Rússia pede investigação internacional a explosões nos gasodutos Nord Stream

Porta-voz do Kremlin e presidente da câmara baixa do Parlamento russo apontam para um artigo publicado pelo jornalista norte-americano Seymour Hersh, que culpa a Casa Branca pelas explosões.

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Segundo o jornalista norte-americano, mergulhadores dos EUA colocaram explosivos nos gasodutos Reuters/DANISH DEFENCE COMMAND

O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, pediu a abertura de uma investigação internacional às explosões que danificaram os gasodutos Nord Stream 1 e Nord Stream 2 em Setembro de 2022, com base num artigo do jornalista norte-americano Seymour Hersh, publicado na quarta-feira. Segundo Hersh, as explosões foram um acto de sabotagem ordenado pelo Presidente dos EUA, Joe Biden, e executado por operacionais norte-americanos e noruegueses — uma acusação que a Casa Branca classifica como “um produto de ficção”.

Num artigo publicado na plataforma online Substack, Seymour Hersh diz que os dois pares de gasodutos que faziam chegar gás natural russo à Alemanha foram alvo de uma operação de sabotagem planeada pela CIA sob as ordens da Casa Branca, a partir de Dezembro de 2021, quando os EUA constataram que a invasão da Ucrânia pelo Exército da Rússia era inevitável. Toda a informação contida no artigo de Hersh tem como base, segundo o jornalista, “uma fonte com conhecimento directo do planeamento operacional”.

Nesta quinta-feira, Peskov e o presidente da câmara baixa do Parlamento russo, Viacheslav Volodin, disseram que o caso deve ser investigado “de forma transparente”, com o porta-voz do Kremlin a afirmar que seria “injusto” ignorar o artigo do jornalista norte-americano. “O mundo tem de saber quem cometeu este acto de sabotagem”, disse Peskov, citado pela agência Reuters. “É um precedente muito perigoso: se alguém fez isto uma vez, pode fazê-lo novamente.”

No artigo publicado na quarta-feira, Hersh afirma que um grupo de mergulhadores norte-americanos de alta profundidade colocaram explosivos C4 nos gasodutos, em Junho de 2022, a coberto do exercício militar Baltops22, que decorre todos os anos no mar Báltico. Segundo o jornalista norte-americano, as cargas explosivas foram accionadas a 26 de Setembro de 2022, através de um sonar largado por um avião P8 da Marinha da Noruega.

Do Pulitzer ao isolamento

Hersh, um veterano jornalista de 85 anos, foi distinguido em 1970 com um Prémio Pulitzer por ter revelado o massacre de My Lai — a morte de centenas de civis do Vietname do Sul, a 16 de Março de 1968, por tropas dos EUA. E, em 2004, foi ele quem revelou os casos de tortura na prisão de Abu Ghraib, no Iraque.

A credibilidade de Hersh no jornalismo de investigação norte-americano começou a ser posta em causa em meados da década passada nos meios jornalísticos do país. Em 2015, Hersh publicou um artigo intitulado O assassínio de Osama bin Laden na revista London Review of Books, a pôr em causa a versão oficial da Administração Obama sobre a operação de que resultou a morte do antigo líder da rede terrorista Al-Qaeda, em 2011.

Na altura, Hersh foi criticado por outros jornalistas e colunistas (Peter Bergen, da CNN; Erik Wemple, do Washington Post; James Kirchic; Gabriel Sherman, da New Yorker; e Max Fisher — que chamou à peça sobre Bin Laden “uma teoria da conspiração”) por ter escrito o artigo com base numa única fonte anónima — o que também aconteceu agora, no caso das explosões nos gasodutos Nord Stream 1 e Nord Stream 2.

“O problema de Hersh é que ele não mostra nenhum cepticismo em relação à sua fonte, o que é irónico porque não esconde o cinismo sobre as declarações do aparelho de segurança nacional norte-americano”, disse Kirchic no site Slate, em 2015. “Tal como os diplomatas que se tornam ‘nativos’, e que gradualmente começam a simpatizar com o Governo ou com uma facção do país para onde foram enviados, perdendo de vista os interesses do seu próprio país, Hersh adoptou há muito as posições dos adversários da América e dos seus críticos mais duros.”

Em 2013, Hersh publicou um outro artigo — também na revista London Review of Books — a negar o uso de armas químicas pelo regime de Bashar al-Assad na guerra na Síria. A publicação do artigo tinha sido recusada pela revista New Yorker e pelo jornal Washington Post.

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