Vendedores de ilusões

Quando é que de uma vez por todas se discute e se decide o modelo de crescimento económico que queremos para Portugal, para por exemplo os próximos vinte anos?

Na semana passada, a Comissão Europeia publicou uma recente análise à previsão da dívida pública portuguesa para os próximos dez anos. A Comissão estima que em 2033 a dívida ainda esteja nos 95,4% do PIB, ou seja, muito longe dos 60% pretendidos pelo Pacto e Estabilidade e Crescimento, que em face das novas realidades económicas mundiais, talvez se encontre desatualizado, mas isso são "contas de outro rosário”.

Apesar de, previsionalmente estarmos a caminho da redução relativa da dívida pública, daqui a 10 anos ainda teremos uma elevada dívida relativa e absoluta. Caso existam saldos primários mais reduzidos, ou as condições económicas se agravem para além do previsto, a dívida facilmente ultrapassaria os 100% do PIB, que neste caso é uma importante barreira psicológica para os mercados.

Daqui facilmente se depreende que os objetivos para reduzir a dívida pública, para valores abaixo dos 60% do PIB nos próximos 15 anos, não vão ser cumpridos. Independentemente da Comissão vir a flexibilizar estas metas, daqui ressaltam duas conclusões preocupantes para Portugal: as amortizações absolutas da dívida vão ser reduzidas, e estamos condenados a crescimentos económicos em termos reais baixos na próxima década. Se nada for feito, nas décadas seguintes continuaremos neste marasmo, até que de uma vez por todas seremos ultrapassados pelos poucos países da Europa que ainda estão piores que nós.

Quando é que de uma vez por todas se discute e se decide o modelo de crescimento económico que queremos para Portugal, para por exemplo os próximos vinte anos? Onde nos queremos posicionar nesse espaço temporal?

Não temos falta de pessoas capazes de traçar objetivos e de planear iniciativas, o que temos são decisores que não querem tomar decisões difíceis e impopulares, como sejam cortar na despesa pública, tornar a máquina burocrática eficiente, criar condições para atrair investimento nacional e estrangeiro, que incentive as exportações de alto valor acrescentado e não esperar que seja sempre o consumo a puxar pela economia.

Os políticos portugueses só pensam no curto prazo e as reformas estruturais da economia nunca são feitas e muitas vezes, negoceia-se o poder em troca de concessões. No decurso da troika tivemos mais uma oportunidade perdida, mas como sempre os interesses do país ficaram para segundo plano, pois o que interessa é agradar ao eleitorado, que compra ilusões pelo preço de um voto.

Vendedores de ilusões sempre existiram e sempre existirão. Cabe aos portugueses saber encontrar o seu caminho e não ceder ao que é mais fácil. Contudo, parece ser um desígnio nacional o esquecimento de que um vendedor de ilusões nunca fala verdade. A ilusão não se pode revelar, porque deixaria isso mesmo, de ser uma ilusão. Enquanto todos quiserem acreditar no Pai Natal e no coelhinho da Páscoa, o país vai sendo empurrado com a barriga, década atrás de década.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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