Amnistia Internacional denuncia uso de tecnologia de reconhecimento facial por Israel

Relatório da organização de direitos humanos acusa o Estado hebraico de utilizar esta tecnologia para restringir movimentos de palestinianos mas não para israelitas judeus.

Foto
Checkpoint do exército israelita em Hebron, onde vivem cerca de 800 colonos israelitas sob grande segurança, numa cidade com cerca de 200 mil palestinianos Tanya Habjouqa/NOOR

O Exército israelita está a utilizar tecnologia avançada de reconhecimento facial para vigiar palestinianos, diz a organização de defesa de direitos humanos Amnistia Internacional com base em investigações em Hebron (Cisjordânia) e Jerusalém Oriental.

A organização sublinha que o sistema de câmaras de vigilância chamado Red Wolf está a ser utilizado desde 2022, e faz parte de um programa que se baseia “em bases de dados que consistem quase exclusivamente em dados de indivíduos palestinianos”, o que leva a organização a acusar Israel de “apartheid electrónico”. A informação associada a cada pessoa determina se pode passar por um dado checkpoint ou ter acesso a determinada área.

A presença de câmaras não se restringe aos checkpoints, postos de controlo do Exército israelita que existem nas estradas entre o território de Israel e da Cisjordânia ocupada, mas também entre cidades palestinianas. A Amnistia contabilizou uma a duas câmaras de videovigilância (CCTV) em Jerusalém Oriental, incluindo na Cidade Velha e em Sheikh Jarrah, uma zona em que têm sido ordenadas expulsões de famílias palestinianas, em processos judiciais iniciados por grupos de colonos.

A organização justificou a escolha de Jerusalém Oriental e Hebron por serem as únicas cidades nos territórios palestinianos ocupados com colonatos dentro das suas fronteiras.

O diário The Washington Post relatou, em 2021, que o Exército de Israel estava a criar uma base de vigilância digital de palestinianos residentes em Hebron construída com base numa tecnologia chamada Blue Wolf, que permitia ligar as fotos a bancos de dados.

A Amnistia ouviu um activista em Hebron dizendo que a tecnologia “está nas mãos de todos os soldados nos seus telefones” e que o efeito se nota nas interacções entre palestinianos e soldados. “O soldado faz um scan à nossa cara com a câmara do telefone, e de repente o comportamento em relação a nós muda, porque vêm a informação”, descreveu o activista. Mas não sabe que informação é essa: “Não sabemos a que têm acesso nem o que vão usar contra mim”, disse ainda o activista. “Não há qualquer possibilidade de termos influência neste sistema”, queixou-se ainda.

“As autoridades israelitas estão a usar ferramentas sofisticadas de vigilância para aumentar a segregação e o apartheid electrónico contra os palestinianos”, disse a secretária-geral da Amnistia Internacional, Agnès Callamard. Numa zona de Hebron, “documentámos como um novo sistema de reconhecimento facial chamado Red Wolf está a reforçar restrições draconianas na liberdade de movimento dos palestinianos, usando dados biométricos adquiridos de modo ilegítimo para monitorizar e controlar os movimentos dos palestinianos pela cidade”, disse ainda Callamard.

“Juntando à constante ameaça de força física excessiva e detenção arbitrária, os palestinianos têm agora de lidar com o risco de serem controlados por um algoritmo, ou impedidos de entrar no seu próprio bairro por causa de informação guardada em bases de dados discriminatórias”, declarou a responsável da Amnistia, concluindo que esta prática é incompatível com o respeito de direitos humanos.

A Amnistia Internacional disse que tomou a decisão de não contactar responsáveis israelitas “devido à natureza sensível da pesquisa, risco de fugas, e riscos para a equipa de investigação da Amnistia”. A organização viu uma fuga de informação acontecer no relatório de 2022 em que acusava Israel de ter em prática um sistema de apartheid.

O diário norte-americano The New York Times contactou as Forças de Defesa de Israel (IDF) que responderam que levam a cabo as “operações de segurança e recolha de informação necessárias, fazendo esforços significativos para minimizar o impacto na actividade de rotina na população palestiniana”. O jornal comenta que utilização por governos desta tecnologia para apenas um grupo populacional é raro – destacando o caso da China com postos de controlo para monitorizar os movimentos de uigures e outras minorias étnicas.

A AI disse que não podia dizer com certeza quais as empresas envolvidas na tecnologia Red Wolf, mas que identificou duas empresas, a chinesa Hangzhou Hikvision Digital Technology Co., Ltd e a neerlandesa TKH Security Solutions como estando envolvidas com o sistema de câmaras. Nenhuma das empresas comentou o relatório.

A Amnistia Internacional está a apelar a uma proibição global do desenvolvimento, venda e utilização de tecnologia de reconhecimento facial para vigilância, na campanha “Ban the Scan”.

Sugerir correcção
Ler 3 comentários