professores (…). Se o professor souber dar a aula, de forma que ele [o aluno] ponha os olhos nele, o tempo todo, independentemente do que ele está a dizer, então é muito mais fácil para ele dar a aula (…) há professores que dão as aulas, como se eles próprios não gostassem da matéria, nem da disciplina, nem dos alunos” (AF, 7.º ano, 12 anos).

A educação que precisamos é uma educação ao serviço do desenvolvimento humano, das pessoas na sua pluralidade e de sociedades pacíficas e inclusivas. “Uma escola onde se aprendessem competências humanas, como por exemplo: a falar em público, coisas da política, das finanças, a resolver problemas do nosso dia-a-dia” (AS, 12.º ano, 17 anos).

Precisamos de uma educação que valorize o potencial de cada aluno e desse modo as suas aprendizagens, o sentido criativo e crítico. O papel da escola e da educação é munir cada pessoa, qualquer que seja a sua situação de vida, com saberes, competências e atitudes para aspirar viver uma vida plena e feliz, tal qual prevê, desde 2017, o Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória.

A nossa melhor esperança para edificar um futuro mais saudável e mais sustentável reside em abraçar e aperfeiçoar práticas educacionais plurais, interativas e uma aprendizagem autêntica, ao serviço do pleno desenvolvimento humano, com especial enfoque no modo diferente de ser de cada pessoa.


A autora escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990

Sugerir correcção
Ler 8 comentários