ANMP aprova acordo de descentralização de competências com o Governo

Depois de uma longa ronda de negociações, marcada por muitas cedências por parte do Governo, a associação nacional de municípios aprova a transferência de competências da administração central para as autarquias. Rui Moreira comenta o descho dizendo que “até foi bom o Porto estar fora da ANMP”.

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A ministra Ana Abrunhosa tem a tutela da descentralização Sergio Azenha

O acordo de compromisso entre o Governo e a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) no âmbito do processo de descentralização de competências da administração central para o poder local ao nível da educação e da saúde foi aprovado esta segunda-feira em reunião do conselho directivo da ANMP, depois de um longo caminho de negociações.

O PÚBLICO apurou que o acordo foi aprovado com algumas alterações e condicionamentos. Votaram a favor o PS, PSD e independentes, já a CDU votou contra.

Na quarta-feira, numa sessão em Gondomar, a ministra da Coesão Territorial, Ana Abrunhosa, deu como garantido que o Governo iria assumir o pagamento dos seguros de trabalhadores e viaturas que passam para as câmaras, uma decisão que ia ao encontro das reivindicações dos autarcas.

Apesar de o PSD ter votado a favor, os autarcas sociais-democratas com assento no conselho directivo da ANMP afirmam, numa declaração de voto, “dar condicionalmente o assentimento a este acordo, corrigido com as várias propostas de alteração apresentadas e com as ressalvas e alertas constantes desta declaração de voto que sublinha a necessidade de prosseguir o caminho da descentralização, mas de forma muito mais ambiciosa, rápida e justa”.

Os sociais-democratas defendem que “é necessário corrigir rapidamente todo o edifício legislativo e financeiro, sob pena deste ser totalmente ruinoso para as autarquias e para o país” e propõem à associação nacional de municípios nas áreas sectoriais da educação e da saúde um acordo de colaboração, assumindo que este é “o primeiro passo de outros que se seguirão urgentemente”.

E acrescentam que nas temáticas da educação e da saúde “este acordo não encerra o assunto e os autarcas têm de garantir que os compromissos nele assumidos são cumpridos e, logo após esta implementação, avançar para a negociação da transferência de competências verdadeiramente estruturantes”.

Na declaração de voto a que o PÚBLICO teve acesso, observam ainda que “particularmente na área da educação, este acordo representa uma perda relativamente a outros processos já anteriormente efectuados, particularmente o de 2015, no Governo liderado pelo PSD, ao qual algumas autarquias aderiram e que agora vêem nesta proposta um retrocesso, porque as competências delegadas são menos amplas, reflectindo menor ambição”.

Rui Moreira: “Até foi bom o Porto estar fora da ANMP"

O presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, já reagiu ao acordo de compromisso aprovado pelo conselho directivo da associação nacional de municípios, e apesar de ainda não o ter lido, congratula-se com o reforço de verbas que o Estado assumiu transferir para os municípios no âmbito da descentralização de competências.

“Em matéria de saúde, os municípios vão poder definir os horários de funcionamento dos centros de saúde e essa era uma questão pela qual nós nos batemos”, apontou, a título de exemplo, o presidente da Câmara do Porto, que em Abril decidiu abandonar a ANMP por considerar que o organismo que representa o poder local não estava a defender os interesses dos autarcas.

Rui Moreira resiste a puxar dos galões pelo facto de o Governo ter cedido, após muitas negociações às reivindicações que o próprio defendeu, juntamente com outros presidentes de câmara, mas não deixa de dizer, em declarações ao PÚBLICO, que se calhar “até foi bom o Porto estar de fora da Associação Nacional de Municípios Portugueses.”

“O facto de nós estarmos de fora e termos podido dizer coisas que outros [autarcas] não podiam dizer pode ter contribuído para melhorar as condições que o Estado oferece agora aos municípios”, declarou Rui Moreira, salvaguardando que ainda não conhece o acordo em detalhe.

“Julgo que o esforço que foi feito vai no bom sentido, houve um reforço nas verbas e isso é bom para os municípios”, reiterou, dizendo que “muitas das questões que a Câmara do Porto levantou relativamente à reabilitação e à manutenção das escolas transferidas para as câmaras municipais e também em relação às refeições escolares, que estão contempladas no acordo”.

Definição de equipamentos a requalificar cabe ao Governo

Relativamente às listagens de equipamentos a requalificar e às prioridades de intervenção, os autarcas sociais-democratas defendem que “é fundamental deixar bem claro que elas são da total responsabilidade do Governo, não tendo os autarcas qualquer vínculo às respectivas prioridades definidas” e acrescentam que “é crucial assumir que esta listagem e prioridades deveriam ser validadas pelas comunidades intermunicipais e áreas metropolitanas – nível de agregação que permite corrigir erros que se considera que podem existir nas mesmas”.

Críticos quanto ao “grau de ambição” desta descentralização, os sociais-democratas advertem que quanto às portarias previstas no acordo –, que são muitas e sobre matérias estruturantes (transportes escolares, equipamentos, rácios de pessoal) –, que devem ser publicadas no prazo de 90 dias, tal representa um voto adicional de confiança ao Governo para terminar os trabalhos que já deveriam estar concluídos em 2018, antes mesmo do início do processo de descentralização”.

Aproveitam para criticar o Governo, que “mesmo assumindo várias fontes de financiamento, continua a não saber concretizar o que caberá a cada uma delas, razão pela qual se manifestam reservas sobre o assunto”. E atendendo a que o acordo só vigorará para 2023, perguntam: “Quem compensa as autarquias das despesas de 2022 que não estão a coberto pelo mesmo?”

A este propósito, os autarcas do PSD entendem que “é fundamental operacionalizar o artigo 89.º da lei do Orçamento do Estado de 2022 para corrigir os montantes definidos”.

Tendo em conta que há um pacote de competências a transferir para os municípios, que vão desde a acção social, às vias rodoviárias, orla costeira, zonas portuárias, imóveis do Estado, cultura, bombeiros e protecção civil, o PSD recomenda que a acção social mereça “prioridade máxima.”

Depois de criticarem que “esta não é, nem ao nível da ambição e muito menos na forma como tem sido concretizada, a descentralização que o PSD preconizou para o país”, os autarcas acusam ainda o Governo de “maltratar as autarquias e os autarcas, ignorando todos os alertas e reivindicações que lhe têm sido transmitidos, sempre dizendo que estava tudo pronto para se efectuar a descentralização, contrariando todas as evidências”.

Afirmam ainda que “a descentralização de competências do Governo nas autarquias sempre foi, é e será um objectivo que deve ser concretizado com a maior brevidade em todas as áreas que o Governo elencou como possível e nas outras que o PSD considera ser de ampliar e aprofundar”.

Notícia actualizada com reacção do presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira

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