Fim-de-semana tenso prenuncia escalada assustadora no Brasil

Manifestação de bolsonaristas a favor das armas, discurso de Lula e crime no Paraná mostram clima desfavorável à pacificação.

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Manifestação pela liberalização do uso de armas em Brasília, no último sábado EPA/JOEDSON ALVES

A campanha presidencial ainda nem começou oficialmente, mas já produziu o fim-de-semana mais tenso na política brasileira desde a facada em Jair Bolsonaro, há quatro anos.

No sábado, apoiantes do Presidente concentraram-se na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, para defender o armamento da população. Não é por armas, é por liberdade, gritavam, um slogan que busca dar um verniz nobre à chamada para que o bolsonarismo resista a qualquer cenário em que tenha de deixar o poder.

Mais ou menos simultaneamente, o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva dava os parabéns publicamente, num acto em Diadema, São Paulo, a um militante do seu partido que quase levou à morte um opositor político após uma agressão em 2018.

O recado do ex-Presidente também tinha o seu próprio verniz, o da lealdade a um companheiro que se sacrificou pessoalmente em nome da causa. Mas a chamada à tribo vermelha era outra: não se intimidem com as agressões vindas do outro lado e respondam à altura se for preciso.

Nada, no entanto, que se comparasse ao que ocorreu em Foz do Iguaçu, no Paraná, na noite do mesmo dia, uma notícia que explodiu na manhã de domingo.

Segundo os relatos da polícia, um bolsonarista ameaçou um petista que comemorava o seu aniversário, entrou a disparar na sua festa e recebeu fogo de volta. O apoiante de Lula morreu, o de Bolsonaro ficou gravemente ferido.

Os primeiros sinais após o crime na cidade paranaense foram pouco encorajadores. Nas redes sociais, petistas colocaram a culpa pelo ocorrido directamente no colo de Bolsonaro, algo não muito diferente do que fazem os apoiantes do Presidente ao responsabilizarem o PSOL, partido no qual Adélio Bispo foi filiado no passado, pela facada de 2018.

A grande maioria dos bolsonaristas, não exactamente uma turma discreta nas redes sociais, fez pior, ignorando o ocorrido na cidade paranaense.

O silêncio é um recado eloquente, de que consideram o facto como algo corriqueiro, talvez até desejável, no contexto de guerra eleitoral que o país vive. Jogar na confusão, afinal, é a maior linha de ataque do Presidente. O próprio Bolsonaro só se manifestou no início da noite, e indo para o ataque contra a esquerda.

A verborreia intimidadora de Bolsonaro nos últimos anos é sem dúvida a principal responsável por insuflar o clima de hiperpolarização que se instalou no Brasil em meados da década passada. Nesse ambiente, eventos banais tornam-se mortais, especialmente se os dois lados estiverem armados.

Como disse um ministro do Supremo Tribunal Federal, a lógica do que ocorreu em Foz do Iguaçu não é muito diferente de uma briga de vizinhos que termina em tragédia.

O risco, agora um pouco mais real do que antes dos eventos de sábado, é que esses episódios pontuais degenerem numa acção organizada nos próximos meses, com a chancela que vem de cima. O próximo passo nesta escalada é assustador.

Poucos foram os pedidos de calma e concórdia no domingo para evitar que nos próximos meses estas situações se repitam. Possivelmente, porque o ar já estará demasiado pesado para algum tipo de pacto de convivência.

O perigoso fim-de-semana que passou dificilmente terá sido o pior desta campanha, quando ela terminar, no distante mês de Outubro.

Exclusivo PÚBLICO/Folha de S. Paulo

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