Desflorestação fora do prato está quase. Mas falta “o quase” à União Europeia…

Os dados são perentórios e dizem-nos que as importações agrícolas para a Europa são o segundo maior contribuinte para a desflorestação global, depois da China. É preciso reverter esta situação.

Ouça este artigo
00:00
03:27

19 de abril foi um dia histórico e um ponto de viragem para as florestas do mundo. Pela primeira vez, os comerciantes agrícolas e outras empresas terão de provar que as suas importações de mercadorias de comércio global como a carne bovina, soja, óleo de palma, borracha, cacau, café, couro e madeira estão livres de desflorestação, antes da entrada ou saída do mercado da União Europeia (UE). Isso é uma boa notícia para as florestas e para os consumidores que consistente e continuamente exigiram que governos e empresas mantivessem os produtos que contribuem para a destruição das florestas fora das prateleiras e dos seus carrinhos de supermercado.

Este é um processo que se iniciou a 17 de novembro de 2021, quando a Comissão Europeia (CE) apresentou uma proposta de regulamento, procurando minimizar o contributo da UE para a desflorestação e degradação florestal mundiais, reduzir as emissões de gases com efeitos de estufa associadas à UE, assim como travar a perda de biodiversidade e acabar com as violações aos Direitos Humanos associada à produção de mercadorias.

Após um longo percurso de 17 meses de discussão em diversas comissões, e instituições de decisão da UE, o Parlamento Europeu aprovou, com uma maioria esmagadora, a redação final da nova lei que exigirá que as empresas demonstrem que os seus produtos não contribuíram para a destruição das florestas – isto se quiserem vendê-los no mercado da União Europeia.

Sem sombra de dúvidas, esta é uma grande vitória e um exemplo a ser seguido noutros pontos do planeta. Mas é fundamental lembrar à CE que o trabalho ainda não está concluído. Os próximos passos são decisivos!

A CE precisa avaliar e incluir outros ecossistemas críticos que ainda não estão protegidos, como por exemplo o Cerrado e o Gran Chaco, ecossistemas de grande valor ecológico fortemente ameaçados que não ficaram inicialmente abrangidos neste regulamento. A lei prevê que essa avaliação seja feita até um ano após a entrada em vigor do regulamento.

Os dados são perentórios e dizem-nos que as importações agrícolas para a Europa são o segundo maior contribuinte para a desflorestação global no mundo, depois da China. Segundo um estudo revisto e publicado na prestigiada revista de ciência Science, a expansão da fronteira agrícola é responsável por mais de 90% da desflorestação. É preciso reverter esta situação.

Este instrumento legal, tido como uma solução para reduzir o contributo da UE para a desflorestação, é extremamente popular entre os cidadãos europeus, independentemente do grupo político que apoiam. A sondagem realizada em 2022 mostrou isso mesmo: 9 em cada 10 cidadãos querem produtos livres de desflorestação.

Nunca é demais enfatizar que esta lei teve a maior participação pública na história da UE, com quase 1,2 milhões de cidadãos a pedir à UE para aprovar uma forte regulamentação para interromper a desflorestação importada.

No entanto, a ratificação do Acordo UE-Mercosul pode pôr em causa os objetivos do novo regulamento Europeu, podendo levar à diminuição das florestas mesmo nas áreas que se pretende proteger, como a Amazónia e o Cerrado.

O caminho que nos trouxe até aqui foi longo. O resultado alcançado dá uma perspetiva que o futuro pode ser mais sustentável. Mas ainda falta o “quase”... Como cidadãos, temos a responsabilidade de efetuar o escrutínio para que os Governos e instituições zelem pela implementação eficaz do regulamento para produtos livres de desflorestação, não se esquecendo da proteção dos Direitos Humanos, pequenos produtores e operadores, e de outros ecossistemas, para garantir que a desflorestação fica fora do nosso prato!

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

Sugerir correcção
Comentar