Trás-os-Montes com mais de mil quilómetros de trilhos: só as festas juntam mais gente que as caminhadas

Os percursos pedestres homologados são uma atracção cada vez maior da região, especialmente para as aldeias que só têm movimento no Verão. “Isto é muito parado e assim sempre vemos pessoas, já estamos a precisar depois de dois anos de pandemia”

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Entre os caminhos e as paisagens de tirar o fôlego de Trás-os-Montes Nelson Garrido

A região de Trás-os-Montes ganhou nos últimos anos mais de mil quilómetros de trilhos homologados que se tornaram num novo motivo de atracção, sobretudo para as aldeias onde só as festas juntam tanta gente como as caminhadas.

A analogia é feita por João Freixinho, presidente da junta de freguesia de Vilarinho da Castanheira, que recebeu 150 pessoas numa manhã de domingo para a inauguração de mais um dos oito percursos pedestres existentes no concelho de Carrazeda de Ansiães, distrito de Bragança.

“Só a festa de Verão é que tem muita gente”, salientou o presidente da junta, nesta aldeia com muita emigração e onde as cerca de 350 pessoas que ali vivem permanentemente começam a despertar para aquilo que “estão habituadas a ver todos os dias” e que é motivo de interesse para os que vêm de fora.

Criar dinâmica nas aldeias é um dos propósitos do "boom” dos percursos pedestres que têm surgido por toda a região de Trás-os-Montes, onde “há muitos poucos concelhos que não têm percursos homologados” e os que existem somam cerca de mil quilómetros para caminhar.

Este número foi avançado à Lusa por Domingos Pires, um dos sócios-gerentes da Portugal NTN, uma empresa criada há sete anos em Mirandela por dois militares direccionada para esta actividade e que reflecte no quadro de pessoal o aumento do impacto dos percursos pedestres, com 12 trabalhadores actualmente, todos da região.

O trabalho da empresa é a criação dos percursos, desde o trilho às marcas ou sinalética, com as condições de segurança que exige a homologação, e o responsável assegura que “tem havido um crescimento e uma aposta muito grande dos municípios” nesta oferta.

Mas, como salientou, não basta implementar o percurso, é preciso haver iniciativa das próprias juntas de freguesias, associações, clubes, que usem a infra-estrutura física que está criada para realizar eventos.

Domingos Pires deu o exemplo do percurso pedestre de Castanheira do Norte, também em Carrazeda de Ansiães, onde foi criada uma infra-estrutura para usufruir do miradouro “Olhos do Tua”, “que é um dos mais visitados na região” e já atraiu um projecto turístico para o local. “Está aqui um exemplo que responde cabalmente ao que isto pode ter enquanto potencial e enquanto alavanca para outros sectores da economia local”, enfatizou.

O café da aldeia é o primeiro a notar esta dinâmica no dia das caminhadas que juntam pessoas de várias zonas do país, como António Saraiva que saiu de Coimbra de madrugada num domingo para caminhar em Carrazeda de Ansiães. Contou à Lusa que costuma “correr o país a fazer caminhadas” e que costuma deslocar-se com “alguma frequência” a Trás-os-Montes.

Ainda há 15 dias tinha estado no Tua e “já há uns bons anos” que anda por Trás-os-Montes, porque gosta “da paisagem, das pessoas e da gastronomia”. Neste dia, só fez a caminhada e regressou a Coimbra, mas noutras ocasiões já tem ficado “dois ou três dias”. O melhor destes passeios pedestres é, para António Urbano, “o convívio com as pessoas” e os benefícios para a saúde, pois “caminhar também faz bem”.

Este ex-emigrante natural da região espera também que “isto ajude a desenvolver um bocadinho” a aldeia onde um grupo de mulheres locais se juntou na meta de partida, umas para caminhar, outras apenas para ver o movimento. "Isto é muito parado e assim sempre vemos pessoas, já estamos a precisar depois de dois anos de pandemia", atiram e todas concordam que “é bom” para a aldeia.

Negócios no Vilarinho só o café, mas também há um museu da Memória Rural, que “tem sempre gente aos domingos”, como contaram à Lusa. “Muitas vezes, as pessoas não dão valor e nem conhecem o património muito rico” que têm e “estes eventos são importantes porque são feitos em várias aldeias aproveitando o que de melhor tem delas”, observou uma das participantes, Olinda Barbosa.

O presidente da Câmara de Carrazeda de Ansiães, João Gonçalves, garante que é preocupação do município promover esta interacção com associações e pessoas das aldeias, assim como divulgar outro tipo de património durante as caminhadas. Dos resultados, nota-se, segundo o autarca, que os percursos pedestres aumentaram o hábito dos munícipes de fazer caminhadas e o número de pessoas que visita e passa fins-de-semana no concelho.

Os reflexos estão em “mais investimento na área do turismo, quer investimentos já concretizados, quer intenções de investimento”, com realce na restauração, no setor do alojamento local e alguns serviços prestados aos turistas e aos visitantes.

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