Jornais americanos cancelam Dilbert devido a comentários racistas do autor

No YouTube, Scott Adams classificou a população negra americana como “grupo de ódio”, afirmando não querer “ter nada a ver com eles”. Jornais como o The Washington Post deixaram de publicar o cartoon.

SAN FRANCISCO, CA-AUGUST28:  Scott Adams, famed creator of the comic strip DILBERT stands within "Dilbert's Ultimate Cubicle" which offers practical and humorous concepts for the future workplace office, Tuesday, August 28, 2001 in San Francisco, California. The cubicle- which includes a hammock, aquarium, rotating floor modules, shoe polisher and a self-timing guest seat- was designed by IDEO, a world leader of innovation and design and was created in response to the thousands of e-mails Adams has received from disgruntled workers across the country. (Photo by Bob Riha, Jr./Getty Images)
Fotogaleria
Scott Adams, criador de Dilbert Bob Riha Jr/getty images
cultura,extremadireita,racismo,eua,culturaipsilon,imprensa-,
Fotogaleria
Dilbert começou a ser publicada em 1989, como uma sátira da América corporativa, das administrações das empresas e de todo ecossistema competitivo nos locais de trabalho

A célebre, mas cada vez mais em queda livre, tira de cartoon Dilbert foi retirada de vários jornais americanos devido a comentários racistas proferidos pelo seu criador, Scott Adams. No seu canal de YouTube, na última quarta-feira, o cartoonista classificou a população negra americana como “um grupo de ódio” e apelou aos brancos para “desaparecerem da vista dos negros".

“Eu não quero ter nada a ver com eles. E, tendo em conta como as coisas estão, o melhor conselho que eu posso dar aos brancos é desaparecerem da vista dos negros, porque não há como consertar isto”, disse Adams. Foi assim que o cartoonista de 65 anos reagiu a uma votação divulgada pela Rasmussen Reports, segundo a qual 26% dos participantes negros não concordava com a expressão “é ok ser branco” (contra 21% que diziam "não ter a certeza"), uma frase popularizada em 2017 pelos trolls de extrema-direita americanos, recorrente no fórum online 4chan, conhecido como um viveiro do ódio e da violência racistas.

Scott Adams culpou ainda os negros por “não se focarem na educação” e afirmou estar “muito farto de ver vídeos de negros americanos a espancar cidadãos não negros”, naquilo que pode ser visto como uma piada de mau gosto sobre os vídeos que mostram precisamente a situação inversa, ou seja, brancos a agredirem negros.

No dia seguinte ao programa, multiplicaram-se os apelos nas redes sociais para se cancelar Dilbert na imprensa americana. Na sexta-feira, o jornal e empresa de media USA Today, detentora de mais de 300 publicações nos EUA, garantiu que iam deixar de publicar a tira de cartoon. Seguiu-se, no sábado, a mesma declaração por parte do The Washington Post.

“A MLive tem uma política de tolerância zero para com o racismo”, escreveu, por sua vez, um dos responsáveis do grupo MLive, que tem sob a sua alçada oito publicações com sede no Michigan. “Não vamos, certamente, gastar o nosso dinheiro com apoiantes [do racismo]." Sobre o caso, o Los Angeles Times, que nos últimos meses retirou por quatro vezes o cartoon das suas páginas por “violar os princípios” do jornal, publicou uma declaração a condenar os comentários “ofensivos” de Adams.

Cancelado

Dilbert começou a ser publicada em 1989, como uma sátira da América corporativa, das administrações das empresas e de todo ecossistema competitivo nos locais de trabalho, tendo como protagonista o engenheiro Dilbert. Celebrado e premiado no passado, o trabalho de Adams tem vindo a perder seguidores. A imagem pública do cartoonista está em declínio, com o próprio a fazer por isso. Desde a sua declaração de apoio a Donald Trump, durante a campanha presidencial de 2016, que Adams “se tem alinhado com pontos de vista cada vez mais extremistas”, escreve o The Washington Post.

Em 2020, argumentou que o programa de televisão Dilbert fora cancelado por ele ser branco, afirmando que era a terceira vez que perdia um trabalho por esse motivo. No ano passado, introduziu no cartoon a sua primeira personagem negra, intitulada Dave, o Engenheiro Negro, que usou para gozar com as políticas de diversidade nos locais de trabalho e com as pessoas transgénero. Pela mesma altura, fez um tweet a dizer que ia passar a identificar-se como uma mulher negra.

Sobre os seus comentários no YouTube, disse esperar “ser cancelado”. “A maior fatia do meu salário vai à vida na próxima semana”, afirmou. “A minha reputação vai ficar para sempre destruída.” Contactado pelo The Washington Post para prestar declarações mais pormenorizadas, Scott Adams enviou uma mensagem por escrito a dizer que “muita gente está zangada”, mas que ainda não viu “desacordo”, pelo menos “por parte das pessoas que levaram em conta o contexto”. “Houve quem tenha questionado os resultados da votação. Isso é justo.”

Sugerir correcção
Ler 6 comentários