Coligação de cineastas em risco pede fim da violência no Irão

Organização internacional faz eco da carta aberta do cinema francês em apoio aos colegas detidos e reprimidos, e exige uma mudança no regime.

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Um protesto na Turquia, próximo do consulado iraniano, na terça-feira Reuters/MURAD SEZER

A International Coalition for Filmmakers at Risk (ICFR), organização que representa e defende os direitos de cineastas em risco, declarou na terça-feira a sua “sentida e total solidariedade com todos os que defendem os seus direitos humanos básicos e a liberdade de expressão no Irão”, juntando-se à vaga transversal de protestos desencadeada pela morte da jovem Mahsa Amini. A coligação tem como embaixadores Jafar Panahi, cineasta iraniano que se encontra actualmente preso, e a actriz britânica Helen Mirren.

“Esta é uma revolução desencadeada por mulheres e que une todos os segmentos étnicos, religiosos e sociais da população”, diz a coligação num comunicado sobre as manifestações e os protestos em curso, com resultados mortais para os contestatários, que se sucedem no Irão desde que a “polícia da moralidade” deteve a rapariga de 22 anos por usar o chamado “mau hijab” — um lenço islâmico que cobre os cabelos, mas colocado de forma mais solta.

As manifestações têm sido marcadas, como relatava o PÚBLICO na semana passada, por “cenas inacreditáveis, com mulheres a defenderem jovens dos bastões da polícia e muitos jovens iranianos a enfrentarem as forças de segurança da República Islâmica (e a fazê-las recuar), ao som do riso e do ulular de iranianas que celebram a ousadia” — uma contestação ao regime de Teerão. Há muitos, muitos jovens entre os manifestantes e em todo o mundo muitas mulheres têm cortado madeixas do seu cabelo em solidariedade com as iranianas.

O mediático cinema iraniano já havia sido (de novo) alvo de repressão, quando algumas das suas figuras com mais visibilidade internacional se juntaram às vozes que criticavam a violência policial em manifestações prévias ao caso Mahsa Amini, levando à detenção de Jafar Panahi, Mohammad Rasoulof e Mostafa Aleahmad. Estes últimos pronunciaram-se nas redes sociais contra a actuação da polícia em várias acções de protesto na sequência do desmoronamento de um edifício que causou a morte a pelo menos 41 pessoas, em Maio, e acabaram detidos. Panahi deslocou-se até à procuradoria de Teerão para saber da situação dos seus colegas e ficou igualmente detido. As autoridades executaram então uma pena que pendia previamente sobre o cineasta por “propaganda contra o sistema”.

Agora, a International Coalition for Filmmakers at Risk vem sublinhar que a “revolução” em curso se faz em prol de “uma vida plena e válida, libertada do domínio de autocratas cheios de ódio que usam todas as ferramentas para a pressão, a opressão e a atrocidade”, dando como exemplo a detenção e as execuções que “suprimem o povo iraniano” e “os seus sonhos de uma vida decente”.

A organização pede às autoridades iranianas que “cessem imediata e incondicionalmente o uso de quaisquer formas de força e violência, que libertem todos os detidos durante os protestos e que permitam ao povo do Irão escolher a sociedade em que deseja viver”. E estende o repto: “Encorajamos todas as instituições do cinema e da cultura de todo o mundo a fazerem o mesmo.”

Além das manifestações, que acompanham uma vaga internacional de cortes de cabelo e o lançamento de música produzida sob o signo do protesto, também as greves começaram esta semana a afectar o regime iraniano, com paralisações tanto na indústria petrolífera quanto na petroquímica. No domingo, a organização Iran Human Rights confirmou a existência de 185 mortos, incluindo “pelo menos 19 crianças”, desde o funeral de Amini, a 17 de Setembro.

O desejo de mudança em algumas faixas da sociedade iraniana tem sido um caminho longo e tortuoso. Nem com as Primaveras Árabes a democratização do Irão conseguiu avançar, contando-se já mais de uma década de protestos pedindo avanços que têm paradoxalmente levado a mais recuos e repressão por parte da República Islâmica e do seu Guia Supremo, o ayatollah Ali Khamenei.

A revista Hollywood Reporter lembra que mais de mil profissionais do cinema francês assinaram na semana passada uma carta aberta classificando a morte de Amini como “homicídio” e apoiando os manifestantes. Entre os signatários estão actrizes como Isabelle Huppert e Léa Seydoux e o delegado-geral do Festival de Cannes, Thierry Fremaux.

A ICFR foi fundada pelo Festival Internacional de Documentário de Amesterdão, pelo Festival de Roterdão e pela Academia de Cinema Europeia.

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