Ucrânia promete continuar a defender Bakhmut para esgotar forças russas

A cidade no Donbass que é alvo de uma ofensiva que dura há sete meses não tem valor estratégico, mas ninguém abre mão do seu controlo. Grupo Wagner diz não estar a receber munições de que necessita.

Foto
Militares ucranianos numa zona da linha da frente perto de Bakhmut Reuters/STRINGER

A Ucrânia prometeu continuar a lutar para defender Bakhmut, a cidade que tem estado no foco de uma ofensiva russa há já sete meses e da qual pouco mais resta do que ruínas e cadáveres. Apesar de o seu valor estratégico ser objecto de discussão, para Kiev, o combate por esta área é sobretudo uma forma de esgotar ainda mais as forças opositoras e atrasar o seu progresso no Donbass.

A batalha em torno de Bakhmut, uma cidade que antes da guerra tinha uma população de 70 mil habitantes, iniciada em Agosto, é já a ofensiva mais duradoura da invasão russa da Ucrânia. Depois de um investimento enorme traduzido em perdas de grande envergadura para os dois lados, o peso de Bakhmut inflacionou e ultrapassa os limites do campo de batalha.

Para a Rússia, o preço a pagar para progredir um punhado de quilómetros rumo ao objectivo primordial de controlar a província de Donetsk parece ser o aprofundamento das divergências entre o Exército e o Grupo Wagner. Esta segunda-feira, o chefe da empresa de segurança privada que tem combatido na linha da frente no Donbass, Ievgeni Prigojin, voltou a fazer acusações às chefias das Forças Armadas russas, desta vez exigindo a entrega de munições para os seus homens destacados em Bakhmut.

Numa publicação nas redes sociais, Prigojin mostrou documentos datados de 22 de Fevereiro em que era autorizado o envio de munições para Bakhmut no dia seguinte. No entanto, apenas chegou uma parte das munições que haviam sido prometidas, segundo o líder do grupo de mercenários, sugerindo que as razões para a falta de material para os seus homens podem ser “a burocracia normal ou traição”.

Numa outra publicação, Prigojin avisou que a falta de munições e de recrutas pode ter custos elevados para a ofensiva russa. “Se a Wagner sair de Bakhmut agora, toda a linha da frente irá desmoronar-se”, afirmou o chefe do grupo armado.

Os desentendimentos gerados pela preponderância do Grupo Wagner na chamada “operação militar especial” têm subido de tom. No domingo, o ex-dirigente separatista de Donetsk, Igor Girkin, defendeu a substituição de Prigojin na liderança do Grupo Wagner e acusou-o de ter “ambições políticas multiplicadas por psicopatia, pela organização de crimes de guerra, uma tendência para a autopromoção desavergonhada e largamente falsa e pela difusão de hábitos criminosos junto dos militares”. Na resposta, Prigojin comparou Girkin a um “monte de fezes”, segundo a Al-Jazeera.

Valor simbólico

As autoridades de Kiev reforçaram publicamente o desejo de manter Bakhmut sob controlo. Depois de dias em que persistiram rumores de que as forças ucranianas poderiam estar a estudar uma retirada estratégica, o gabinete do Presidente Volodymyr Zelensky revelou que os generais do alto-comando do Exército são favoráveis à continuidade das operações de defesa na cidade no Leste do país.

Zelensky reuniu-se com o chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, Valerii Zaluzhnii, e com o comandante das forças terrestres, Oleksandr Siirskii, que se mostraram “a favor de continuar a operação defensiva e fortalecer as posições em Bakhmut”, segundo o gabinete presidencial.

Os combates em torno de Bakhmut praticamente não cessaram desde Agosto e estima-se que os dois lados já tenham sofrido dezenas de milhares de baixas em nome de uma localidade de valor estratégico duvidoso. Nesta segunda-feira, o secretário da Defesa norte-americano, Lloyd Austin, disse que a cidade tem “um valor mais simbólico do que valor estratégico ou operacional”.

Com alguns dos combates a centrarem-se sobretudo nas estradas que têm permitido o abastecimento das forças ucranianas que se mantêm na defesa de Bakhmut, em Kiev, parece haver consciência de que a queda da cidade é apenas uma questão de tempo. No entanto, para a Ucrânia, o objectivo é desgastar ao máximo as forças russas num único ponto de uma linha da frente muito longa.

“A tarefa das nossas forças em Bakhmut é infligir ao inimigo o maior número de perdas possível”, explicava na sexta-feira o vice-comandante da Guarda Nacional Ucraniana, Volodymyr Nazarenko, numa entrevista a uma rádio nacional. “Cada metro de terra ucraniana custa centenas de vidas ao inimigo”, acrescentou. Segundo as Forças Armadas ucranianas, a Rússia estava a perder em média 800 soldados por dia nos combates em Bakhmut.

Kiev também joga com a possibilidade de daqui a algumas semanas poderem entrar em acção os tanques pesados enviados no mês passado pelo Ocidente. Centenas de militares ucranianos têm recebido formação para os operar e a convicção dos comandantes é de que possam ter um papel fundamental num possível contra-ataque durante o Verão, à semelhança da operação que, no ano passado, permitiu a recuperação da cidade de Kherson, naquele que foi um dos maiores golpes para as ambições russas.

Sugerir correcção
Ler 6 comentários