Em Lisboa, os alunos faltaram às aulas pelo clima: “É uma luta que cabe a todos”

Cerca de 300 alunos estiveram em greve pelo clima nesta sexta-feira, em Lisboa. À semelhança do que aconteceu no Outono, os jovens prometem ocupar escolas nesta Primavera.

#MVR matilde fieschi - os alunos voltam as ruas por causa da greve climatica estudantil (que acontecera por todo o mundo) - Alameda, Areeiro- 3 de marco de 2023.
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#MVR matilde fieschi - os alunos voltam as ruas por causa da greve climatica estudantil (que acontecera por todo o mundo) - Alameda, Areeiro- 3 de marco de 2023. MATILDE FIESCHI
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#MVR matilde fieschi - os alunos voltam as ruas por causa da greve climatica estudantil (que acontecera por todo o mundo) - Alameda, Areeiro- 3 de marco de 2023. MATILDE FIESCHI
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#MVR matilde fieschi - os alunos voltam as ruas por causa da greve climatica estudantil (que acontecera por todo o mundo) - Alameda, Areeiro- 3 de marco de 2023. MATILDE FIESCHI

Sair à rua e faltar à escola em protesto pelo clima foi o que fizeram centenas de alunos nesta sexta-feira, em Lisboa. “Esta luta cabe a todos porque influencia o futuro de todos”, considerou Dinis Costa, um dos porta-vozes do movimento da Greve Climática Estudantil, enquanto marchava, gritando por mais energias renováveis e pelo fim da dependência de combustíveis fósseis até ao final desta década. Segundo a Polícia de Segurança Pública (PSP), estiveram presentes cerca de 300 pessoas na greve climática desta sexta-feira.

A manifestação da Greve Climática Estudantil em Lisboa começou na Alameda, passou pelo Instituto Superior Técnico, Escola Secundária Filipa de Lencastre, Escola Secundária Rainha D. Leonor e terminou na Escola Secundária Padre António Vieira. Os estudantes entoaram cânticos e exigiram o fim dos combustíveis fósseis até 2030 e energia 100% renovável e acessível até 2025.

A hora marcada não foi cumprida, mas isso não preocupou a organização da Greve Climática Estudantil. “Estas coisas nunca começam a horas”, confessou a estudante Ideal Maia ao PÚBLICO. Às 10h30, multidões de estudantes começaram a surgir em direcção à Alameda, em Lisboa. Primeiro, chegaram as vozes cantantes: “Deixa passar, sou activista e o mundo eu vou mudar.” Depois, ao virar das esquinas, começavam a aparecer núcleos de várias escolas e faculdades com cartazes ao alto. Às 11h, a marcha arrancou. Antes, houve tempo para que os estudantes se reunissem em círculos, vestissem fatos-macaco, pusessem máscaras cirúrgicas e acabassem os últimos cartazes à pressa.

Ideal Maia é também uma das porta-vozes do movimento. Tem 21 anos e é estudante de Física na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, mas não sabe até quando. Diz que ainda não pagou nenhuma propina este ano e vai ter de desistir da faculdade, mas considera-se “sortuda por ainda conseguir ligar o aquecedor”. Garante que, a 26 de Abril, as ocupações de escolas e universidades vão voltar, à semelhança do que aconteceu em Novembro de 2022. “Não ocupamos porque é divertido, mas porque o futuro para o qual a escola nos prepara já não existe”, confessou. “O Governo e as empresas não nos deixam escolha.”

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A greve climática desta sexta-feira MATILDE FIESCHI

Exigir mudança

Desde a sua génese, as greves climáticas estudantis convocadas pelo movimento Fridays for Future dão a volta ao globo e incentivam os estudantes a faltarem às aulas para exigirem acção pelas alterações climáticas – e Portugal não é excepção. Frederica Carrilho tem 16 anos e é aluna da Escola Secundária de Camões (mais conhecida por Liceu Camões). Faltou às aulas, mas tem justificação: “Eles [Liceu Camões] acordaram connosco justificar as faltas se tivessem a garantia de que nós estávamos na manifestação.” Há outras escolas que não concordam com este sistema, mas Frederica garante que não tem razão de queixa. Sente-se “apoiada”.

