Oposição pede demissão do Presidente tunisino depois de enorme abstenção nas eleições

A participação nas eleições legislativas foi inferior a 9% pondo em causa a legitimidade de Kais Saied.

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Menos de 9% dos eleitores votaram nas legislativas tunisinas ZOUBEIR SOUISSI / Reuters

A baixa participação dos tunisinos nas eleições legislativas de sábado levou a oposição, que boicotou a votação, a exigir a demissão do Presidente Kais Saied.

Apenas 8,8% dos mais de nove milhões de eleitores votaram nas eleições de sábado, anunciou a comissão eleitoral. Já se esperava uma participação reduzida numas eleições vistas sobretudo como mais um passo para a consolidação do poder de Saied, acusado de reverter o processo de democratização iniciado com a Primavera Árabe de 2011.

O líder da Frente de Salvação Nacional, Ahmed Chebbi, disse que as eleições legislativas se revelaram um “fiasco” e exigiu a demissão de Saied. “A partir deste momento, consideramos Saied um Presidente ilegítimo”, declarou o político, citado pela Reuters, deixando apelos para que a população organize manifestações para exigir novas eleições presidenciais.

A baixa participação nas eleições legislativas – as primeiras desde que Saied iniciou o processo de concentração de poderes – põem em causa a legitimidade do Presidente. “Depois de 90% dos tunisinos se terem abstido, não há dúvidas de que o projecto de Saied foi largamente rejeitado”, disse à Reuters o analista do Instituto Tunis para a Democracia, Ahmed Idriss. “A partir de agora as opções são limitadas para um Presidente que já não se pode gabar constantemente de ter legitimidade como o fazia”, acrescentou.

Em Julho do ano passado, Saied anunciou a suspensão do Parlamento e passou a governar por decreto. Desde então, conseguiu aprovar uma reforma constitucional que reforçou os poderes presidenciais e deixou o Parlamento praticamente com funções decorativas – deixou de poder nomear o chefe do Governo, por exemplo. A organização não-governamental But I Watch disse que o Parlamento ficou “esvaziado de todos os seus poderes”.

Saied, que ainda não reagiu à divulgação da taxa de participação nas eleições, rejeita as críticas de que esteja a comprometer os avanços democráticos da última década. As medidas que tomou, dizem os seus apoiantes, foram fundamentais para superar a paralisia institucional no Parlamento, combater a corrupção e fazer crescer a economia.

Se inicialmente houve algum apoio popular às iniciativas de Saied, a enorme abstenção nas eleições deste sábado evidencia a apatia generalizada dos tunisinos. Em 2014, por exemplo, mais de 70% dos eleitores votaram nas eleições legislativas.

No início do mês, a UGTT, a mais poderosa central sindical do país, criticou a realização das eleições, considerando-as inúteis, e deixou em cima da mesa a possibilidade de convocar uma greve geral.

O presidente da comissão eleitoral, Farouk Bouasker, disse que a taxa de participação foi “modesta, mas não vergonhosa”, justificando a ausência de grande parte do eleitorado com as mudanças no sistema eleitoral e o fim do financiamento de campanhas eleitorais.

Sem a presença dos principais partidos que estavam representados no Parlamento que foi suspenso em 2021, os candidatos eram praticamente desconhecidos e apenas 12% eram mulheres, comprometendo seriamente os objectivos de paridade de género. Para dez dos 161 lugares a votos havia apenas um candidato e sete dos assentos escolhidos pela diáspora não tinham qualquer opção.

A deposição do ditador Ben Ali em 2011, ao fim de 23 anos no poder, foi saudada como o início da chamada Primavera Árabe. A aprovação de uma nova Constituição e a garantia de eleições livres fizeram a Tunísia ser visto como o modelo mais bem-sucedido de democratização entre os países que integraram a Primavera Árabe. No entanto, a instabilidade política e a acelerada degradação económica permitiram que muitos desses progressos fossem postos em causa por Saied.

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