Zelensky responde a Kissinger e rejeita ceder áreas ocupadas para negociar fim do conflito

O antigo secretário de Estado dos Estados Unidos Henry Kissinger sugeriu que o Ocidente deve incitar a Ucrânia a aceitar negociações em termos que ficam muito aquém dos seus actuais objectivos de guerra e defendeu um “regresso ao anterior statu quo”.

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Zelensky rejeita ideia de ceder áreas ocupadas para negociar fim do conflito VIACHESLAV RATYNSKYI/Reuters

O Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, rejeitou inequivocamente, esta quarta-feira, a sugestão de alguns ocidentais de que a Ucrânia devia ceder o controlo de áreas ocupadas pelas forças russas para alcançar um acordo de paz.

“Os grandes geopolíticos que sugerem isto estão a desconsiderar os interesses dos ucranianos comuns, dos milhões que realmente vivem no território que estão a propor trocar por uma ilusão de paz”, sublinhou Volodymyr Zelensky, durante o seu discurso nocturno diário dirigido à nação.

Para Zelensky, primeiro estão as pessoas e “os valores não são apenas palavras”.

O chefe de Estado ucraniano comparou ainda aqueles que defendem dar à Rússia um pedaço da Ucrânia com os que cederam territórios a Hitler, na esperança de evitar a Segunda Guerra Mundial.

Os interesses da Ucrânia não devem ser superados pelos “interesses daqueles que estão com pressa para encontrar um ditador novamente”, apontou, referindo-se ao Presidente russo, Vladimir Putin.

Na terça-feira, o antigo secretário de Estado dos Estados Unidos Henry Kissinger apelou aos líderes ocidentais para pararem de tentar infligir uma pesada derrota às forças russas na Ucrânia, alertando para as consequências dessa investida na estabilidade europeia a longo prazo.

“As negociações têm de começar nos próximos dois meses, antes que surjam convulsões e tensões que não serão facilmente ultrapassadas”, afirmou no Fórum Económico Mundial, em Davos. “Idealmente, o limite deveria ser um regresso ao anterior statu quo. Avançar com os combates para além desse ponto não seria pela liberdade da Ucrânia, mas para uma nova guerra contra a Rússia.”

Kissinger sugeriu ainda que o Ocidente deve incitar a Ucrânia a aceitar negociações em termos que ficam muito aquém dos seus actuais objectivos de guerra. “Espero que os ucranianos demonstrem tanta sensatez quanto heroísmo.” Na sua perspectiva, o papel adequado para a Ucrânia é ser um Estado-tampão neutro, e não a fronteira da Europa.

Exército ucraniano enfrenta o “mais feroz” dos ataques

As forças russas concentraram-se nas últimas semanas na região Leste da Ucrânia, onde desde 2014 algumas zonas do Donbass são controladas por separatistas pró-russos.

As milícias pró-russas da República Popular de Lugansk, juntamente com o Exército russo na região de Donbass, garantiram esta quarta-feira ter cercado “operacionalmente” a cidade de Severodonetsk, no Leste da Ucrânia.

As forças do Exército russo e as milícias de Donbass também afirmam ter cercado as cidades de Zolotoye e Górskoye.

Severodonetsk, uma cidade de cerca de 100.000 habitantes antes da guerra, está sob pressão de tropas russas e combatentes separatistas pró-Rússia há várias semanas.

A cidade está localizada a mais de 80 quilómetros a leste de Kramatorsk, que se tornou o centro administrativo de Donbass, desde que os separatistas apoiados por Moscovo tomaram controlo da região.

Zelensky adiantou também que o seu Exército está a enfrentar o “mais feroz” dos ataques das forças russas, que em alguns lugares têm muito mais armas e soldados.

O governante pediu ainda mais assistência militar ao Ocidente, “sem excepção, sem restrições e o suficiente para vencer”.

Guerra na Ucrânia fez mais de 14 milhões de deslocados

A ofensiva militar lançada na madrugada de 24 de Fevereiro pela Rússia na Ucrânia causou já a fuga de mais de 14 milhões de pessoas das suas casas – mais de oito milhões de deslocados internos e mais de 6,6 milhões para os países vizinhos , de acordo com os mais recentes dados da ONU, que classifica esta crise de refugiados como a pior na Europa desde a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).

Também segundo as Nações Unidas, cerca de 15 milhões de pessoas necessitam de assistência humanitária na Ucrânia.

A invasão russa – justificada pelo Presidente russo, Vladimir Putin, com a necessidade de “desnazificar” e desmilitarizar a Ucrânia para segurança da Rússia foi condenada pela generalidade da comunidade internacional, que respondeu com o envio de armamento para a Ucrânia e a imposição à Rússia de sanções que atingem praticamente todos os sectores, da banca ao desporto.

A ONU confirmou, na quarta-feira, que 3974 civis morreram e 4654 ficaram feridos na guerra, sublinhando que os números reais poderão ser muito superiores e só serão conhecidos quando houver acesso a cidades cercadas ou a zonas até agora sob intensos combates.

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