Nas ruas, euforia era a palavra de ordem: até ao último minuto da manifestação, não houve um único momento de silêncio. De cada vez que paravam em frente a uma escola, os estudantes faziam-se ouvir e incentivavam os colegas que estavam dentro da escola a sair e a seguir a multidão. Diziam para saltarem os muros – e houve quem tentasse, sem sucesso, puxado de volta pelas funcionárias da escola. Os mais novos que assistiam não pareciam entender bem o que se passava, mas mostravam fascínio pelo rapaz vestido de “capitalista”, com um chapéu que o identificava como “REN, Galp, EDP”. E o “capitalista” devolvia o entusiasmo, brincava com eles e fazia-os rir. Mas não conseguia levá-los para a manifestação.

Nas janelas das ruas por onde iam passando, algumas pessoas apoiavam os manifestantes: mostravam o punho em riste, em solidariedade com a luta dos estudantes – e isso agradava-os. O que querem Ideal Maia e todos os que a ela se juntam é “mobilizar a sociedade para pôr o fim aos fósseis e pela democracia energética”. Também Dinis Costa espera que mais pessoas se juntem “para uma acção” que acontecerá depois das ocupações da Primavera, numa tentativa de bloquear a “entrada principal” de gás fóssil em Portugal: o terminal de gás natural liquefeito do porto de Sines, gerido pela REN.

Sentados na estrada em frente à REN, na Avenida Estados Unidos da América, os alunos protestaram, discursaram e apelaram para que mais pessoas se juntassem a esta acção da plataforma "Parar o Gás", marcada para 13 de Maio.

Estudantes não se sentem ouvidos

Na greve, alguns representantes de partidos apareceram para dar apoio ao movimento estudantil. Isabel Carmo, do PAN, sublinhou que o partido está do lado da “luta contra as alterações climáticas” e criticou que a Lei de Bases do Clima foi lançada há um ano e “continua por regulamentar”, apesar de ter “normas que são necessárias e urgentes”.

Do lado do Bloco de Esquerda, Pedro Filipe Soares diz que estes jovens “são os adultos na sala”. “Eles exigem o que todos nós deveríamos exigir, mas infelizmente os poderes políticos não os querem escutar.” Deixou ainda críticas ao Governo, que, avisa, “tem permitido a esses grandes grupos económicos todas as benesses neste contexto” e considera que têm faltado “políticas mais arrojadas”.

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Os alunos querem voltar a dormir nas escolas e a faltar às aulas em Abril, em protesto pelo clima MATILDE FIESCHI

A popularidade do Governo entre os estudantes era quase nula – “não nos ouve”, “é ineficaz”, “é inerte” –, mas, ainda assim, um pequeno núcleo da Juventude Socialista (JS) seguia entre eles. Miguel Partidário, um dos “jotas”, considera que “o Governo tem feito um esforço para acompanhar as reivindicações dos activistas pelo clima”. Ideal não podia concordar menos, mas não é só pelo Governo que não se sente ouvida: “A faculdade, tal como os governos, não ouviu as nossas reivindicações.” Falava das ocupações às escolas feitas em Novembro e dos pedidos que fizeram na altura. Desta vez, querem que haja mais acções e que sejam mais impactantes para não poderem ser “ignoradas”.

Não só de jovens se fez a manifestação. Os professores presentes reencaminhavam toda e qualquer pergunta para os estudantes porque “esta é a luta deles”. Sara Figueiredo Costa, da Frente Grisalha pelo Clima, concorda: “Esta geração mais nova tem uma noção um bocadinho mais aguda [dos efeitos da crise climática] porque de certeza que eles ainda vão cá estar quando isso acontecer.” A resistência e desobediência civil parecem-lhe soluções claras quando o assunto toca a “sobrevivência”.

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O movimento da greve climática foi inspirado nas faltas às aulas da activista sueca Greta Thunberg MATILDE FIESCHI

A última escola do percurso, a Escola Secundária Padre António Vieira, estava fechada quando a marcha lá chegou. “Os professores também estão em luta”, lembrou Ideal, solidária com as manifestações dos professores. E ouviram-se aplausos e gritos, que dispersaram assim que acabou a manifestação. O burburinho, esse, manteve-se. Depois, cerca de 50 manifestantes foram até ao Parque José Gomes Ferreira, onde se encontraram para debater ideias de como continuar a luta pelo clima nas ocupações desta Primavera.

Em Novembro de 2022, seis escolas e faculdades em Lisboa foram ocupadas por alunos, que exigiam o fim da exploração de combustíveis fósseis até 2030 e a demissão do ministro da Economia e do Mar, António Costa e Silva. As datas das ocupações coincidiram com a Conferência das Nações Unidas par as Alterações Climáticas (COP27), no Egipto. Na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, quatro estudantes e activistas foram detidos.

Texto editado por Claudia Carvalho Silva

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