Cenário do Governo para petróleo e juros é mais optimista que o do Banco de Portugal

Projecções de crescimento e de variação dos preços inscritas pelo Governo no Programa de Estabilidade beneficiam do facto de serem assumidos impactos menos drásticos da guerra nos preços do petróleo e nas taxas de juro.

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Rui Gaudencio

Assumindo um impacto mais moderado da guerra da Ucrânia no preço do petróleo e nas taxas de juro, o Governo traça no Programa de Estabilidade entregue esta segunda-feira no Parlamento um cenário mais favorável que o Banco de Portugal para o crescimento da economia e para a inflação. Uma visão mais optimista que contribui também para a expectativa de redução acelerada da dívida pública revelada por João Leão.

Dois dias antes de passar a pasta das Finanças a Fernando Medina, o ainda ministro entregou ao Parlamento, esta segunda-feira de manhã, os planos económicos e orçamentais do Governo para os próximos quatro anos. Não se incluem, assinala o próprio documento, as medidas que venham a estar previstas no programa do novo Executivo, mas traça-se, de uma forma clara, um percurso de melhoria do saldo orçamental e de redução acelerada da dívida pública, para o qual contribui decisivamente um ritmo de crescimento económico relativamente forte até 2026.

Na passada sexta-feira, João Leão já tinha, em conferência de imprensa, apresentado os principais números deste Programa de Estabilidade. O Governo espera que a economia cresça 5% em 2022 e 3,3% no próximo ano, mantendo nos três anos seguintes um ritmo de crescimento próximo de 2,5% (2,6% em 2024) e sempre acima dos valores previstos para a média da União Europeia.

Estes são números mais favoráveis do que os projectados na passada quinta-feira pelo Banco de Portugal. No que diz respeito à economia, a entidade liderada por Mário Centeno aponta para uma variação do PIB de 4,9% este ano e de 2,9% no próximo, caindo o ritmo de crescimento para 2% em 2024.

Por trás desta visão mais optimista está o facto de o Governo assumir pressupostos mais optimistas para alguns indicadores com uma influência decisiva na evolução da actividade económica em Portugal.

Destaca-se, numa conjuntura em que os impactos da guerra da Ucrânia são determinantes, o facto de o Governo assumir como hipótese que o preço médio do barril de petróleo durante este ano seja de 92,6 dólares e que diminua para 82,3 e 77,2 dólares em 2023 e 2024, respectivamente. Já o Banco de Portugal, assume um impacto mais forte e persistente da guerra nos custos da energia, adoptando como pressuposto um valor médio do barril de petróleo de 103,6 dólares este ano (mais 11 dólares que o Governo) e de 88,5 e 81,7 dólares em 2023 e 2024, respectivamente.

Este será um dos motivos pelos quais se regista depois uma diferença acentuada entre a previsão de 3,3% para a taxa de inflação harmonizada deste ano feita pelo Governo e os 4% projectados pelo Banco de Portugal para o mesmo indicador.

No caso das taxas de juro, sejam as Euribor (que influenciam as prestações de crédito das famílias e das empresas) sejam as taxas de juro da dívida pública, o Governo parece também apontar para um cenário em que a viragem da política do Banco Central Europeu é feita de forma mais lenta.

O Programa de Estabilidade assume que a taxa Euribor a 3 meses sobe de -0,5% em 2021 para -0,4% este ano, chegando a valores positivos de 0,3% e 0,7%, em 2023 e 2024, respectivamente. O Banco de Portugal adopta uma trajectória de subida mais rápida, com a Euribor nos -0,3% este ano, 0,6% no próximo e 0,8% em 2024.

E no que diz respeito à taxa de juro implícita da dívida pública, enquanto o Banco de Portugal aponta para uma subida progressiva dos 1,9% de 2021 até aos 2,1% em 2024, o Governo assume como hipótese uma ligeira descida deste indicador no mesmo período, de 1,9% para 1,8%.

Estes pressupostos diferentes contribuem para que a previsão de crescimento do Governo seja mais favorável que a do Banco de Portugal. E ajudam também a que se possa traçar um cenário mais positivo para a evolução das finanças públicas. No Programa de Estabilidade, o Governo prevê que o défice, depois de ter caído para 2,8% em 2021, continue a descer nos anos seguintes, cifrando-se em 1,9% este ano e chegando a zero em 2025. No caso da dívida, a expectativa é também de continuação da trajectória descendente iniciada em 2021 (127,4% do PIB), passando para os 120,8% este ano e chegando muito perto de 100% em 2026 (101,9%). O Banco de Portugal não apresenta previsões para estes indicadores.

É verdade que o Governo, tendo em conta o cenário de incerteza que se vive actualmente em toda a economia mundial, decidiu incluir neste Programa de Estabilidade um cenário alternativo, mais adverso, em que o crescimento da economia portuguesa seria de 3,8% este ano em vez de 5% e a inflação subiria até aos 4,2%.

No entanto, também aqui, o Executivo acaba por ser mais optimista que o Banco de Portugal, já que no cenário adverso traçado pela autoridade monetária nacional, a economia cresce apenas 3,6% e a inflação dispara até aos 5,9%.

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