Autoeuropa oferece 400 euros contra inflação, trabalhadores rejeitam e exigem aumento

Fábrica da Volkswagen propõe “prémio” em Novembro. Trabalhadores dizem que 2022 será um bom ano de produção e querem aumento extraordinário de 5%. Paz social conseguida em Março pode estar em risco.

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A Volkswagen Autoeuropa propõe um pagamento único de 400 euros em Novembro para os cerca de 5100 trabalhadores EPA/MARIO CRUZ (arquivo)

A administração da Volkswagen Autoeuropa, em Palmela, quer dar um “prémio” de 400 euros para “atenuar os efeitos da inflação”, recusando assim o aumento extraordinário na ordem dos 5% pedido pelos trabalhadores. Trata-se de um novo braço-de-ferro que pode ameaçar a paz social conseguida em Março passado, e que surge numa altura em que a fábrica se “despede” do modelo Sharan, cuja produção cessa neste mês de Outubro, ao fim de 27 anos de construção exclusiva em Portugal.

Para a Comissão de Trabalhadores (CT), que representa cerca de 5100 funcionários, a decisão de um pagamento único em vez de um aumento extraordinário é “inaceitável”. Em Março, os trabalhadores anuíram a aumentos de 2%, com uma subida mínima de 30 euros, quando aprovaram em referendo o acordo laboral de 2022/2023. Porém, como diz Rogério Nogueira, coordenador da CT, a conjuntura “alterou-se drasticamente” desde então.

“Em Março havia uma previsão para a inflação que não se cumpriu e os trabalhadores estão confrontados com uma enorme perda do poder de compra. Havia também uma previsão dramática em termos de produção na fábrica, de apenas 200 mil carros produzidos em Palmela devido à crise dos semicondutores, mas agora já estamos a apontar para uma produção muito acima, de 230 mil unidades este ano”, frisa o mesmo porta-voz dos trabalhadores, em declarações ao PÚBLICO.

A 21 de Outubro, o mesmo órgão comunicou à fábrica que, no actual cenário, tinha proposto nesse dia à administração um aumento salarial extraordinário de 5%, a pagar em Dezembro, com retroactivos a Julho deste ano. Além disso, exigia uma revisão do aumento previsto para 2023, que é também de 2%, como ficou estipulado no acordo laboral fechado em Março, acertando-se esse aumento pelo valor da inflação final de 2022, menos o aumento extraordinário.

Ou seja, se a inflação de 2022 for de 8%, por exemplo, o aumento salarial de 2023 na Autoeuropa passaria a ser de 3% em vez de 2% (8% de inflação menos 5% de aumento extraordinário dá 3%, ou seja, os 2% já previstos mais 1% de correcção)

Na sexta-feira, 28 de Outubro, a empresa deu a sua resposta: em vez de aumentos, oferece um pagamento único de 400 euros, a realizar em Novembro, para todos os funcionários por igual. Uma solução que a CT recusa e que pode colocar em causa a paz social na fábrica, alerta o seu coordenador.

Será possível uma paralisação, uma greve, de protesto? “Todos os cenários são possíveis e estão em aberto, mas a CT está a trabalhar para manter a paz social. Agora, é preciso que a empresa faça também a sua parte”, responde o coordenador da CT.

“A empresa tem condições para fazer um aumento extraordinário pelo menos em Dezembro. Vamos ultrapassar as expectativas da produção. Ninguém entende que, quando estamos a bater recordes de vendas e somos das melhores fábricas do grupo, os trabalhadores corram o risco de serem prejudicados e duramente atingidos por uma conjuntura que é muito diferente da que existia em Março quando negociamos o acordo. A paz social consegue-se com a colaboração dos dois lados, é preciso um compromisso dos dois lados. Pela nossa parte, pelo lado dos trabalhadores, estamos a fazer a nossa parte. Do lado da empresa ainda haverá muito a fazer”, argumenta o mesmo representante.

Na Alemanha, onde está a sede do grupo Volkswagen, decorrem actualmente negociações em torno de um novo acordo laboral.

No comunicado distribuído ontem aos funcionários em Portugal, a CT diz que “não aceita que, numa empresa que se prepara para atingir um dos seus melhores anos em volume de produção se apresente uma solução completamente descabida” face ao que “deveria ser a responsabilidade social para com os seus trabalhadores”.

A proposta de um pagamento único de 400 euros mostra, segundo a CT, “uma total falta de respeito e consideração por quem realmente contribui para os grandes resultados que a Autoeuropa tem atingido”. Para os trabalhadores, a paz social pode vir a ser “perturbada” pela “intransigência” da equipa de gestão em Palmela.

Na agenda não há reuniões com a administração, mas já há plenários de trabalhadores, nos dias 8 e 9 de Novembro, bem como reuniões com sindicatos.

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