Já à espera de um teste nuclear, Tóquio, Seul e Washington discutem resposta ao disparo norte-coreano sobre o Japão

Míssil de Pyongyang que sobrevoou território japonês, o primeiro desde 2017, parece ser uma escalada desesperada para chamar a atenção de Tóquio e de Washington. Regime de Pyongyang estará a preparar ensaio nuclear.

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Aviso sobre a interrupção dos comboios na estação de Sapporo, em Hokkaido, a segunda maior ilha do Japão Reuters/KYODO

“A Coreia do Norte parece ter lançado um míssil. Por favor, abriguem-se em edifícios ou subterrâneos.” A população do Norte do Japão acordou esta terça-feira ao som de sirenes e de mensagens de texto com estas palavras. As emissões televisivas foram interrompidas e os comboios suspensos. Este foi o primeiro míssil a sobrevoar o Japão em cinco anos, num acto descrito pelo primeiro-ministro japonês, Fumio Kishida, como “bárbaro” e “escandaloso”. Seguiram-se condenações e promessas de uma resposta “robusta” por parte do Japão, Coreia do Sul e Estados Unidos, mas os analistas não esperam mais do que uma “resposta retórica”.

Este é o sexto lançamento de mísseis feito pelo regime de Kim Jong-un em apenas dez dias (e o número 23 deste ano, entre mísseis de cruzeiro e balísticos) e a escalada, assim como a informação recolhida pelos serviços secretos de vários países, fazem antecipar um possível ensaio nuclear. Responsáveis da Coreia do Sul sugerem que o teste nuclear pode acontecer depois do fim do Congresso do Partido Comunista Chinês, este mês, e antes das eleições intercalares nos Estados Unidos, em Novembro.

“A diplomacia não está morta, mas as negociações também não estão prestes a recomeçar”, disse à Reuters Leif-Eric Easley, considerando que o último lançamento representa uma “intensificação significativa” nas provocações mais recentes. “Pyongyang ainda está a meio de um ciclo de provocação e de testes e deverá esperar por depois do Congresso do Partido Comunista, a meio de Outubro, na China, para conduzir um teste ainda mais significativo”, reforçou o professor da Universidade Ewha de Seul.

O regime, explicou Easley, está “a desenvolver armas como ogivas tácticas nucleares e mísseis balísticos para serem lançados por submarinos, como parte de uma estratégia de longo prazo para suplantar a Coreia do Sul na corrida às armas e causar conflitos entre os aliados dos EUA”.

A sucessão de acontecimentos parece repetir-se com precisão. A semana passada, em resposta à “ameaça crescente” do Norte, Japão, Estados Unidos e Coreia do Sul realizaram exercícios navais conjuntos pela primeira vez desde 2017. Após esses exercícios, a Coreia do Norte disparou dois mísseis sobre o Japão – uma semana depois, seguiu-se um teste nuclear.

Os seis testes nucleares efectuados pela Coreia do Norte aconteceram entre 2006 e 2017. No final de Julho, Kim garantiu estar preparado para “mobilizar toda a sua força” e “capacidade de dissuasão nuclear”.

O regime norte-coreano está proibido pela ONU de testar armas nucleares ou balísticas. E seja qual for o país, lançar mísseis contra ou sobre outros países sem consultas ou aviso prévio viola as normas internacionais e é algo que a maioria das nações evita por isso pode ser confundido facilmente com um ataque, nota a BBC.

Aos 20 minutos de pânico provocados pelo míssil que voou uma distância de quase 4500 quilómetros, a uma altitude de 970 quilómetros, antes de cair no mar, seguiram-se conversas entre o conselheiro de Segurança Nacional da Administração de Joe Biden, e os seus homólogos sul-coreano e japonês. “Nos dois telefonemas, os conselheiros discutiram respostas internacionais conjuntas apropriadas e robustas”, informou a Casa Branca. Jack Sullivan reforçou ainda “os firmes compromissos dos Estados Unidos com a defesa do Japão e da Coreia do Sul”, lê-se numa declaração.

Condenando “com firmeza” uma “agressão injustificada”, o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, considerou que este disparo é “uma tentativa deliberada” para pôr em risco a segurança na região”.

Opções limitadas

Lembrando que os testes regulares de mísseis são parte do plano da Coreia do Norte para afirmar as suas forças nucleares, Ankit Panda, do Programa de Política Nuclear do think tank Carnegie Endowment for International Peace, admite que os EUA, a Coreia do Sul e o Japão vejam este lançamento como uma forma de Pyongyang “mostrar a sua capacidade de atacar com armas nucleares alvos que incluem o território norte-americano de Guam”.

“Uma crise destas ocorreria no contexto de uma capacidade nuclear norte-coreana significativamente mais avançada, o que limitaria bastante as opções que os EUA e a Coreia do Sul teriam, potencialmente, para retaliar ou gerir uma escalada com a Coreia do Norte”, disse o analista, ouvido pela CNN.

“Continuamos a falar de uma resposta dura – foi isso que o Presidente sul-coreano disse esta manhã – mas não é claro para mim que resposta poderia ser essa sem nos colocar a um passo da guerra”, afirmou à Al-Jazeera Robert Kelly, especialista em relações internacionais no Nordeste da Ásia na Universidade Nacional de Busan, na Coreia do Sul. “A resposta será quase de certeza retórica.”

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